Monchi deixa em Sevilha um legado difícil de igualar

O antigo guarda-redes revelou-se um grande director desportivo e um especialista no mercado de transferências, gerando uma mais-valia de 200 milhões de euros no clube andaluz.

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Houve tempos em que Ramón Rodriguez Verdejo “Monchi” tinha de sair do Ramón Sánchez Pizjuán escondido na bagageira de um carro e tinha medo de sair à rua por causa dos adeptos do Sevilha. Estes eram os tempos em que a equipa de Nervión andava longe do topo e Monchi era o guarda-redes (nem sempre titular) da equipa andaluza, chegando a ser colega de equipa de Maradona. Em 1999, foi na II divisão que Monchi acabou uma carreira de 11 anos como jogador e começou quase de imediato outra de director desportivo com o objectivo de construir uma equipa para subir com zero euros para gastar, desígnio cumprido na temporada seguinte. Era o início de uma época de glória para o Sevilha, que subiu na hierarquia do futebol espanhol graças à gestão desportiva de um especialista em comprar barato e vender caro.

Depois de quase 30 anos no clube, Monchi vai mudar-se para a Roma, mas deixa um legado desportivo e financeiro difícil de igualar. O clube não cresceu o suficiente para se bater de igual para igual com o Real Madrid ou o Barcelona (continua apenas com um título de campeão em 1946), mas conquistou cinco títulos na Taça UEFA/Liga Europa, uma Supertaça Europeia e duas Taças do Rei. Igualmente impressionantes foram os 200 milhões de euros em mais-valias gerados pelos negócios que fez, entre jogadores da formação sevilhista e outros que chegaram ao Sánchez Pizjuán como desconhecidos e saíram de lá como “estrelas”.

Foi Monchi, por exemplo, que descobriu Dani Alves no Bahia em 2002. O brasileiro custou 1,3 milhões e, em 2008, foi vendido ao Barcelona por 35 milhões. O Barcelona tem sido, aliás, um cliente habitual do Sevilha. Depois de Alves, o gigante catalão também lá foi buscar Rakitic (18 milhões), Aleix Vidal (17 milhões), Keita (17 milhões) ou Adriano (10 milhões). O Real Madrid também tirou partido desse viveiro - Sergio Ramos (27 milhões) e Júlio Baptista (25 milhões) são dois exemplos -, enquanto o Atlético também lá foi “raptar” Kevin Gameiro por 32 milhões.

Outros grandes negócios foram as transferências de Krychowiak para o PSG (32 milhões), do colombiano Carlos Bacca para o AC Milan (30 milhões) e de Geoffrey Kondogbia para o Mónaco (20 milhões). Para além de Sergio Ramos, a “cantera” do Sevilha também rendeu bastante, com Jesús Navas (Manchester City, 20 milhões), José Antonio Reyes (Arsenal, 20 milhões) ou Alberto Moreno (Liverpool, 20 milhões). A política de Monchi também passou pela recuperação de jogadores que não estavam propriamente em alta, como Luís Fabiano ou Frederic Kanouté. Estes não foram grandes mais-valias financeiras, mas pagaram a transferência com muitos golos.

E Monchi também acertou nos treinadores, com especial destaque para quatro nomes. Joaquin Caparrós pegou na equipa no regresso à I divisão e deixou as fundações para o duplo êxito europeu de Juande Ramos. As conquistas da Liga Europa voltaram com Unay Emery ao comando e isso valeu uma transferência do técnico basco para o PSG. Seguiu-se o argentino Jorge Sampaoli, que, nesta época, chegou a andar muito perto do primeiro lugar e criou fundadas esperanças numa eventual conquista do título. A selecção argentina parece que anda atrás dele e também já se falou de um possível interesse do Barcelona.

Monchi é a prova de que os directores desportivos podem fazer a diferença num clube que não luta com as mesmas armas de outros rivais mais poderosos - e a Roma tem andado longe de poder fazer mossa ao domínio da Juventus na Série A. Há outros exemplos pela Europa. Um dos mais notáveis é o do RB Leipzig, que teima em não deixar o Bayern Munique fugir na Bundesliga. Um dos responsáveis pelo crescimento da equipa da Red Bull é o seu director desportivo, Ralf Rangnick, um veterano treinador alemão que é especialista em subidas rápidas – levou o Hoffenheim da terceira divisão à Bundesliga em duas épocas.

Começou por ser director desportivo em simultâneo do RB Leipzig e do Red Bull Salzburgo, passando depois a trabalhar em exclusivo para a equipa alemã. Como treinador, conseguiu a promoção inédita à Bundesliga, agora está a levar a equipa ao segundo lugar e ainda com hipótese de chegar ao primeiro. A base da sua política de recrutamento é simples: só contrata jogadores entre os 17 e os 23 anos.

Também na Alemanha, Michael Zorc tem feito milagres no Borussia Dortmund, conseguindo juntar os títulos à recuperação financeira do clube. O Dortmund foi campeão em 2011 e 2012 e tem feito alguns dos grandes negócios dos últimos tempos, com as vendas de Mkhitaryan (Manchester United, 42 milhões), Gotze (Bayern, 37 milhões), Hummels (Bayern, 35 milhões) ou Gundogan (Manchester City, 27 milhões). Ao mesmo tempo, vai descobrindo grandes pechinchas, como Aubameyang (13 milhões) ou Dembélé (15 milhões), que estão bem encaminhados para valerem mais umas dezenas de milhões.

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