Claques são sociedade alternativa com todo o tipo de gente

a É quase unânime entre os agentes policiais e os investigadores que estudam o fenónemo da violência no desporto: as claques são uma reprodução quase fiel da sociedade. "Temos de perceber a claque como um campo social em que há várias experiências: uns divertem-se, outros querem andar à pancada, outros querem apoiar o clube, outros querem passar droga. É uma realidade complexa, uma sociedade alternativa", resume Daniel Seabra, antropólogo que está a ultimar uma tese de doutoramento sobre quatro claques do Porto (Super Dragões, Colectivo 95, Panteras Negras e Alma Salgueirista).A opinião coincide com a dos agentes policiais que integram o Ponto Nacional de Informações de Futebol (PNIF), uma estrutura da PSP que centraliza os dados sobre as claques e troca dados com congéneres de outros países da União Europeia. Ontem nenhum responsável desta estrutura esteve disponível para falar ao PÚBLICO, mas em Dezembro passado João Paulo Saramago, chefe da unidade que acompanha as claques em Lisboa, garantia que a implicação de membros de claques em fenómenos de criminalidade e violência é "pontual e individual". Esta equipa - a Unidade Regional de Informações Desportivas (URID) - acompanha semanalmente os membros destes grupos de adeptos e detecta nas claques "pessoas de todos os estratos socais" e profissões, "desde pessoas licenciadas, com emprego estável, e quadros superiores até ao estivador".
Uma percepção que não contraria o estudo de Daniel Seabra. "Nas claques que analisei, há uma prevalência de indivíduos da classe trabalhadora e muitos assalariados de categoria inferior, como empregados de call center, vigilantes, promotores de hipermercados. Mas 27 por cento são universitários e há uma representação residual, na ordem dos dois a sete por cento, de classes médias-altas", aponta o antropólogo, citando o exemplo de um empregado bancário que usa gravata durante a semana e, "se for preciso, entra em rixas, quando está na claque". Nos grupos analisados por Seabra, há uma preponderância de jovens: 70 por cento estão abaixo dos 29 anos (a idade média é de 25 anos).
Um agente policial que já trabalhou nesta área, e que solicitou o anonimato, disse ao PÚBLICO que sempre houve "subgrupos minoritários" dentro das claques dedicados ao tráfico de droga e até com "ligações à extrema-
-direita", como aconteceu com o Grupo 1143, "que resultou de uma cisão na Juve Leo". Algo que desaconselha uma generalização e que leva Salomé Marivoet, socióloga especialista no estudo da violência no desporto e membro do Conselho para a Ética e Segurança no Desporto, a não retirar particulares ilações da detenção de vários elementos dos No Name Boys. "Em meu entender tratou-se de uma actuação de combate ao crime organizado, dirigida no caso a suspeitos de actos ilícitos ou criminosos cuja presença foi igualmente identificada no seio desta claque", respondeu ao PÚBLICO por e-mail.
Questionada sobre a tendência desta ligação das claques à criminalidade, já referenciada nos crimes no Porto no final do ano passado, com a detecção de ligações à claque portista Super Dragões, Salomé Marivoet remete antes para uma questão de visbilidade: "Se a criminalidade tem estado a aumentar na sociedade portuguesa, será plausível que alguns dos seus autores ganhem maior visibilidade, quando se encontrem no seio das claques, já que as forças policiais exercem um estreito controlo aos comportamentos e formas de actuação no terreno."
Daniel Seabra, por outro lado, defende que as claques sejam "apoiadas pelos clubes", com um "financiamento transparente", "porque sem apoios ficam com campo aberto para a economia paralela, muitas vezes ilícita". Hugo Daniel Sousa

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