Vamos suspender a utilidade pública desportiva a todas as federações desportivas?

1. À atenção do Governo? Acho que não é necessário.

Confesso que, já por uma vez, tinha sido confrontado com esta tese peregrina. Contudo, tratou-se de um mero registo oral, sem consequências de maior. Sucede que, agora, a mesma surge em forma de escrito e, por via disso, potenciadora de maiores e “permanentes” equívocos. Dediquemos este espaço à questão, até porque estamos em “ano eleitoral” para as federações desportivas.

2. O regime jurídico das federações desportivas – aprovado pelo Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de Dezembro – surgiu como algo de bem inovatório, quer quanto à organização e funcionamento dessas entidades, quer ainda quanto a um novo tipo de federação desportiva que “construiu”. Daí que, como bem se compreende, tenha exigido a todas as existentes federações desportivas, em sede de disposições finais e transitórias, duas coisas: a adaptação dos estatutos, em face da nova lei, e a realização de acto eleitoral uma vez alterados os estatutos (nos tempos e moldes previstos nos artigos 64.º e 65.º). Até aqui tudo bem, embora, como é do conhecimento público, tenham ocorrido situações melindrosas nessa adaptação estatutária.

3. Em 2014, mais propriamente, com as normas do Decreto-Lei n.º 93/2104 de 23 de Junho, assistiu-se a uma revisão do regime jurídico das federações desportivas. Entendeu o legislador publicar, em anexo ao diploma de 2014, uma versão consolidada do Decreto-Lei n.º 248-B/2008. Aí surgem intocáveis aquelas normas transitórias (à época). Dê-se conta do seu conteúdo. Dispõe o artigo 64.º (Adaptação dos estatutos federativos): As federações desportivas já existentes devem adaptar os seus estatutos ao disposto no presente decreto-lei, no prazo de seis meses a contar da publicação do despacho referido no n.º 3 do artigo 26.º, para que produzam os seus efeitos até ao início da época desportiva imediatamente seguinte. Na sua sequência, estabelece o artigo 65.º (Eleições): As federações desportivas devem realizar eleições para os órgãos federativos até ao final da época desportiva referida no artigo anterior.

4. Afirmam uns que estas normas de Dezembro de 2008 são ainda aplicáveis em 2014. Por exemplo, e ficamos por aqui, todas as federações desportivas deveriam ter realizado eleições para os órgãos sociais até 31 de Junho de 2015 ou até 31 de Dezembro de 2015, consoante o conceito de época desportiva com que operam.

Se fosse correcta esta leitura, porventura um número considerável de federações desportivas viveria agora sob a ameaça da suspensão do estatuto de utilidade pública desportiva.

5. Porém, a tese é visceralmente errada.

Na verdade, quem sustenta esta peregrina leitura olvidou-se, por completo, da existência de disposições transitórias no próprio Decreto-Lei n.º 93/2014, de 23 de Junho, em que tudo se revolve, aliás, com basta clareza.

Dispõe, com efeito, o artigo 3.º desse diploma: 1 - As federações desportivas devem adaptar os seus estatutos ao disposto no presente decreto-lei, no prazo de 120 dias a contar da sua publicação, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 2 - O disposto no artigo 33.º, no n.º 1 do artigo 41.º, no n.º 3 do artigo 43.º e no n.º 4 do artigo 44.º, com a redacção do presente decreto-lei, não afecta a actual composição nem os mandatos em curso dos órgãos sociais das federações desportivas, apenas produzindo os seus efeitos relativamente às eleições subsequentes para os órgãos sociais.

6. Cuidado, muito cuidado, pois.

josemeirim@gmail.com

 

 

 

 

 

 

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