A César o que é de César, a Ronaldo o que é de Ronaldo

Temos de “atacar” a máquina fiscal espanhola. É o mínimo que podemos fazer por quem já nos deu tanto.

Quem me conhece sabe que eu vivo e respiro futebol. Dizem que é defeito de fabrico (ou de família), mas a minha mulher lá acabou por se conformar na hora do “Sim”. E quem me conhece sabe também o quanto eu adoro Ronaldo. Pelo bem que joga e pelo que representa para todos nós.

Ronaldo é assim uma espécie de Hércules, meio homem, meio Deus, que decidiu passar uns anos na terra a jogar futebol, para nosso deleite. Só por isso já tem lugar cativo no Olimpo do desporto rei.

Qual privilegiado, recordo vivamente o momento em que me aproximei desse Olimpo: foi no dia 30.07.2003, tinha 14 anos e fazia de apanha bolas num jogo entre Estoril e Sporting. Durante o intervalo, os suplentes do Sporting — entre os quais Ronaldo — faziam uma peladinha junto a uma baliza, enquanto nós trocávamos umas bolas perto da bandeirola de canto. Foi então que o craque me disse: “Puto, puto, centra aí!” Enchi-me de coragem e lá chutei. O centro saiu com força e bem direccionado, a impulsão de Ronaldo foi incrível e o cabeceamento absolutamente letal: golo! Nem queria acreditar, tinha acabado de assistir Ronaldo. Como recompensa, recebi um sorriso e um polegar bem levantado no ar.

Poucos dias depois, Ronaldo arrasava o Manchester United e fugia para terras de Sua Majestade. Podia ir. Eu já tinha o meu pedacinho de céu. Aquele “fixe” bastara-me.

Infelizmente, nem tudo são rosas para CR7. Depois de “varrer” La Liga e de “limpar” mais uma Champions, sai um murro no estômago para o madeirense. A acusação é de fraude fiscal. Alegadamente, a estrela lusa deve 14,7 milhões de euros a “nuestros hermanos”.

É verdade que nunca esperei ver Ronaldo embrulhado em “tonterías” com o fisco espanhol e há quem diga que esta trapalhada arrasa a sua imagem. Quando muito, parece-me, pode é prejudicar o futuro do Real Madrid, se este não defender devidamente o seu ganha-pão.

Claro que pessoas como o Ronaldo, com biliões de seguidores, têm de ser modelos de integridade. E isso implica ter as contas em dia. Mas quantas pessoas não se atrasaram já a pagar impostos ou pagaram multas às finanças? E não são todas más pessoas, pois não?

Não é desculpar o indesculpável, mas estamos a falar de um “zilionário” que vive num mundo estratosférico e que, certamente, nem trata destes assuntos. Havendo infracção fiscal, é provável que o responsável nem seja ele. E será normal que as suas dívidas acompanhem o nível dos seus rendimentos. É dizer, 14 milhões serão obscenos para o comum mortal, mas talvez não o sejam no planeta Ronaldo.

Nada disto é surpresa no país vizinho. Messi, Nadal e agora Mourinho — será perseguição ou há algo mais por trás da caça ao dinheiro luso? — são só algumas das vítimas da implacável “Hacienda” espanhola. E se isso não impediu Nadal de alcançar mais uma proeza épica há dias, esperemos que não impeça Cristiano de nos trazer mais um caneco — o da Taça das Confederações!

Quanto aos milhões em si, das duas, uma: se não forem devidos o tema morre; se efectivamente o forem, é preciso perceber se houve ou não intenção de cometer fraude — de qualquer forma, a quantia pode ser paga e com juros. Nada que não se resolva.

Tudo dependerá do que os advogados conseguirem demonstrar. Quem ouviu Lobo Xavier já fica com uma ideia: a “fiscalía” pretende tributar Ronaldo em Espanha pelos rendimentos resultantes de direitos de imagem, mesmo que estes se reportem a contratos no estrangeiro. A tese é rocambolesca e, segundo o advogado, a lei é omissa.

A ser assim, a indignação de Ronaldo é compreensível. Adaptando a passagem do evangelho: “Dai a César o que é de César e a Ronaldo o que é de Ronaldo.” Como dizia Ferreira Leite, temos de “atacar” a máquina fiscal espanhola. É o mínimo que podemos fazer por quem já nos deu tanto.

E isso é tão mais importante quando vemos que o Real não está disposto a fazê-lo. Não percebem que o pior que lhes poderia acontecer seria venderem menos umas camisolas. Assim, arriscam-se a perder o melhor do mundo. Prova disso são as notícias que dão conta da vontade do jogador em sair do clube. Já estou a ver os PSG’s desta vida e outros clubes a esfregar as mãos. Saiu-lhes o Euromilhões do futebol!

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