Angel Gurría diz que “desigualdade é obstáculo ao crescimento"

Secretário-geral da OCDE esteve nesta terça-feira no Parlamento para um audição com os deputados.

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Angel Gurría, secretário-geral da OCDE, esteve em Lisboa para falar sobre globalização Manuel de Almeida/Lusa

O secretário-geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) defendeu nesta terça-feira que a desigualdade social impede o crescimento económico, devendo recorrer-se aos apoios sociais e à qualificação para lidar com fenómenos como a globalização e a digitalização.

"Há o sentimento generalizado na sociedade de que o sistema actual não serve ou é injusto. Mais de um quarto da população da OCDE encara a globalização como uma ameaça", lamentou o diplomata e economista mexicano Jose Angel Gurría, em audição conjunta nas comissões parlamentares de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa e de Economia, Inovação e Obras Públicas, onde falou sobre os impactos da globalização.

O responsável da OCDE, que reúne 35 países, incluindo Portugal, defendeu que a acção deve centrar-se em "três frentes": "ajudar os trabalhadores mais prejudicados" através da educação e da qualificação; "infra-estruturas de qualidade e boas políticas de transportes”, com investimento na "conectividade física e digital" e na "inovação e desenvolvimento"; "condições para que as empresas prosperem da economia global", diminuindo "barreiras" burocráticas e promovendo "a concorrência".

"Hoje, temos a convicção de que a justiça social é uma questão ética, moral, política, mas é também uma questão económica. Uma desigualdade crescente torna-se um obstáculo muito importante para o crescimento", afirmou.

Angel Gurría destacou a "desigualdade crescente", uma vez que "as famílias mais pobres ainda não recuperaram o poder de compra que tinham em 2006" e o facto de "a média dos rendimentos dos 10% mais ricos ser agora dez vezes superior à média dos rendimentos dos 10% mais pobres" quando "este valor era somente sete vezes superior há 25 anos".

"Em Portugal, este rácio é superior à média da OCDE", vincou, entre elogios às políticas sociais de rendimento mínimo praticadas no país, sublinhando acreditar ser "possível ir mais longe, sobretudo através das prestações sociais aos desempregados e na melhoria das suas qualificações".

Referindo-se ao impacto da globalização e da digitalização dos sistemas produtivos, o dirigente da OCDE estimou que, "em média, 9% dos postos de trabalho estão em risco de vir a ser automatizados e outros 25% vão sofrer alterações consideráveis", apesar de, por outro lado, "nos últimos 20 anos, mais de mil milhões de pessoas terem sido resgatadas à pobreza nas economias emergentes".

"Receio que, no futuro, haja cada vez menos oportunidades de encontrar um bom emprego, o que gera descontentamento e provoca resultados imprevisíveis em eleições", alertou, referindo-se aos cidadãos das regiões ditas mais desenvolvidas, aludindo ao resultado do referendo britânico que ditou a saída da União Europeia ou à eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos da América.

Sobre Portugal, Angel Gurría salientou que o país é um bom exemplo ao nível das exportações, que "representam mais de 40% do PIB nacional, em comparação com os 27%, registados em 2005", observando que "o peso da OCDE nas economias mundiais caiu de 80% para 60 %", no mesmo período, embora "o volume total das exportações das economias avançadas continue a crescer".

“Armadilha do baixo crescimento" pode estar no fim

O secretário-geral OCDE disse ainda que existem motivos para se antecipar o fim da crise, embora o crescimento da economia mundial continue em níveis historicamente baixos.

"Após anos de crescimento desanimador da economia mundial, existem motivos para acalentar a esperança de que poderemos estar a sair da armadilha do baixo crescimento. As estimativas da OCDE apontam para um [crescimento do] PIB mundial de 3,6%, no próximo ano, face aos 3% do ano passado", disse Angel Gurría perante os deputados

Mas essa boa notícia não obsta a que o crescimento da economia mundial persista abaixo de valores históricos. “Uma década depois da crise estamos ainda ao nível pré-crise", acrescentou.

Angel Gurría classificou a actualidade como um "momento crítico para a economia mundial", reiterando a importância da "agenda global", referindo-se ao Acordo de Paris sobre alterações climáticas, entre outros documentos sobre comércio e cooperação internacionais.

Em Junho, nas suas últimas previsões, a OCDE melhorou as projecções de crescimento de Portugal, tanto em 2017 como em 2018, mas anteviu que a economia portuguesa desacelere no próximo ano, crescendo 2,1% este ano e 1,6% em 2018.

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