CGD fica obrigada a vender os seguros da Fidelidade por 25 anos

Quem comprar a Caixa Seguros, o grupo segurador estatal, vai poder comercializar os seus produtos durante 25 anos aos balcões do banco público.

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Seguros da CGD vão ser vendidos a privados PAULO PIMENTA

Uma das cláusulas do contrato de venda por ajuste directo da Caixa Seguros (Fidelidade, Multicare, Seguros de Saúde, Cares, Companhia de Seguros) prevê que seja dada exclusividade mútua, por 25 anos, de venda dos produtos da Fidelidade, entretanto privatizada, aos balcões da Caixa Geral de Depósitos (CGD).

O prazo para os dois grupos seleccionados concretizarem uma oferta de aquisição da Caixa Seguros termina nesta segunda-feira. As duas companhias finalistas no concurso público de privatização do sector segurador estatal, os fundos norte-americanos de private equity Apollo Global Management e a sociedade de capital de risco chinesa Fosun International (Xangai, com ligação a Hong Kong), fizeram-se representar, na semana passada, ao mais alto nível nas conversações que decorreram no Ministério das Finanças.

O PÚBLICO apurou que as autoridades portuguesas têm a expectativa de que sejam formalizadas propostas de aquisição do sector segurador do Estado (que tem uma quota de mercado de 30%). Aliás, a semana passada, quer a sociedade de capital risco Fosun International, que trouxe a Lisboa o seu presidente, quer a Apollo Global Management, que se fez representar pelo responsável do private equity de Londres, mantiveram contactos com o Governo de Passos Coelho. A aquisição, por ajuste directo de um bloco acima de 75% da Caixa Seguros (5% estão reservados aos trabalhadores), deverá rondar os mil milhões de euros.

O PÚBLICO apurou que uma das cláusulas do contrato de alienação da Caixa Seguros prevê que a CGD, que tem uma quota de mercado de 25%, venda exclusivamente seguros da Fidelidade aos seus balcões (800 agências) e que a Fidelidade apenas comercialize seguros através do grupo financeiro do Estado. Um casamento de 25 anos. O PÚBLICO inquiriu o vendedor sobre o tema mas fonte oficial da CGD explicou “não poder fazer qualquer comentário sobre o processo de privatização em curso", isto, porque o Estado é o vendedor, no sentido, em que o banco é totalmente público.

A decisão de incluir no memorando de privatização da Caixa Seguros uma cláusula de exclusividade pode ser justificada com o facto de todos os grupos bancários terem protocolos desta natureza: a Allianz usa o canal bancário no BPI, a Ocidental Seguros o do BCP e a Tranquilidade o do BES. Mas a intenção pode suscitar dúvidas por condicionar, no futuro, uma privatização, parcial ou total, da instituição financeira (um ponto que, aparentemente, não esteve em cima da mesa), por se estar a definir desde já um parceiro estratégico de longo prazo. Mas também por amarrar o banco público durante um quarto de século a uma entidade em exclusivo. Ou seja: afastando à partida qualquer outra hipótese que venha a surgir e que seja mais favorável aos interesses da CGD.

Ainda assim, e no pressuposto de que a sociedade de capital risco Fosun International e o fundo de private equity Apollo Global Management confirmam ofertas, se as autoridades entenderem que as propostas não são credíveis, quer em termos de valores, quer das contrapartidas que vão exigir à CGD (garantias, por exemplo, de que não terão surpreses quando forem analisar os balanços/contingências das seguradoras), o Governo pode optar pela via do mercado de capitais, ou seja, realizar uma dispersão em bolsa da maioria das acções da Caixa Seguros. Neste caso, todas as questões relacionadas com parcerias a prazo seriam diferentes. Isto porque os investidores que adquirem acções em bolsa não exigem garantias ao vendedor. Os defensores das privatizações em bolsa alegam ainda que esta via reflecte melhor o valor dos activos em venda.

Esta solução já foi admitida pelo Secretário de Estado das Finanças, Manuel Rodrigues, e tem estado em cima da mesa de João Palma, o administrador da CGD, responsável pela Caixa Seguros. 

Os contactos que os dois concorrentes mantiveram ao mais alto nível com a equipa das Finanças e a CGD reflectiram um esforço para convencer as autoridades de que as suas propostas vinculativas, através de concurso competitivo, garantem um maior encaixe para o Estado do que se este optar pela vida do mercado de capitais.

Até agora, nos processos de privatizações realizados em Portugal desde a chegada da troika, o Governo optou na sua maioria por vendas através de concurso competitivo. Foi esse o caso da EDP, REN e ANA. Mais recentemente, contudo, o Executivo optou pela realização de uma oferta em bolsa na privatização dos CTT, uma operação que tem sido classificada pelos responsáveis governamentais como um sucesso.

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