A consagração do Benfica e as “soluções” fáceis da maioria

A época 2016-17 chega ao fim com o alargamento de um ciclo de conquistas na Luz, com a introdução do videoárbitro e com o reforço da lógica da troca de treinadores.

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LUSA/MANUEL DE ALMEIDA

Caiu a cortina sobre mais uma temporada futebolística, que reforçou os tons de vermelho com que se fizeram três quartos da festa em território nacional: ao tetracampeonato, o Benfica já antes havia juntado a Supertaça Cândido de Oliveira, fechando o currículo em 2016-17 com a Taça de Portugal e a 11.ª dobradinha do seu historial. A nível interno, e ao contrário do passado recente, os “encarnados” falharam apenas o assalto à Taça da Liga, surpreendentemente conquistada por um Moreirense que só conseguiu respirar de alívio na Liga na última jornada.

A desconstrução do segundo título nacional de Rui Vitória oferece uma perspectiva inatacável do ponto de vista estatístico, ainda que os números digam que este foi o triunfo mais modesto dos últimos três anos. Ainda assim, foi um campeonato arrebatado pelo Benfica com margem suficiente para vincar as principais diferenças para a concorrência. As “águias” acabaram mesmo por fechar as contas com o melhor ataque (72 golos marcados), a melhor defesa (18 sofridos), o melhor comportamento em casa e fora de portas, a melhor série de triunfos.

Um registo que resistiu a uma perseguição cerrada do FC Porto especialmente no arranque da segunda volta. Com a chegada de Soares no mercado de Inverno, os “dragões” pareciam ter dado um salto qualitativo e aproveitaram um abrandamento do campeão para recuperar terreno. Mas, numa trajectória pontuada por críticas dos “azuis e brancos” às arbitragens, a recta final da equipa comandada por Nuno Espírito Santo ficou muito aquém das expectativas.

Apenas três vitórias obtidas nos dez últimos encontros da época redundaram não só na perda do título para o Benfica, mas também contribuíram para o fim do ciclo Nuno Espírito Santo no comando técnico do FC Porto. Um ciclo, de resto, bem mais curto do que tem sido tradição no Estádio do Dragão desde que Pinto da Costa assumiu os destinos do clube, já em 1982.

Primeiro e segundo classificados na Liga apresentaram o melhor e segundo melhor ataques, respectivamente, mas no que respeita a golos houve um nome que se destacou de forma flagrante dos 16 apontados por Mitroglou e dos 19 marcados por Soares. Bas Dost fechou a temporada de estreia em Portugal com 34 golos no campeonato, precisamente metade do total do Sporting na competição. O holandês superou, de resto, por dois remates o número obtido por Jonas na época anterior.

Ao ponta-de-lança dos “leões”, cujo instinto “assassino” só não superou o pé esquerdo de Lionel Messi (pronto para receber a Bota de Ouro), poderia atribuir-se o papel de herói sem pátria, condecorado com quatro hat-tricks e um póquer, que apenas servem para disfarçar as dissemelhanças reveladas pelo Sporting após 15 anos de busca incessante pelo título de rei do campeonato. Facto que, em última análise, levou Sporting e FC Porto — um “dragão” sem troféus há quatro anos — a forjarem uma aliança.

“Chicote” sem descanso

Fugindo à lógica dos “grandes” predadores, esta foi uma época atípica, com uma amplitude de “chicotadas psicológicas” a roçar o caricato. Seis dos 18 clubes conheceram três técnicos e dois deles (Arouca e Nacional) acabaram despromovidos, com o Moreirense (campeão de Inverno) a combater a ansiedade até ao final. De resto, só os quatro primeiros e o V. Setúbal escaparam a esta lógica de mudança de maquinista com o comboio em andamento.

Entre os treinadores que subiram a bordo a meio da viagem, há três que se destacam: Nuno Manta, que transformou a luta pela manutenção do Feirense numa aproximação real aos lugares europeus; Pedro Emanuel, que empurrou o Estoril para o meio da tabela quando a equipa já duvidava de si própria; e Ricardo Soares, que deu seguimento ao legado de Jorge Simão no Desp. Chaves.

Em matéria de apostas, importa distinguir as que engrandecem a modalidade, como os casos de André Silva (FC Porto) ou Gelson Martins (Sporting), jovens que beneficiaram de uma conjuntura favorável e que agarraram a oportunidade. As chamadas à selecção validam tudo o que de bom se pode extrair de futebolistas com grande potencial. André Silva (16 golos) sagrou-se melhor avançado português, secundado por Rui Fonte (Sp. Braga), com 11 golos.

No meio de apostas mais ou menos conseguidas, há uma que se destaca. Nélson Lenho, “capitão” do Desp. Chaves, foi o único totalista (3060 minutos) da I Liga. Aos 33 anos, com apenas duas participações anteriores (Leixões e Penafiel) no primeiro escalão (19 jogos no total), o lateral esquerdo foi a bandeira da entrega e dedicação transmontanas.

Numa temporada marcada também por outro tipo de apostas — a Santa Casa da Misericórdia activou suspeitas de resultados combinados — e pela introdução do videoárbitro, em pleno na final da Taça de Portugal, os “louros” foram colhidos em Lisboa e em Guimarães, onde a época do Vitória (4.º lugar, depois de um 10.º posto em 2015-16, e presença no Jamor) e a afirmação do Moreirense na Taça da Liga fizeram vibrar os adeptos. Mas foi com a festa do Benfica que fechou o ano desportivo, concluído com um “triplete” (expressão de Rui Vitória) interno que não alcançava há 36 anos.     

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