Os motores são a nova moda no pelotão? Os portugueses garantem que não

Cardoso, Mendes, Oliveira e Machado são unânimes: a disseminação do “doping mecânico” nunca será uma realidade.

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Nas grandes provas, as bicicletas são regularmente inspeccionadas LUK BENIES/AFP

Fabian Cancellara anda nervoso. Em entrevistas pré-Volta ao Dubai, o desconforto do suíço, bombardeado com questões sobre o “doping mecânico”, foi evidente. A postura sempre cool deu lugar a um tom ríspido, impaciente, que se propagou ostensivamente a toda a entourage da Trek-Segafredo — o manager Luca Guercilena interrompeu uma conferência para proibir os jornalistas de voltar a tocar no tema. Não é de estranhar: com a descoberta de um motor na bicicleta da sub-23 belga Femke Van den Driessche, nos Mundiais de Ciclocrosse, o pior pesadelo de Cancellara voltou.

Sempre que o tema “doping mecânico” se reanima é dele de quem se fala. Nos últimos dias, aqueles vídeos suspeitos de Spartacus — há-os para todos os gostos, mas o mais conhecido é o do surreal ataque do suíço a Tom Boonen, na secção mais dura do Kapelmuur, na Volta a Flandres de 2010 — voltaram a disseminar-se nas redes sociais e a somar milhões de visualizações. Mas o suíço não está sozinho. Pairam dúvidas sobre os arranques demolidores de Alberto Contador no Giro ou sobre as investidas de Chris Froome no Tour. E há aquela roda da bicicleta de Ryder Hesjedal que, mesmo com o ciclista caído no chão, rodopiava sem parar.

“Recordo-me perfeitamente desse momento e do quanto rimos nesse jantar. Foi giro, porque ele brincou imenso com essa situação e, na verdade, após a análise adequada e estando dentro da equipa, sabia que era impossível [que a bicicleta tivesse um motor]”, conta ao PÚBLICO André Cardoso, que era um dos fiéis escudeiros do canadiano na Vuelta2014. Nos últimos anos, nem ele, nem nenhum dos outros portugueses com quem falámos — José Mendes, Nelson Oliveira e Tiago Machado — viram ou ouviram algo estranho que pudesse indiciar a existência de bicicletas motorizadas no pelotão internacional.

“Fiquei a saber da existência deste tipo de motores pelos rumores que circularam acerca do Cancellara. Daí também o meu espanto que agora se venha confirmar a sua existência, porque, sinceramente, sempre pensei que não era possível instalar um mecanismo destes numa bicicleta de competição, sem que fosse facilmente detectável”, admira-se José Mendes. O corredor da Bora-Argon18 não esconde a surpresa perante a irresponsabilidade de Femke Van den Driessche — “surpreende-me que alguém utilize um método que tem sido muito falado nos últimos tempos e que tem tido especial atenção por parte da União Ciclista Internacional [UCI]” —, enquanto os outros confessam a sua admiração por ter acontecido numa prova oficial… de ciclocrosse.

“É um disparate arriscar”
“A UCI já andava atrás dos motores há bastante tempo”, recorda Nelson Oliveira desde o Dubai, onde o tema tem provocado risadas no pelotão: “Agora, quando alguém vai em dificuldade, dizemos que sem motor está tramado”. O bicampeão nacional de contra-relógio lembra-se de se ter cruzado com inspectores no Tour, na Vuelta e, “claro”, nos Mundiais. “As bicicletas estão constantemente a ser inspeccionadas. Além do vencedor, há um sorteio para outras e nunca se sabe a quem pode calhar. Seria um disparate alguém arriscar”.

É, sobretudo, por este motivo que nenhum dos quatro acredita que os motores tenham vindo para ficar. “As equipas têm uma imagem a defender”, lembra Cardoso. Tiago Machado é ainda mais taxativo: “As bicicletas a motor devem ser consideradas como algo cómico. A mim fazem-me lembrar aquelas motas antigas a pedais!”.

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