A “loucura colectiva” de Inglaterra no mercado de transferências de Verão

Clubes da Premier League contabilizam oito das dez mais caras contratações deste defeso. Fora de Inglaterra é o AC Milan quem mais compra.

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Reuters/JIM URQUHART

“De loucos” é como José Mourinho qualificou, a meio da última semana, as movimentações no mercado de transferências deste Verão, especialmente em Inglaterra. Até para o treinador português do Manchester United, os jogadores estão hiperinflacionados e os grandes clubes da Premier League, com os cofres recheados pela cedência dos direitos televisivos, estão a perder a cabeça.

Segundo Mourinho, isto acontece mesmo com jogadores mais medianos. As dez maiores contratações deste defeso (oito tiveram como destino o campeonato inglês) totalizam qualquer coisa como 527 milhões de euros, apenas menos 34 milhões do que o total gasto o ano passado com as dez transferências mais caras, segundo dados do site Transfermarkt. E isto quando ainda falta mais de um mês para o encerramento desta janela negocial.

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O técnico português sabe bem do que fala, ou não fossem os clubes da Premier League inglesa os principais impulsionadores dos negócios mais milionários. Nomeadamente (e por ironia) o seu Manchester United, que gastou 120 milhões de euros em apenas dois reforços: Lukaku custou perto de 85 milhões de euros (o recordista, até ao momento, deste Verão) e o ex-defesa benfiquista Lindelof chegou a troco de 35 milhões de euros.

Com um músculo financeiro estimulado pelo acordo milionário celebrado em 2015 para a cedência dos direitos televisivos, que injectou a astronómica quantia de 6,9 mil milhões de euros referentes ao triénio que termina em 2019, os clubes da Premier League comportam-se como autênticos predadores no mercado futebolístico, não olhando a despesas.

O Arsenal, por exemplo, tornou o ponta-de-lança francês Alexandre Lacazette no seu jogador mais caro de sempre, depois de pagar 53 milhões de euros pelo passe ao Lyon. O Liverpool fez o mesmo com o extremo egípcio Mohamed Salah, depois de convencer os dirigentes da Roma com 42 milhões de euros. E, mais recentemente, o sempre activo Manchester City tornou o inglês Kyle Walker (ex-Tottenham: 51M) e o franco-senegalês Benjamin Mendy (ex-Mónaco: 57,5M) nos mais caros defesas da história.

O negócio de Walker levou o jornal The Guardian a questionar-se se os clubes ingleses perderam definitivamente a cabeça. “Mesmo dentro de uma bolha dourada do futebol, este é um acordo que se destaca. Walker tem 27 anos. Só marcou cinco golos […]. E agora é o defesa mais caro da história”, sublinhou o diário britânico.

“Parece que uma loucura colectiva tomou conta da Premier League, que agora tem os cinco defesas mais caros da história: Walker, John Stones [Manchester City], David Luiz [Chelsea], Eliaquim Mangala [Manchester City], Luke Shaw [Manchester United]. Em parte, é o resultado do último acordo de transmissão dos jogos, o que significa que cada um dos 20 clubes da Premier League integra o ranking dos 30 clubes da Forbes [revista norte-americana de negócios e economia] em termos de receita anual. E em parte é por causa dos xeques, oligarcas e dos grandes fundos financeiros proprietários de clubes ingleses”, conclui o The Guardian.

O Manchester City é o exemplo mais sonante. Ao clube, adquirido em 2008 pelo xeque Mansour bin Zayed Al Nahyan, dos Emirados Árabes Unidos – que lidera um fundo de investimento Abu Dhabi United Group –, continuam a chegar futebolistas contratados a peso de ouro. Neste mercado de transferências está a bater recordes, tendo gasto a módica quantia de 228,5 milhões de euros em apenas cinco jogadores. E apenas um, o internacional português Bernardo Silva (ex-Mónaco: 50M), veio reforçar o ataque. Os restantes quatro são um guarda-redes (o ex-benfiquista Ederson) e três defesas laterais.

Um poder para aumentar

A pujança inglesa no mercado de transferências já se havia sentido no Verão de 2016, quando, tal como agora, tinham acolhido oito das dez maiores contratações, com Paul Pogba à cabeça. O médio francês levou o Manchester United de Mourinho a pagar 105 milhões à Juventus de Itália, num dos maiores negócios da história do futebol.

E o impacto do poder do futebol inglês promete manter-se e até intensificar-se nos próximos anos. Os responsáveis da Premier League deverão encerrar em Fevereiro do próximo ano as negociações dos direitos televisivos para o triénio 2019-22, estando em perspectiva um novo contrato estratosférico, a bater todos os recordes. Estes acordos têm revolucionado as finanças dos clubes, representando actualmente cerca de 60% do total do volume das suas receitas.

Mas não é só em Inglaterra que se têm cometido “loucuras”. Em Itália, o AC Milan foi o primeiro clube europeu a ultrapassar a barreira dos 100 milhões de euros em contratações neste Verão. O histórico emblema, vendido em Abril a um grupo de investidores chineses (Rossoneri Sport Investment Lux) por 740 milhões de euros, depois de ter estado três décadas nas mãos do empresário e ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi, voltou a atacar o mercado em força para recuperar o seu estatuto de grande potência do futebol europeu.

O defesa central Leonardo Bonucci, retirado à Juventus a troco de 42 milhões de euros, é, até agora, a sua mais sonante contratação, seguido pelo ex-ponta-de-lança portista André Silva, cedido pelos “dragões” a troco de 38 milhões de euros. A fechar o pódio dos “rossoneri”, surge o também defesa Andrea Conti, desviado do Atalanta, por 25 milhões.

Mais discretos no mercado estão os principais colossos espanhóis, Real Madrid e Barcelona, habituais presenças no ranking dos mais gastadores. Algo que poderá mudar drasticamente nos próximos dias ou semanas. Para já, o Atlético de Madrid tem sido o emblema espanhol mais activo nesta bolsa negocial, depois de ter despendido 36 milhões de euros a contratar o extremo Vitolo ao Sevilha. Um jogador que não poderá utilizar até Janeiro de 2018, na sequência de um castigo da FIFA que impede o clube de inscrever novos jogadores até essa data. Vitolo será, entretanto, emprestado ao Las Palmas.

Receitas impensáveis

Se as “loucuras” cometidas no mercado de transferências tornam praticamente impossível aos clubes com menos argumentos monetários manter as suas pérolas, possibilita-lhes também encaixes financeiros impensáveis há alguns anos. É o caso do Benfica que, com a venda dos passes de três jogadores, amealhou 105 milhões de euros. Um recorde em Portugal. Só o Manchester City e o Manchester United transferiram para os cofres da Luz 75 milhões pelas aquisições do guarda-redes Ederson (40M) e do defesa central Lindelof (35M), respectivamente. Montante a que se juntam os 30,5 milhões que o Barcelona pagou pelo jovem defesa direito Nélson Semedo.

A cerca de 40 dias do encerramento do mercado de Verão e com a especulação crescente sobre algumas das maiores estrelas a jogar na Europa, são esperados mais e maiores devaneios. Entre os protagonistas de potenciais negócios delirantes está o brasileiro Neymar, por quem os franceses do PSG poderão chegar à absurda quantia de 222 milhões para o resgatar ao Barcelona. Mas também o franco camaronês do Mónaco Kylian Mbappé, pretendido pelos maiores “tubarões” do continente e por quem o clube do principado exigirá um montante mínimo de 190M.

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