Anacom diz que negócio de compra da TVI ameaça concorrência

No parecer enviado à AdC, Anacom diz que a nova PT/TVI tem "incentivos" e "capacidade" para fechar o mercado publicitário e dos conteúdos à concorrência.

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daniel rocha

A compra do grupo Media Capital (dono da TVI) pela Altice poderá criar condições para o aparecimento de “entraves significativos à concorrência efectiva nos mercados de comunicações electrónicas”. Essa é a opinião da entidade que regula o sector das telecomunicações, a Anacom, que divulgou esta terça-feira o sentido do parecer que enviou à Autoridade da Concorrência (AdC) sobre a operação anunciada em Julho pelos donos da PT.

“Dada a dimensão dos intervenientes na operação, tal como notificada, há indícios de que a empresa resultante da concentração terá capacidade e incentivos” para “encerrar, total ou parcialmente, o acesso dos operadores concorrentes aos seus conteúdos e canais de televisão e de rádio bem como ao seu espaço publicitário”, exemplifica a Anacom.

"Dados os riscos decorrentes da operação de concentração", a Anacom "conclui que a mesma é susceptível de criar entraves significativos à concorrência efectiva nos vários mercados de comunicações eletrónicas, com prejuízo em última instância para o consumidor final, pelo que não deverá ter lugar nos termos em que foi proposta", assinala a entidade presidida por João Cadete de Matos na nota de imprensa.

Entre os problemas detectados, a Anacom refere que a nova empresa poderá “utilizar informação sensível ou confidencial dos concorrentes em seu benefício, nomeadamente no âmbito das campanhas de publicidade” e “introduzir menor transparência nos preços praticados no serviço de TDT internamente (à TVI) e externamente (aos restantes operadores de televisão), dificultando a análise e verificação do cumprimento das condições regulamentares impostas neste âmbito”.

Outra possibilidade de actuação irregular diz respeito à capacidade que a nova empresa terá para "encerrar, total ou parcialmente, o acesso de outros canais (por exemplo, a SIC e a RTP) às suas plataformas, nomeadamente de televisão por subscrição, portais de Internet (Sapo e IOL) e serviços OTT [os serviços ditos over the top, como o video streaming]".

Além disso, a nova PT/Media Capital também poderá "impedir os operadores alternativos de fornecer serviços na gama [de números de telefone] 760 à TVI, nomeadamente para televoto, participação em concursos televisivos e angariação de donativos". Este é um tema que preocupa particularmente a AR Telecom, uma das grandes fornecedoras deste serviço que, tal como a Nos e a Vodafone, se constituiu como contra-interessada no processo junto da AdC.

Quota supera recomendações de Bruxelas

Caso se concretizem, estes incentivos podem prejudicar o funcionamento concorrencial do mercado, sublinha a Anacom, assumindo que “os instrumentos sectoriais" à sua disposição "não são suficientes para acautelar o impacto que pode resultar da operação de concentração, tal como notificada, nos mercados de comunicações electrónicas”.

Nos termos em que foi notificada à AdC, a aquisição pela PT/Meo do controlo exclusivo da Media Capital representa uma "integração vertical completa da cadeia de valor", dando lugar a que no mesmo grupo decorram as "relações comerciais entre a produção de conteúdos, o fornecimento grossista de canais de TV e de rádio, a publicidade e a distribuição do serviço de televisão".

Além disso, o negócio envolve a Plural, que é a "principal produtora de conteúdos televisivos em Portugal; o canal TVI, líder de audiências e principal espaço publicitário televisivo" e a Meo, que é "o operador de telecomunicações líder em vários mercados de comunicações eletrónicas (com quotas de mercado acima dos 40%)", além do Sapo e o IOL, "os principais portais de Internet".

Assim, a "referência de 30% de quota de mercado mencionada nas orientações da Comissão Europeia sobre concentrações não horizontais é ultrapassada em todos os mercados de comunicações eletrónicas afectados", alerta a Anacom.

O regulador considera ainda importante "assinalar que não foram especificamente identificados benefícios da operação de concentração pela notificante”. Ou seja, aos olhos da Anacom, a PT terá falhado em explicar quais são as vantagens que pretende retirar deste negócio de 440 milhões de euros. O parecer da Anacom não é vinculativo, uma vez que a decisão final cabe à Autoridade da Concorrência, ou à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), caso esta emita um parecer negativo. A ERC, que pediu adiamento do prazo para enviar o seu parecer à AdC, só deverá dizer de sua justiça a 10 de Outubro.

 

 

 

 

 

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