Ao menos entendam-se sobre o aeroporto

Perdemos tanto tempo a discutir um novo aeroporto que agora quase não há tempo para o discutir. Será desta?

Hoje é o primeiro dia do outro aeroporto de Lisboa. E não será difícil de adivinhar o que aí vem: uma longa discussão sobre as rotas migratórias das aves que por lá andam; uma outra sobre se não havia melhor alternativa (já pedida pelas câmaras comunistas); uma polémica previsível sobre porque é que a ANA é a responsável pelos estudos que se seguem; uma provável sobre a intenção de um metro ligeiro vir a passar sobre a Ponte Vasco da Gama. E uma inevitável sobre como tudo isto vai ser pago - incluindo se as taxas aeroportuárias em Lisboa não estão já demasiado altas ou se não acabarão por estragar a galinha dos ovos de ouro em que o turismo se transformou.

Como vê, não será difícil encontrar uma boa razão para abrir polémicas sobre o novo aeroporto que o Governo quer localizar no Montijo. Como vimos já na velha polémica da Ota e de Alcochete, quando falamos de aeroportos há sempre estudos exemplares para justificar cada opção, muitos especialistas com opiniões opostas e políticos com interesses conflituantes. Sempre que falamos de aeroportos há, sobretudo, razões de sobra para temermos que tudo acaba na mesma - sem aeroporto novo.

Convinha que desta vez não fosse assim. O outrora chamado aeroporto da Portela tem durado e de boa saúde, mas durará muito menos sozinho do que acompanhado. As taxas de crescimento de passageiros tem subido muito acima do que imaginámos (acima de dois dígitos no ano passado), com uma boa ajuda das low cost e apesar das polémicas sobre as taxas. E como a pista não estica, precisa desesperadamente de encontrar um apoio, sem o qual passará os próximos anos a perder terreno para Madrid e Barcelona.

Passados todos estes anos sobre a discussão do novo aeroporto, já nem a Portela se chama assim, nem o Humberto Delgado aguenta a carga. Perdemos tanto tempo que agora quase não há tempo para o discutir. 

No momento em que o Governo se prepara para nomear um novo Conselho de Obras Públicas, juntando especialistas para darem parecer vinculativo às obras públicas da próxima década, no momento em que António Costa promete só dar seguimento às grandes obras se estas tiverem o apoio de dois terços do Parlamento, o aeroporto do Montijo promete ser o último desafio a essa nossa velha incapacidade: a de nos entendermos sobre as grandes obras que construímos no papel. No caso de um aeroporto, convém que não: é que os aviões de papel não trazem gente - e não voam longe.

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