BPI tem por receber 29,8 milhões em dividendos de Angola

Valor referente a 2014 do banco angolano onde Isabel dos Santos é parceira ainda não foi entregue. Há também 27,5 milhões devidos pela Unitel e ligados à compra de 49,9% do BFA, em 2008.

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A Santoro, de Isabel dos Santos, remeteu as questões do PÚBLICO para o BPI Nuno Ferreira Santos

O BPI domina 50,1% do capital do Banco de Fomento de Angola (BFA), uma instituição financeira que dá lucros e distribui dividendos aos seus accionistas. No entanto, o banco liderado por Fernando Ulrich ainda não recebeu dividendos relativos ao exercício de 2014, no valor de 29,8 milhões de euros.

Por outro lado, no final do ano passado estava ainda por pagar um valor de 27,5 milhões devido pela Unitel na sequência da compra de 49,9% do BFA ao BPI. Estes factos estão expostos no relatório e contas de 2015 do BPI, agora divulgado.

No caso dos dividendos, o documento refere que, no final do exercício de 2015, havia ainda 29.801 mil euros “por pagar pelo BFA ao Banco BPI referentes ao exercício de 2014”. Numa nota de rodapé, o banco diz ainda que, de acordo com uma comunicação enviada pelo Banco Nacional de Angola (BNA, o banco central deste país africano), “perspectiva-se que estes dividendos sejam recebidos até ao final de 2016”.

O tema dos dividendos de Angola veio a lume pela mão de Isabel dos Santos, em plena fase de ruptura das negociações com o maior accionista do BPI, o Caixabank (dono de 44% do capital do banco português). No dia 19 de Abril, a Santoro, empresa através da qual a empresária angolana detém 18,6% da instituição financeira, afirmou, entre outros aspectos, que o Caixabank tinha colocado “várias questões relacionadas com as autorizações do Banco Nacional de Angola (BNA) para a exportação de divisas”, tidas como necessárias para se chegar a um acordo sobre o futuro accionista do banco e o fim do que o BCE diz ser uma exposição excessiva do BPI a Angola.

O Caixabank, afirmou a Santoro num comunicado enviado à redacções, “exigiu também incluir diversas matérias que nada tinham que ver com as operações em causa como, por exemplo, o pagamento imediato de dividendos de 2014 e 2015 do BFA”.

Controlo de capitais

Tanto no caso de Angola, como no caso de Moçambique (onde o BPI também está presente), a repatriação de lucros ou de dividendos precisa de ter autorização das entidades oficiais. No caso de Angola, esse papel cabe ao BNA (sobre Moçambique, o BPI já recebeu os dividendos de 2014 ligados ao Banco Comercial e de Investimentos). A instituição angolana, por sua vez, terá também um importante papel a desempenhar no processo da Oferta Pública de Aquisição (OPA) lançada pelo Caixabank após a ruptura das negociações com Isabel dos Santos. Isto porque a OPA precisa do aval dos reguladores nos mercados onde opera.

No passado dia 5 de Março, o presidente de Angola, José Eduardo dos Santos exonerou José Pedro de Morais Júnior do cargo de governador do BNA pouco mais de um ano após este ter assumido o cargo, substituindo-o por Valter Filipe Duarte da Silva. 

Devido à crise que Angola atravessa, por causa do baixo preço do petróleo (matéria-prima da qual o país depende), há dificuldades na obtenção de divisas e na saída de capitais. Isso, no entanto, não tem impedido a concretização de alguns pagamentos. No caso da SPE, empresa detida a 81% pelo Estado português através da Parpública, chegou-se a acordo com Angola para colocar um ponto final no diferendo que envolvia a sua participação num negócio de exploração de diamantes.

O acordo, assinado em Novembro, implica a alienação dos 49% que a SPE detém na Sociedade Mineira do Lucapa (SML) e a entrega de documentação técnica. Em troca, Angola paga 130 milhões de dólares (cerca de 115 milhões de euros ao câmbio actual) em prestações.

Até ao final do passado, já tinham sido entregues 9,4 milhões de euros, e, conforme já noticiou o PÚBLICO, todos os meses tem havido pagamentos. Isso mesmo foi confirmado esta sexta-feira à noite pela Parpública, que divulgou o seu relatório e contas de 2015. No documento, a empresa pública refere que o calendário “tem vindo a ser cumprido”.

BFA em prestações

O sócio do BPI em Angola, dono de 49,9% do BFA, é a operadora de telecomunicações angolana Unitel, controlada por Isabel dos Santos. A venda desta fatia de capital à Unitel foi concretizada em Dezembro de 2008, o mesmo mês em que o BCP vendeu os 9,69% que detinha no BPI à empresária angolana (que entrou logo como terceiro maior accionista).

O negócio, de 365,7 milhões, envolveu o pagamento de oito prestações anuais, que devem terminar este ano. E, de acordo com o relatório e contas de 2015 do BPI, no final desse exercício estavam em dívida 27,5 milhões de euros. "Em 31 de Dezembro de 2015 e 2014, a rubrica 'outros devedores' inclui 27.556 mil euros e 53.538 mil euros relativos a valores a receber pela venda de de 49,9%" do BFA, lê-se no relatório.

O PÚBLICO enviou várias perguntas à empresa de Isabel dos Santos, mas a Santoro afirmou apenas que “todas as questões relacionadas com o BFA devem ser dirigidas ou ao BFA ou ao BPI e não aos accionistas minoritários”. Foram também enviadas perguntas ao BPI, mas não foi possível obter uma resposta.

No que toca à Unitel, a empresa mantém um litígio com a brasileira Oi (que incorporou os activos da Portugal Telecom, vendendo depois a operação portuguesa à Altice), uma vez que não tem pago os respectivos dividendos ao seu parceiro internacional (dono de 25% do capital). Aliás, a questão já se colocava com a Portugal Telecom, uma vez que os dividendos não são entregues desde 2011 (em causa estão já cerca de 400 milhões de dólares, equivalente a perto de 367 milhões de euros).

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