Com as taxas acima de 4%, Portugal enfrenta teste nos mercados

Tesouro português inicia o ano com uma emissão sindicada de dívida a dez anos. Com as taxas acima dos 4%, existem dúvidas quando à dimensão que o Governo quererá dar à operação.

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Equipa das Finanças enfrenta mercados em conjuntura mais difícil Jornal Público

Portugal enfrenta esta quarta-feira o seu primeiro grande teste nos mercados desde de que as taxas de juro da sua dívida pública voltaram a ficar acima dos 4%. Numa operação em que contará com o apoio de cinco bancos internacionais e um nacional, o Tesouro irá lançar-se para a emissão de uma nova série de obrigações do tesouro cujas taxas, antecipam os analistas, deverão reflectir o ambiente mais difícil que o país enfrenta actualmente nos mercados e poderão levar o Governo a optar por uma colocação de dimensão mais reduzida que o habitual.

O anúncio de que uma emissão sindicada de dívida pública está iminente foi feito pelos bancos escolhidos pelo Tesouro português para concretizar a operação. De acordo com a agência Reuters, o português Novo Banco, mais os estrangeiros BBVA, HSBC, JP Morgan, Morgan Stanley e Societé Générale, foram as instituições mandatadas pelas autoridades portuguesas para encontrar os investidores interessados em comprar títulos da nova linha de obrigações do Estado português, que terá uma maturidade até 2027.

A diferença de uma emissão sindicada em relação aos mais habituais leilões competitivos é que, em vez de o Tesouro ficar à espera que os investidores apareçam e façam as suas ofertas, os bancos procuram activamente potenciais investidores interessados e asseguram que existe procura. Isto torna a operação mais segura e por isso é que é utilizada para o lançamento de novas séries de obrigações, com emissões de maior dimensão.

No entanto, desta vez, por causa do momento que se vive no mercado, não há ainda a certeza se o Tesouro português pretenderá efectivamente fazer uma emissão de grande dimensão como é habitual nas operações sindicadas.

O problema está nas taxas de juro que deverão ser exigidas pelos investidores. Neste momento, as obrigações do tesouro portuguesas com um prazo mais próximo dos dez anos, estão a transaccionar-se nos mercados (entre os investidores) a uma taxa de juro próxima dos 4,1% e, como explica o analista do mercado do Banco Carregosa, Filipe Silva, a nova emissão a realizar não deverá fugir muito desse valor.

“Não deverá haver qualquer problema por parte do Tesouro em colocar estes títulos no mercado. Não há qualquer motivo para que surjam problemas. Mas as taxas deverão ficar ligeiramente acima daquelas que se estão a aplicar na OT que actualmente serve de referência para o prazo de dez anos em Portugal, até porque essa OT na realidade até está com um prazo mais curto de cerca de nove anos e meio”, explica o analista.

Uma taxa acima de 4% pode constituir um factor relevante para o Tesouro português na hora de decidir qual o volume emitido. No início do ano passado, quando lançou a série de obrigações com prazo até 2026, a opção foi por uma emissão de 4000 milhões de euros, garantida a uma taxa ligeiramente abaixo dos 3%.

Agora, uma emissão desta dimensão a 4% podia, assinala Filipe Silva, afectar a taxa de juro média da dívida portuguesa, pelo que os responsáveis pelo Tesouro têm motivos para optar por uma emissão inicial mais reduzida, completando depois a série de forma progressiva ao longo do tempo, esperando por condições de mercado mais favoráveis.

A subida das taxas de juro da dívida portuguesa que se tem vindo a registar nas últimas semanas nos mercados acontece em larga medida por causa da expectativa de uma redução do apoio que é dado pelo Banco Central Europeu a Portugal.

Desde Março do ano passado que a entidade liderada por Mario Draghi tem vindo a reduzir o ritmo a que compra dívida pública portuguesa nos mercados, uma vez que se está a aproximar perigosamente do limite de um terço que pode deter do total da dívida emitida por Portugal. As decisões tomadas pelo banco em Dezembro tendem ainda a agravar a situação. Não só o BCE reduziu o montante mensal de compras que realiza no total da zona euro, como manteve as regras que limitam a compra de dívida portuguesa. Tudo isto ao mesmo tempo que se assiste a uma aceleração da inflação na zona euro, e em especial na Alemanha.

Nestas circunstâncias, é compreensível que, entre aqueles que gerem a emissão de dívida portuguesa, haja neste momento a preocupação de reduzir ao máximo as emissões no mercado e fazer uso de parte das almofadas financeiras disponíveis.

Esta terça-feira, a Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública – IGCP publicou o Programa de Financiamento da República Portuguesa para 2017 em que se antecipa a emissão no decorrer deste ano de dívida pública a médio e longo prazo num montante situado entre 14 e 16 mil milhões de euros. O ponto central deste intervalo fica ligeiramente abaixo dos 17,4 mil milhões emitidos em 2016 e dos 16 mil milhões que eram anteriormente previstos. A descida do valor acontece porque o IGCP calcula que, depois de ter chegado ao fim de 2016 com excedentes de tesouraria de 10,2 mil milhões de euros, será possível utilizar este ano 3,8 mil milhões de euros de depósitos, limitando o número de novas emissões e colocando a almofada financeira num valor ainda confortável de 6,5 mil milhões de euros no final de 2017.

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