Taça das Confederações: redundante ou indispensável?

Há quem não perca o sono se a competição que hoje começa na Rússia deixasse de existir. Para daqui a quatro anos, diz o presidente da FIFA, está tudo em cima da mesa.

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EPA/SERGEI CHIRIKOV

A Taça das Confederações não foi uma criação da FIFA, antes uma apropriação pelo organismo que tutela o futebol mundial de uma ideia da Arábia Saudita, que foi quem se lembrou de juntar os campeões continentais (e a si própria) num torneio. Desde 1997 que a FIFA tem feito por transformar a competição num mini-Mundial, aumentando o número de equipas, alterando a sua periodicidade e colocando-a no mesmo país que irá receber o Mundial no ano imediatamente anterior, funcionando como um evento-teste antes do torneio maior — até os troféus, ambos dourados e com uma bola no topo, são parecidos. A um ano do Mundial, começa hoje a Taça das Confederações na Rússia, com oito selecções a jogarem em quatro cidades por um troféu que nem toda a gente encara como um fim, mas como um meio.

Depois de uma época inteira de trabalho intenso, a Taça das Confederações é, no fundo, mais um Verão de trabalho para algumas selecções e que muita gente dispensaria. Para as selecções europeias, como a Alemanha ou Portugal, esta será a terceira época consecutiva com prolongamento, mas germânicos e portugueses encararam o torneio de forma diferente. Se Fernando Santos apostou maioritariamente nos jogadores campeões europeus em 2016, Joachim Löw incluiu muita gente nova na comitiva que viajou para a Rússia. Mas o treinador campeão do mundo está entre aqueles que preferiam já ter entrado de férias.

“Não ficaria triste se não houvesse Taça das Confederações em 2021”, assume Löw. “Não é apenas esgotante a nível físico para os jogadores, mas também emocional e psicologicamente jogar três torneios em três anos seguidos”, justifica. Bruce Arena, antigo seleccionador norte-americano, dizia algo semelhante em 2015: “É uma competição um bocado inútil. Claro que é sempre interessante ver como são as coisas um ano antes do Mundial, mas a Taça das Confederações é daquelas competições que eu acredito que as selecções preferiam não ter. São mais jogos numa altura em que os jogadores precisam de descansar.”

Já aconteceram vários casos de selecções que se recusaram a jogar a Taça das Confederações, todas elas europeias. Quando a competição ainda acontecia em Dezembro, a Alemanha, campeã europeia, recusou participar no torneio em 1997. Em 1999, já com a competição em dias de Verão, foi a campeã mundial França que não foi. Escrevia Sepp Blatter, então presidente da FIFA, no relatório oficial do torneio: “A ausência do campeão mundial despertou o debate sobre a validade do evento e o seu lugar no calendário internacional. Ninguém mais do que eu quer resolver o congestionamento”, escrevia o suíço. Para o França 2003, recusaram sucessivamente a chamada Alemanha, Itália e Espanha, entrando a Turquia em acção.

A partir de 2005, nenhuma selecção se recusou a participar na competição, que tem um interesse variável para os participantes. A Alemanha rejeitou-o duas vezes e mantém a tradição de apostar em equipas alternativas, tendo apenas um terceiro lugar em três participações. Este é, aliás, um torneio com uma forte marca americana, com quatro títulos para o Brasil, um para a Argentina e um para o México, enquanto a Europa tem três títulos, dois da França e um da Dinamarca.

A diversidade é um argumento que funciona a favor da Taça das Confederações. Uma selecção como o Taiti dificilmente conseguiria chegar a um Mundial de futebol, mas já participou nas Confederações como campeão da Oceânia, em 2013.

O torneio já teve coisas que o Mundial nunca teve, como finalistas asiáticos (Arábia Saudita, Japão), africanos (Camarões), norte-americanos (EUA) e da Oceânia (Austrália, que agora conta como selecção asiática). Uma selecção como o México, por exemplo, que se apresenta na Rússia com uma das suas melhores gerações de sempre, pode bem ter neste torneio o seu segundo grande título transcontinental, depois de décadas atrás dos sul-americanos e europeus nos Mundiais.

Como será em 2021?

Não é fácil quantificar o quanto a FIFA lucra com os contratos televisivos e de patrocínio para a Taça das Confederações, porque são negociados em pacote com os Mundiais de futebol, e o organismo nada diz sobre se esta é a última edição do torneio — os rumores que apontam para esse desfecho são muitos. Por enquanto, a FIFA tem mostrado tendência para a expansão e não para a contracção. Não só absorveu a Taça das Confederações, como também tornou redundantes a Taça Intercontinental (que opunha o vencedor da Champions ao da Libertadores) e a Taça Afro-Asiática, com a criação do Mundial de clubes. E próprio Mundial, a partir de 2026, terá 48 equipas e 80 jogos.

Depois do Rússia 2018 e antes de 2026 (cuja sede será anunciada em Maio de 2020) virá o Qatar 2022, um Mundial que irá ter a novidade de decorrer entre Novembro e Dezembro, o que vai exigir muita ginástica de calendarização para as competições internas dos países. Mas desta vez a receita de ter a Taça das Confederações como “evento-teste” do Mundial já é certo que não irá repetir-se. A competição talvez vá para outro país asiático, como sugeriu Jérôme Valcke em 2015, enquanto o Qatar deverá receber nesse ano o Mundial de clubes para se testar com um torneio internacional.

Na verdade, nada está decidido sobre o que será a Taça das Confederações 2021, ou sequer se vai existir. Gianni Infantino, presidente da FIFA, diz que “está tudo em cima da mesa”. “Vamos jogar em Junho? Vamos jogar em Novembro? Vamos repensar o formato?”, disse o suíço-italiano em Novembro passado. Se houver uma edição em 2021, muito provavelmente não será em Novembro, já que as Ligas europeias dificilmente engoliriam um calendário alterado em duas épocas consecutivas. Há quem diga até com grande certeza que já não haverá competição em 2021, como Karl-Heinz Rummenigge, antigo avançado alemão e “velho” inimigo da FIFA no que diz respeito aos calendários internacionais.

“Tanto quanto sei, a Taça das Confederações em 2017 vai ser a última edição. Depois da Rússia, vai ser, provavelmente, descontinuada”, prevê Rummenigge, ele que, para além de presidente do Bayern Munique, representa uma associação que integra os maiores clubes da Europa (e fornecedores de jogadores às selecções). “Tivemos o Euro em 2016, as Confederações em 2017 e o Mundial em 2018, e os jogadores vão descansar pouco. É uma prova sem valor.”

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