O sentimento anti-americano cresce em todo o mundo

Um ano depois do início da guerra no Iraque, a desconfiança em relação à política dos Estados Unidos tornou-se maior, ao ponto de estar a retirar apoio à guerra ao terrorismo conduzida por Washington, de acordo com uma mega-sondagem em nove países publicada ontem.O estudo para o Pew Research Center for the People and the Press realizou-se nos EUA, Grã-Bretanha, França, Alemanha, Rússia, Marrocos, Turquia, Jordânia e Paquistão antes do atentado terrorista de Madrid e mostra uma disparidade crescente entre os pontos de vista dos norte-americanos e os dos seus aliados europeus, britânicos incluídos. Ao mesmo tempo, sublinha bem que, nos países muçulmanos, a ira das populações em relação aos Estados Unidos é um fenómeno persistente, que em nada diminuiu com o desfecho da guerra ou a captura do ditador iraquiano Saddam Hussein.Quer na Europa quer no mundo muçulmano persistem dúvidas sobre a sinceridade dos motivos que movem os EUA na guerra ao terrorismo. Entre os europeus, existe um sentimento crescente da necessidade de uma política externa da UE independente da de Washington e de que seria vantajoso que os Quinze fossem tão poderosos como os EUA à escala planetária.Este estudo, conduzido por um organismo independente, pela quarta vez, tem sido usado por líderes norte-americanos e europeus como instrumento de trabalho para a definição de políticas e a maneiras de as comunicar.Pelo menos metade dos inquiridos em cada país afirma que a guerra só prejudicou o combate ao terrorismo. Em Marrocos o número chega aos 67 por cento, mas tem valores sólidos também na Alemanha (58), Paquistão (57), Turquia (56) e França (55). Até na Grã-Bretanha este valor é de 50 por cento, enquanto apenas 36 por cento dizem que favoreceu o combate ao terrorismo. Nos EUA, a opinião é a contrária: para 62 por cento, a guerra ajudou a luta ao terror; 28 por cento dizem que não.Um outro indicador que reforça a ideia de que o conflito no Iraque fez mais mal do que bem à guerra contra a Al-Qaeda é o número crescente dos que, na Europa Ocidental, acreditam que os Estados Unidos estão a exagerar na ameaça do terrorismo. Na França (57 por cento) e na Alemanha (49) os valores são inclusive próximos dos da Turquia (55) ou do Paquistão (66).Nos países que não contribuíram com tropas nem apoiaram politicamente o conflito que derrubou Saddam, maiorias esmagadoras continuam a pensar que os seus governos tomaram a decisão certa (88 e 86 por cento, respectivamente, no caso de franceses e alemães). Em contrapartida, 60 por cento dos norte-americanos acreditam que fazer a guerra foi a decisão certa e 32 por cento a opção errada. Na Grã-Bretanha, a balança certo-errado está equilibrada: 43-47 por cento.Enquanto 84 por cento dos inquiridos nos EUA e 82 por cento dos interrogados na Grã-Bretanha pensam que o Iraque estará melhor a longo prazo sem Saddam, entre franceses (67 por cento melhor e 27 por cento pior) e alemães (65-27) persistem algumas reticências.Há também grandes maiorias a dizer que a guerra fez diminuir sensivelmente a sua confiança em que Washington queira realmente promover a democracia, sendo que aqui o número mais notável é o da França, onde 78 por cento dos interrogados afirmam ter menos confiança nos EUA e apenas 16 por cento dizem ter mais. Na Alemanha, o número de "desconfiados" chega aos 70 por cento, na Turquia é de 73 e até no Reino Unido é de 45 por cento (superior aos 41 por cento que afirmam estar mais confiantes).Os números são também esmagadores quando a pergunta é 'Pensa que os líderes dos EUA e da Grã-Bretanha mentiram sobre as armas de destruição maciça?', e mais uma vez a França está na frente, com 82 por cento de respostas "sim". Só na Grã-Bretanha e nos EUA a percepção é diferente: 48 por cento dos britânicos afirmam que os seus líderes estavam mal informados e 41 por cento que mentiram; nos EUA, esses números são de 49 e 31 por cento.Madeleine Albright, que foi secretária de Estado na Administração Clinton e é directora deste projecto, comentou ser "perturbante que os americanos sejam os únicos, entre os interrogados, que acreditam que a guerra ajudou, em vez de prejudicar, o combate à Al-Qaeda. É também perturbante que o conflito iraquiano tenha provocado uma perda de confiança na honestidade da América e no seu empenhamento para com a democracia".Este estudo realizou-se pela primeira vez na Primavera de 2002, a seguir em Março de 2003, depois em Maio, e finalmente agora. Em Maio de 2003, na conclusão da guerra, membros da Administração Bush, ao comentarem-no, manifestaram a esperança de que os resultados negativos de então, reflexo de um forte sentimento anti-guerra, se tornassem mais positivos.Mas o facto é que isso só acontece em algumas poucas áreas específicas. Pode detectar-se, por exemplo, uma hostilidade menor aos EUA em países muçulmanos. Em Maio de 2003, eram 68 por cento as opiniões "muito desfavoráveis" dos EUA na Turquia e esse número é hoje de 45 por cento. Houve quedas semelhantes no Paquistão (de 71 para 50), na Jordânia (de 83 para 67) e em Marrocos (de 53 para 46). Mas o total de opiniões desfavoráveis ainda é muito elevado.E nos países de maioria muçulmana grandes números têm uma opinião favorável de Osama bin Laden: 65 por cento no Paquistão, 55 por cento na Jordânia, 45 por cento em Marrocos.Talvez pior: 70 por cento dos jordanos, 66 por cento dos marroquinos, 46 por cento dos paquistaneses e até 31 por cento dos turcos consideram justificáveis as acções de bombistas suicidas contra norte-americanos e ocidentais no Iraque.Comparem-se estes números com os dos que consideram justificáveis atentados bombistas suicidas de palestinianos contra israelitas: Jordânia - 86 por cento; Marrocos - 74 por cento; Paquistão - 47 por cento; Turquia - 24 por cento.Os resultados completos da sondagem podem ser consultados em www.people-press.org

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