“Sucesso imediato, mas não para durar”

Em 2015, Star Wars é um fenómeno global imediato. Estreia em Portugal em simultâneo com quase todo o mundo, em 150 salas por todo o país, acompanhado de uma gigantesca campanha de promoção. Em 1977, Star Wars era um fenómeno a várias velocidades. A 25 de Maio, estreou nos EUA em 32 salas, chegou a Portugal quase sete meses depois, exibido numa sala em Lisboa. Lisboa viu, durante sete semanas, o primeiro capítulo da saga criada por George Lucas na enorme sala do Monumental, com capacidade para mais de duas mil pessoas. Só depois seguiu para outras paragens.

Star Wars - A Guerra das Estrelas estreou em Portugal a 6 de Dezembro de 1977 no Monumental, substituindo em cartaz Boccaccio 70 (o filme-antologia com segmentos de Fellini, De Sica e Visconti), em quatro sessões diárias (14h, 16h30, 19h e 21h30), de segunda a domingo, e “não aconselhável a menores de 13 anos”, projectado em 70mm. No mesmo edifício, na sala Satélite, exibia-se Sangue Virgem para Drácula, directamente do estábulo de Andy Warhol, um filme de terror/erótico realizado por Paul Morrisey.

O sucesso aconteceu, embora não na mesma dimensão dos EUA. “Já vinha com grande sucesso dos EUA, com as pessoas a passarem a noite à porta dos cinemas à espera para entrar. Em Portugal, não aconteceu nada disso. Eu, pelo menos, nunca vi”, recorda ao PÚBLICO, José Manuel Castello Lopes, distribuidor, como o próprio referiu logo no início da conversa, “dos seis primeiros filmes”. Só depois das sete semanas em exibição no Monumental é que o filme foi exibido em outras salas portuguesas. Ao Porto, só chegou no fim de Janeiro de 1978.

No final dos anos 1970, as páginas de espectáculos dos jornais eram preenchidas com anúncios de teatro e cinema. Ao lado da promoção de A Guerra das Estrelas, apareciam com igual ou maior destaque a promoção de filmes como O Regresso do Inspector Martelada, A Liceal, As Aventuras Eróticas de Zorro, ou a revista Alto e Pára o Baile, em exibição no Teatro Maria Vitória e anunciada como “a melhor revista de sempre”. A promoção inicial ao primeiro episódio de Star Wars até parecia relativamente discreta, com a frase “Fantásticamente fantástico!”, e apenas com a referência a dois actores secundários no filme, mas com passado de “estrela”, Peter Cushing e Alec Guiness – na altura ninguém saberia quem eram Harrison Ford, Mark Hamill ou Carrie Fisher.

A sua popularidade, recorda José Manuel Castello Lopes, distribuidor do filme, “foi uma surpresa”. Mas havia quem não acreditasse muito nesta saga intergaláctica, a julgar por algumas críticas da altura. “Lucas fez sucesso imediato, mas não para durar”, dizia uma crítica pouco profética do Diário de Lisboa. Outra crítica do mesmo jornal acrescentava que “A Guerra das Estrelas, para além de um breve divertimento lúdico, fica com um certo sabor a desilusão”. Tito Lívio, crítico de cinema e teatro do Diário Popular, começava o seu texto com um “A Montanha Pariu um Rato”. “História ingénua, de um maniqueísmo grosseiro”, prosseguia o crítico, falando de “personagens primários e mal esboçados”.

“Foi recebido com muita estranheza e uma certa crítica adversa. Uma certa intelectualidade tinha achado o filme irrelevante”, diz ao PÚBLICO Lauro António, que, em 1977, escreveu uma crítica no Diário de Notícias, em que dava a nota máxima da sua escala de classificação – um 5 -, referindo-se ao filme como “obra-prima da aventura, da audácia, do arrojo, do humor” e com “grande riqueza e complexidade no plano filosófico”. “Emocionante”, é como termina Lauro António a sua crítica no Diário de Notícias.

Também José Vaz Pereira é altamente elogioso na sua crónica n’ A Capital, onde reforça a dimensão de entretenimento do filme de Lucas. “Um regresso às origens [...] onde o divertimento e o prazer das imagens representam um grande papel. O que é reconfortante nestes tempos cinzentos”, escreve o crítico. “É um regresso aos filmes na idade da inocência absolutamente dirigido para um mercado que dá outra vez sinal de vitalidade: o das assistências familiares. A miudagem vai gostar com certeza.”

Filme antifascista?

A Guerra das Estrelas chegou a Portugal três anos e oito meses depois da revolução de 1974 e há quem dê uma camada suplementar a esta história de uma rebelião contra o Império. “O antifascismo nas galáxias” é o título do texto de Fernando Cabral Martins no Expresso de 10 de Dezembro de 1977. “De acrescentar um pormenor curioso. Neste mundo de fantasia vive-se um significativamente esquemático conflito político que opõe os amantes da liberdade aos servos do Império Galático”, escreve Cabral Martins. Vaz Pereira, n’ A Capital, faz uma referência semelhante: “A história é esquemática, branco contra preto, bons contra maus, homens livres contra ditadores. Os rebeldes acreditam que que a democracia vencerá […] ao passo que o Império pensa que poderá esmagar toda a resistência.”

“Ainda estamos numa época efervescente do ponto de vista revolucionário. O filme é pura aventura, apesar de até se poder fazer um elogio da revolução”, comenta Lauro António, que não tem a certeza se o filme seria censurado caso tivesse estreado antes de 25 de Abril de 1974: “É difícil de responder. Dependeria da sensibilidade dos censores. Eles por vezes descobriam coisas em coisas que não tinham nada e deixavam passar outras que tinham de cortar já depois do filme estar a ser exibido. Como este era um filme de aventuras, acredito que passaria, mas era capaz de levar um desbaste em algumas réplicas mais revolucionárias.” 

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