O Qatar pode tudo? só no futebol

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É inédito. O presidente da FIFA, Sepp Blatter, anunciou esta semana que o Mundial de 2022 se realizará em Novembro e Dezembro. Será um “campeonato de Inverno”. Já se calculava. Pelo regulamento, a competição devia decorrer em Junho-Julho. Mas no Qatar as temperaturas podem atingir os 50 graus nesses meses. Deixando de lado a suspeita figura de Blatter, a pergunta é: o Qatar pode tudo?

A escolha do emirado, em 2010, para organizar o Mundial, derrotando a candidatura americana, suscitou contestação. O Qatar nunca se apurou para um Mundial de futebol. Tem 2,1 milhões de habitantes. As condições meteorológicas eram insuportáveis mas foram ultrapassadas pelos cheques dos xeques e do então emir Hamad bin Khalifa. O Qatar queria organizar o Mundial para dourar a sua já brilhante imagem. Pode ter comprado uma mácula.

Depressa veio o escândalo. O Sunday Times divulgou documentos provando que o antigo vice-presidente da FIFA, o qatari Mohamed Bin Hamman, subornou dirigentes do futebol mundial. A BBC publicou um inquérito devastador sobre a corrupção na FIFA. Outras denúncias se seguiram. Hoje chama-se a isto o “Qatargate”.

O poder do Qatar não tem paralelo com a sua dimensão. Não decorre apenas do dinheiro e do petróleo. O emirado joga com a sua situação geográfica e explora habilmente as rivalidades entre os vizinhos poderosos. Com as “Primaveras árabes”, estendeu a sua influência: interveio na Síria financiando grupos jihadistas — consta que entre eles o Estado Islâmico. Estendeu a sua acção à Líbia e à Tunísia. A sua grande aposta foi o Egipto, onde se tornou o patrocinador (e banqueiro) da Irmandade Muçulmana e do Presidente islamista Mohamed Morsi.

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Esculturas do artista iraquiano Ahmad Al-Bahrani no exterior do pavilhão multiusos Lusail, em Doha Karim Jaaafar/AFP

O desmesurado soft power do Qatar assenta ainda noutro pilar: a imagem de um país moderno. Percebeu também a importância da informação e criou a televisão Al-Jazira. A partir da invasão do Iraque, em 2003, a sua influência irradia, no mundo árabe e para lá dele: oferecia uma “narrativa” alternativa à dos media americanos.

No dia 25 de Junho de 2013, o velho emir Hamad foi forçado a abdicar no filho, xeque Tamin. Azar: no dia 3 de Julho, o golpe de Estado do general Al-Sissi destituía Morsi com aplauso popular. Começa um annus horribilis. Declina a influência do Qatar no Médio Oriente. Perdeu o confronto com o general Sissi. Em Dezembro passado, teve de se reconciliar com o Cairo. Também a Al-Jazira se inclinou, deixando de dar notícias sobre a política egípcia. É hoje uma televisão em decadência e perda de credibilidade. Mau sinal para o Qatar. Se os grandes não podem tudo, um pequeno país pode menos. Excepto no futebol. 

 

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