Uma pala branca para resguardar o Papa Francisco

O Santuário de Fátima tem um novo altar exterior, já em uso desde Maio de 2016, mas que terá agora o Papa Francisco a proceder à sua “dedicação” definitiva. A arquitecta Paula Santos procurou uma estrutura simultaneamente funcional e “invisível”.

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Nelson Garrido
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O branco é simultaneamente a ausência de cor e a soma de todas as cores – e o imaginário mariano vê nele a cor mais próxima da alma humana... Talvez por essa razão, a arquitecta Paula Santos (Águeda, 1961) escolheu o branco para o novo altar exterior do Santuário de Fátima, que vem já sendo utilizado desde Maio do ano passado, mas será agora definitivamente “dedicado” pelo Papa Francisco na sua primeira visita a Portugal, no centenário das Aparições.

“A nossa preocupação foi desenhar uma estrutura de carácter perene com uma forma delicada, e que não interfira de forma muito impositiva com as pré-existências arquitectónicas do lugar, e ao mesmo tempo sirva as funções para que foi pensada”, diz a arquitecta na visita em que guiou o PÚBLICO em volta (e ao interior) da nova estrutura.

E bem se pode dizer que o objectivo foi alcançado: visto de longe, do fundo do amplo recinto de Fátima, o novo altar quase não se distingue do edifício da antiga Basílica de Nossa Senhora do Rosário (um projecto de 1928, do arquitecto holandês Gerard Van Krieken), ao qual parece servir como uma nova base, em quase levitação. Além do branco, a finura e a leveza da cobertura ajudam a essa presença discreta, mas apesar de tudo evidente, e sobretudo funcional.

Paula Santos, formada na Faculdade de Arquitectura do Porto e com uma passagem como docente pela escola congénere em Coimbra, coordenou a equipa portuguesa que colaborou com Alexandros Tombazis na construção da nova Basílica da Santíssima Trindade, no topo sudoeste do recinto. Foi ainda a este arquitecto grego que os responsáveis pelo santuário encomendaram, há meia dúzia de anos, o desenho de um novo altar – já com o centenário das Aparições em vista –, com o objectivo de substituir, de forma perene, a estrutura que em 1982 fora feita pelo arquitecto Erich Corsepius (1929-2009) para acolher o Papa João Paulo II.

“Tombazis convidou-me a integrar de novo a sua equipa, fez o contrato, mas como então já estava doente e o seu estado de saúde agravou-se, ficámos nós com a responsabilidade do projecto, e fizemos o trabalho até ao fim”, explica Paula Santos, que tem atelier profissional no Porto.

Pala de 600m2

A leveza da pala que cobre o novo altar e que, de longe, quase parece apenas uma linha branca, é a principal mais-valia formal da nova construção. Paula Santos realça que se trata de uma superfície de 600 metros quadrados, “disfarçada” por um desenho que na parte central tem uma espessura de 90 centímetros, descendo nas extremidades para os 20. “Nós queríamos que a cobertura fosse o menos visível possível”, diz a arquitecta. Um efeito apenas afectado pela presença, incontornável, da teia de projectores pretos e de altifalantes. “Ainda tentámos pintá-los de branco, mas a legislação não o permite”, explica.

A pala, em fibra de vidro construída com a assessoria do INEGI (Instituto de Engenheira Mecânica e Gestão Industrial da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto), está apoiada sobre oito pilares metálicos, revestidos com betão branco, que sustentam também o corpo central da estrutura, de onde divergem as três componentes centrais do conjunto: o altar propriamente dito, o ambão ou púlpito, ambos em bronze, e o plinto em mármore onde assenta o andor de Nossa Senhora. Os três elementos foram desenhados pelo arquitecto João Mendes Ribeiro (Coimbra, 1960), conhecido, para além da sua prática como arquitecto, pelos espaços cénicos que tem criado para teatro. Coube-lhe também desenhar as três cadeiras da presidência (em bronze e madeira) no centro do presbitério, que no total pode acolher até 192 lugares para os concelebrantes das cerimónias.

A completar os adornos artísticos e simbólicos do altar está um Cristo esculpido por Filip Moroder Doss, sobre uma cruz ligeiramente descentrada – e este é o único elemento que foge à simetria que pontua toda a obra – e “escavada” em relevo na parede do fundo.

A face tardoz do presbitério, virada para o santuário, foi desenhada por Fernanda Fragateiro (Montijo, 1962), escolhida na sequência de um concurso que o santuário abriu a um número limitado de convidados. Realizada em betão e aço polido, a escultura oferece-se como espelho que reflecte de forma seccionada o santuário, a escadaria envolvente e as pessoas que por aí passam.

Exigências funcionais

Num espaço agora bem mais amplo do que o altar anterior, a equipa de Paula Santos teve como preocupação responder a questões muito práticas. “O programa era exigente, muito virado para questões funcionais que nos foram sendo explicadas pelo santuário e pelos seus consultores ao longo do processo”, nota a arquitecta, citando a necessidade de dar resposta às exigências de um altar de exterior destinado a cerimónias religiosas para grandes assembleias. “Fomos corrigindo ou adaptando o projecto àquilo que são as necessidades funcionais, e ao mesmo tempo procurando também uma resposta formal e arquitectónica que fosse interessante para o recinto”, acrescenta.

Resposta directa a essas exigências foi a opção por criar um novo piso debaixo do presbitério. Destinado a infra-estruturas técnicas (energia, ar condicionado, sanitários) mas também aos serviços de apoio às celebrações, o espaço maior deste piso -1 é uma sacristia onde se encontra instalada a Sagrada Reserva: um cofre-sacrário que guarda hóstias e as píxides em que elas são distribuídas por 200 mil pessoas. Um elevador e duas escadas laterais permitem aceder ao piso do altar.

A equipa de projectistas teve também a preocupação de equilibrar o novo equipamento com a escadaria, as colunatas e os átrios que circundam o velho santuário, redesenhando pavimentos para melhor circulação dos celebrantes e dos assistentes, melhorando a visibilidade e a iluminação.

“Além da leveza, também queríamos que o altar tivesse uma certa monumentalidade, porque se trata de uma obra definitiva – não queríamos fazer um mono”, diz Paula Santos, manifestando a expectativa de que, quando ali chegar a 12 de Maio, o Papa Francisco se sinta bem no novo altar.

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