Após quatro anos de Abenomics, o Japão ainda luta contra a deflação

Economia deu sinais recentes de reanimação. Será este um sinal de que a estratégia do primeiro-ministro Shinzo Abe está a resultar ou apenas mais uma falsa partida da economia nipónica?

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Shinzo Abe, primeiro-ministro, vai anunciar em breve as reformas estruturais que quer implementar Carlo Allegri/Reuters

Na passada quinta-feira, o Japão terminou o dia com um PIB de 499 biliões de ienes. No dia a seguir, acordou com um PIB de 531 biliões. Este aumento repentino de 6,3% na sua economia coloca o primeiro-ministro Shinzo Abe um pouco mais próximo do seu ambicioso objectivo de fazer do Japão uma economia de 600 biliões de ienes em 2020, mas a verdade é que, por agora, os motivos para festejos ainda não existem.

Aquilo que aconteceu não foi mais do que um mero efeito estatístico, provocado pela aplicação de novos padrões das Nações Unidos para o cálculo do PIB. E aquilo que continua a ser real é que, ao fim de quatro anos de mandato, Abe ainda tem de provar que a sua política económica conhecida como Abenomics vai mesmo ser capaz de retirar a economia japonesa de décadas de crescimento lento e de constantes recaídas na deflação.

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Foi a 26 de Dezembro de 2012 que Shinzo Abe tomou posse e aquilo que o distinguia dos anteriores primeiros-ministros era a sua estratégia ambiciosa e agressiva contra a deflação. A ideia era a de que seria possível pôr a economia a crescer a um ritmo mais elevado e colocar a inflação outra vez em 2% se, em simultâneo, se fosse mais longe do que no passado na política monetária, na política orçamental e nas reformas estruturais.

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A estratégia produziu resultados rápidos. Com o banco central a baixar as taxas e a criar dinheiro a um ritmo nunca visto, o iene depreciou-se fortemente no mercado. Isso tornou as exportações japonesas mais competitivas, o que em conjunto com um novo esforço de investimento público, colocou a economia a crescer logo nos primeiros trimestres a seguir à implementação da política.

O problema é que este entusiasmo inicial não foi suficiente para garantir que, de uma forma sustentável, o Japão abandonasse os comportamentos característicos de uma economia que caiu na deflação. Por exemplo, apesar do crescimento económico mais forte e da subida temporária da inflação, as expectativas em relação ao futuro pouco mudaram e as empresas continuaram a oferecer aumentos salariais muito moderados e os consumidores não correram para as lojas a consumir mais.

Para além disso, o aumento do imposto sobre o consumo realizado pelo Governo – com o objectivo de garantir a sustentabilidade futura de uma dívida pública superior a 200% do PIB – provocou uma reacção negativa imediata da economia, que voltou a enfrentar um cenário de estagnação.

Perante a ameaça de insucesso da Abenomics, a resposta foi continuar a persistir, adiando novos aumentos do imposto sobre o consumo, introduzindo novas medidas de estímulo monetário e convidando as empresas a aumentarem mais os salários.

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Agora, diz o governo nipónico e os economistas que defendem a estratégia seguida, a Abenomics pode entrar numa segunda fase, de sucesso mais duradouro. E há de facto alguns sinais de aceleração na economia. No segundo trimestre do ano , o Japão registou um crescimento de 2,2% em termos anualizados, isto é, se crescesse todo o ano a este ritmo, a variação anual do PIB seria de 2,2%.

Tendo em conta o historial recente do Japão (menos de 1% em média nos últimos 20 anos), este é um resultado excepcionalmente alto. Mas será que é possível que se mantenha?

Entre os apoiantes da estratégia de Abe, defende-se que sim, que aquilo que se está a assistir é ao resultado de uma segunda vaga de efeitos positivos da política expansionista do Estado e do banco central.

Os mais pessimistas, no entanto, alertam que a aceleração se deveu essencialmente a um bom resultado das exportações, continuando-se a verificar uma preocupante debilidade no consumo das famílias e no investimento empresarial. E assinalam que na frente externa, o Japão pode vir a sair prejudicado por aquilo que pode vir a ser a política bem mais proteccionista da administração Trump, que já colocou por exemplo em causa o acordo comercial assinado entre os Estados Unidos e vários países asiáticos, incluindo o Japão.

Numa coisa todos concordam: o Japão passa agora por um teste decisivo da sua capacidade de vencer definitivamente a deflação. Esta semana, o governador do Banco do Japão, que começa a dar sinais de esgotamento dos seus instrumentos de política monetária, pediu às empresas japonesas que aumentem os seus investimentos, afirmando que a economia está numa fase “crítica” para emergir de décadas de deflação.

E Shinzo Abe, para além de ter anunciado outro plano de investimentos, prepara-se para anunciar, através de um relatório assinado por especialistas, quais as reformas estruturais que pretende implementar.

Todos estes sucessivos esforços para reanimar o ritmo de crescimento da economia japonesa, sujeita a todas as medidas extraordinárias possíveis nos últimos anos, tanto a nível monetário e orçamental, são a prova da dificuldade que uma economia pode ter para sair da deflação, assim que se deixa cair nesse tipo de armadilha. Um aviso que outras potências, como os Estados Unidos e a zona euro, não devem ignorar.

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