Aprender a aproveitar melhor a maior política pública da zona euro

Governo e IGCP têm assim mais uma oportunidade “to get their act together” em relação à gestão da dívida pública portuguesa…

O Governo e a IGCP (Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública) estão numa situação que se poderia descrever como aflitiva. De acordo com as actuais regras do programa de compra de dívida do sector público (PSPP) do BCE, não existe suficiente dívida pública que possa ser adquirida pelo PSPP, nos mercados secundários. Isto porque as regras do PSPP, entre outras restrições, limitam as aquisições de dívida pública a 33% da dívida pública transaccionável de médio e longo prazo.

Até Janeiro de 2017, foram adquiridos 1,2 biliões de euros de dívida pública dos países membros da zona euro. De acordo com a posição de Portugal no capital do BCE (“chave de capital” ajustada aos países elegíveis, de 2,55%), entre Março de 2015 e Janeiro de 2017, deveriam ter sido adquiridos cerca de 30 mil milhões de euros de dívida pública portuguesa.

Todavia, só foram adquiridos 25,3 mil milhões de euros. Como Portugal não usa a sua quota parte, outros países utilizam-na, como revela o gráfico abaixo.

Esta situação vai agravar-se até ao final do ano, porque o Governo e o IGCP parecem ter sido apanhados de surpresa com a extensão, a 8 de Dezembro de 2016, do fim do programa PSPP de Março de 2017, para Dezembro de 2017.

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Desse facto, resultam elevados prejuízos para o país e para as contas públicas.

As actuais regras, permitiriam a aquisição, no mercado secundário, de cerca de 44 mil milhões de euros de dívida pública portuguesa até ao final de 2017. Ao invés, se nada for feito, o país terá sorte se forem adquiridos 30 ou 31 mil milhões de euros da dívida pública portuguesa. Se os 13 mil milhões de dívida (=44-31) se tratasse de dívida com uma maturidade média de 5 anos, tal teria um impacto favorável nas contas públicas de cerca de 200 milhões de euros por ano, ao longo de 5 anos, via impostos e dividendos do Banco de Portugal. Um montante que seria superior, se a maturidade média da dívida a emitir fosse mais longa ou se essa dívida fosse utilizada para amortizar antecipadamente dívida mais cara. Ou seja, estamos, provavelmente, perante um problema com prejuízos assinaláveis nas contas públicas.

Evidentemente, só faz sentido emitir dívida, se esta for necessária, e esse parece ser o dilema do IGCP. Mas, há sempre soluções e alternativas, como se sabe…

Por exemplo, porque é que o IGCP emitiu OTVRs o ano passado, pela primeira vez? Não deveria, ao invés, ter emitido obrigações do tesouro (OTs), um terço da qual seria adquirida “pelo PSPP”, ao contrário das OTVRs?

Porque não pediu no ano passado, autorização para pagar antecipadamente mais dívida ao FMI?

Porque é que o IGCP não recompra as Medium Term Notes emitidas em dólares (4,1 mil milhões de euros), a taxas de juro elevadas, em troca da emissão de OTs em euros, um terço das quais seriam adquiridas pelo PSPP, como fez a pequena Eslovénia no início de 2016?

Há todavia boas notícias: O BCE está aparentemente a ponderar uma alteração das regras de compras de dívida pública do PSPP, e Jens Weidmann, presidente do Bundesbank, deu hoje uma entrevista em que afirma que o PSPP não pode terminar abruptamente. Isto dá a entender que é previsível que o PSPP continue, em volume reduzido, para além de Dezembro de 2017.

Governo e IGCP têm assim mais uma oportunidade “to get their act together” em relação à gestão da dívida pública portuguesa…

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