Jogador aliciado para manipular jogo de apuramento para a CAN

UEFA alertou mais de uma vez a Federação Portuguesa de Futebol para as suspeitas que tinha em relação a alguns jogos da II Liga. Antigo campeão do mundo sub-20 acusado de associação criminosa.

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O futebol da II Liga portuguesa tem sido alvo da manipulação de resultados LUSA/ANGELO CARCONI

O procurador que investigou o caso Jogo Duplo, em que 28 arguidos ligados ao mundo do futebol, incluindo a SAD do Leixões, são acusados de associação criminosa e vários outros crimes, diz que um dos arguidos foi aliciado com 20 mil euros para manipular o resultado do jogo que a sua selecção nacional, a Guiné-Bissau, iria disputar a 12 de Junho do ano passado, no apuramento para a Taça das Nações Africanas (CAN).

O despacho de acusação do Ministério Público não apresenta detalhes sobre o aliciamento de Ansumane Faty, o jogador guineense que integrava o plantel da União Desportiva Oliveirense em 2015-2016. Sabe-se, porém, que ele é suspeito de três crimes de corrupção passiva em competição desportiva – dois deles por causa do dinheiro que terá recebido em competições do Sp. Covilhã-Oliveirense e do Oliveirense-Leixões e um terceiro precisamente relacionado com o jogo da selecção da Guiné-Bissau. Os 20 mil euros ter-lhe-ão sido oferecidos pelo antigo treinador e ex-jogador de futebol Rui Dolores, que chegou a representar o Beira-Mar, o Boavista, o Académico de Viseu, o Paços de Ferreira e, no Chipre, o Alki Lanarca e o Nea Salamis.

Segundo a acusação, o esquema em que estavam envolvidos Rui Dolores e outros arguidos do processo, incluindo o campeão mundial de Riade sub-20 Abel Silva e dirigentes da claque Super Dragões, passava por servirem de intermediários entre “investidores” de origem malaia e futebolistas da II Liga, que não se importavam de jogar para perder se fossem pagos para tal. Objectivo: fazer ganhar aos “investidores” da Malásia dinheiro nas apostas desportivas, através de uma prática ilegal intitulada match fixing. O mercado de apostas desportivas online movimenta cerca de cinco milhões por jornada na II Liga.

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Cada jogador corrompido ganhava uma média de cinco mil euros por competição, umas vezes mais, outras menos. O Ministério Público explica o porquê da preferência pela II Liga: “Os montantes menos elevados necessários para a corrupção de equipas/jogadores/dirigentes, bem como a menor exposição mediática dos jogos, muitos deles sem transmissão televisiva”. Mesmo assim, por mais de uma vez a UEFA teve fortes suspeitas de manipulação, que transmitiu à Federação Portuguesa de Futebol, devido aos padrões irregulares das respectivas apostas.

Os investigadores descobriram que nem sempre os jogadores actuavam com o conhecimento da direcção dos clubes ou dos treinadores. Era o caso do Oriental, por exemplo, que de resto se constituiu assistente neste processo, para pedir uma indemnização aos arguidos. Já no caso do Leixões o Ministério Público quer que a SAD seja condenada nas penas acessórias de proibição de participação na I e II Ligas nacionais e deixe de receber subsídios ou incentivos do Estado, autarquias locais e demais pessoas colectivas públicas durante pelo menos três anos. O clube já reagiu dizendo que vai lutar contra a acusação “até às últimas instâncias judiciais.”

Quanto a Abel Silva, depois de ter deixado de jogar tornou-se empresário do sector, no qual continuava a ter contactos. E foi por isso que chegou a receber 30 mil euros numa casa de banho no Hotel Tryp Oriente, em Lisboa, a 22 de Abril de 2016, diz o Ministério Público. O dinheiro destinava-se a aliciar jogadores do Oriental para facilitarem a derrota do seu próprio clube num jogo contra o Leixões, que devia marcar pelo menos três golos para satisfazer as apostas planeadas. O ex-jogador responde agora por associação criminosa e corrupção activa.

Na claque dos Super Dragões foram constituídos arguidos Bruno Mendes, suspeito de nove crimes de corrupção activa, Cláudio Coelho, suspeito de um, e Carlos Silva, indiciado por 16 crimes de corrupção activa e ainda por associação criminosa, crime que pode valer até oito anos de cadeia aos chefes deste tipo de organizações e até cinco aos seus subordinados. 

Ciente das suas limitadas competências na língua inglesa, Carlos Silva recorria ao tradutor da Google para os malaios entenderem o que lhes dizia. Pode não ter sido, porém, compreendido na perfeição quando os quis avisar, em Agosto de 2015, da necessidade de serem discretos por o treinador e o presidente do Oriental já andarem desconfiados de que o mau jogo não era só azar. "Já demos o dinheiro, temos que fazer isso da maneira certa porque muita gente suspeita. Não dá para andar com muitos filmes, o treinador e o presidente estão em cima", escreveu. Saiu-lhe a seguinte tradução: "We have the money, we have to do it the right way because a lot of people suspected of not to walk with many movies the coach and the president on station."

 

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