Castel di Sangro, do milagre ao reforço que não o era

O clube de uma modesta localidade com apenas 6500 habitantes ganhou notoriedade quando, na década de 1990, chegou ao segundo escalão do futebol italiano.

A equipa actual do Castel di Sangro, que disputa as competições regionais
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A equipa actual do Castel di Sangro, que disputa as competições regionais DR
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A equipa actual do Castel di Sangro, que disputa as competições regionais DR
A equipa actual do Castel di Sangro durante um jogo
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A equipa actual do Castel di Sangro durante um jogo DR
A equipa do Castel di Sangro que disputou a Serie B em 1996-97
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A equipa do Castel di Sangro que disputou a Serie B em 1996-97 DR
O estádio de Castel di Sangro
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O estádio de Castel di Sangro DR

Onde é que já se viu um treinador trocar de guarda-redes numa partida que vai para o desempate por penáltis? Louis van Gaal fê-lo no Mundial 2014, quando era seleccionador da Holanda, e resultou: nos quartos-de-final, frente à Costa Rica, trocou Jasper Cillessen por Tim Krul, que defendeu duas grandes penalidades e colocou a Holanda nas meias-finais. Mas não se tratou de uma originalidade do técnico holandês: muito antes desse dia, em Itália, alguém se tinha lembrado de uma loucura semelhante.

Estava-se em 1996 e, na III Divisão italiana, disputava-se o play-off por uma vaga no escalão superior. Frente a frente, Ascoli e Castel di Sangro, cujo treinador Osvaldo Jaconi decidiu colocar em campo o guarda-redes suplente, que não havia jogado um minuto em toda a época, para o desempate por grandes penalidades. Pietro Spinosa defendeu o penálti decisivo e carimbou a subida à Serie B pela primeira vez na história do modesto clube, representativo de uma localidade com apenas 6500 habitantes.

Muitos descrevem a história do Castel di Sangro como um milagre – há até um livro, sem edição portuguesa, com esse título, escrito pelo jornalista e escritor norte-americano Joe McGinniss. O clube foi fundado em 1953, por iniciativa de um padre, para ajudar a reerguer a comunidade, que sofrera grandes estragos durante a II Guerra Mundial. A caminhada do Castello, como é conhecido o clube, começou no nono escalão. Mas ao longo dos anos foi subindo degraus, até ver-se na eminência de chegar à Serie B, antecâmara dos grandes palcos do futebol italiano.

Com a vitória no célebre desempate por penáltis, o Castel di Sangro começou a preparar-se para a estreia na Serie B. Em 1996-97 o clube disputou o segundo escalão, mas a temporada ficou marcada por inúmeras contrariedades: nas primeiras jornadas os jogos caseiros eram realizados a 100km de distância; dois jogadores morreram num acidente de automóvel e outro futebolista foi preso por envolvimento em tráfico de droga.

Também há o relato da chegada, com pompa, de um reforço nigeriano ex-Leicester City, Robert Ponnick. No jogo de estreia ficou claro para toda a gente que era um embuste: roubava a bola aos próprios companheiros de equipa, com quem se envolveu em escaramuças. Foi expulso e baixou as calças em frente à bancada. Ponnick era, afinal, um actor e tudo tinha sido planeado pelo próprio presidente Gabriele Gravina, que tinha aspirações políticas e queria ter visibilidade.

Apesar de todas as peripécias, e mesmo tendo o pior ataque da prova (29 golos em 38 jornadas), o Castello conseguiu a manutenção a uma jornada do fim do campeonato, justificando a descrição de milagre. McGinniss relata no livro como o último jogo da temporada, frente ao Bari (que disputava a subida à Serie A) terá sido manipulado: o autor ouviu jogadores do Castel di Sangro discutirem os pormenores da derrota por 3-1, resultado que veio a verificar-se.

A segunda temporada na Serie B trouxe o Castello de volta à realidade: com apenas cinco vitórias, o clube não evitou a despromoção e entrou numa espiral descendente que o levou à falência, em 2005. Sete anos depois, por não cumprir os critérios para inscrever-se nas competições, o Castel di Sangro foi afastado pela Federação italiana. Seguiu-se a refundação e o regresso aos campeonatos regionais. Mas, na memória colectiva, ficarão sempre aquelas duas milagrosas épocas na década de 1990.

* Planisférico é uma rubrica semanal sobre histórias de futebol e campeonatos periféricos. Ouça também o podcast

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