A Antárctida voltou a vencer o Homem

O britânico Henry Worsley não resistiu ao desgaste físico e morreu sem cumprir o objectivo de atravessar o continente antárctico a pé, sozinho e sem assistência. Estava a 48 quilómetros do fim da expedição

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A solidão de Henry Worsley na Antárctida DR
Henry Worsley em Outubro passado com o príncipe William, patrono da expedição
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Henry Worsley em Outubro passado com o príncipe William, patrono da expedição REUTERS/John Stillwell (arquivo)
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Henry Worsley, já nos últimos dias da sua expedição DR

Após 71 dias e com mais de 1470 quilómetros nas pernas, Henry Worsley resignou-se a fazer o pedido de auxílio, sem capacidade para continuar devido ao seu estado de exaustão e desidratação severa. O explorador britânico de 55 anos tinha iniciado, em Novembro, a tentativa de tornar-se no primeiro homem a atravessar a Antárctida a pé, sozinho e sem qualquer assistência. Estava a 48 quilómetros do objectivo quando foi resgatado e transportado para Punta Arenas, no extremo sul do Chile, onde recebeu assistência médica. Mas o desgaste sofrido pelo seu organismo já era demasiado grave: os médicos detectaram-lhe uma peritonite bacteriana (infecção da cavidade abdominal) que tentaram operar, mas Worsley morreu no domingo, quando os seus órgãos começaram a falhar.

“É com inconsolável tristeza que anuncio a morte do meu marido Henry Worsley”, anunciou Joanna, a esposa do explorador e ex-militar britânico, lembrando o duplo propósito da iniciativa: “Angariou mais de 150 mil euros para a Endeavour Fund (uma instituição de solidariedade) para ajudar os seus colegas feridos, e ficou muito perto de completar a primeira travessia sem assistência da massa terrestre da Antárctida. Um percurso feito, sob condições meteorológicas excepcionalmente difíceis, para assinalar o 100.º aniversário da expedição Endurance, de Sir Ernest Shackleton – o herói da sua vida.”

A expedição à qual chamou, em jeito de homenagem, Shackleton Solo, significava para Henry Worsley a concretização do “sonho de atravessar o continente antárctico”. Para além do tributo ao explorador que em 1915 tentou fazer o mesmo percurso, havia a vertente solidária para com os militares feridos em combate – o próprio Henry tivera uma carreira de 36 anos no exército britânico, do qual se tinha reformado em Outubro.

“Era um homem que mostrou ter grande coragem e determinação”, reagiu o príncipe William, patrono da expedição. “Perdemos um amigo, mas ele continuará a ser uma fonte de inspiração para todos nós”, podia ler-se num comunicado do herdeiro do trono britânico.

Durante toda a duração da expedição, no site Shackleton Solo houve actualizações diárias do estado de espírito de Henry Worsley. Desde os dias de preparação no Chile, as duas semanas e meia de espera para que as condições meteorológicas permitissem voar para a Antárctida, até à batalha física e mental durante o percurso. No dia 10 de Novembro, por exemplo, o explorador britânico deixou o Chile e “tomou o último banho até 27 de Janeiro”, que era a data prevista para a conclusão da travessia. Worsley chegou à Antárctida no dia 13 de Novembro e iniciou a caminhada no dia seguinte. “O melhor lugar do mundo neste momento”, era como descrevia a paisagem gelada onde se encontrava.

Como não teria assistência, Worsley teve de levar consigo tudo aquilo de que poderia vir a necessitar – comida desidratada, equipamento e tenda, mais de 140 quilos que puxava num trenó. Foram 71 dias preenchidos de solidão e silêncio total, interrompidos apenas pela música e pelas chamadas a cada 24 horas para a base logística (se falhasse duas vezes iam procurá-lo). O frio e o vento foram uma constante, mas a principal dificuldade seriam os “dias brancos”, marcados pela falta de visibilidade: a luz reflectida pela neve e pelas nuvens encandeavam Worsley e faziam-no sentir-se “no interior de uma bola de pingue-pongue”, desabafou dias antes da sua morte.

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