É possível dar boas notícias num Ministério da Cultura suborçamentado?

Castro Mendes foi ao Parlamento anunciar um director artístico para o São Carlos, um contrato-programa para o D. Maria II e o novo contrato para a agência Lusa. Para a situação mais grave, a da Fundação Côa Parque, ainda não há solução.

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O Ministro da Cultura Luís Filipe Castro Mendes no Parlamento Daniel Rocha

Foi uma dança entre a equipa do Ministério da Cultura (MC) e os deputados da oposição. Há um mês no cargo, o novo ministro, Luís Filipe Castro Mendes, e o secretário de Estado, Miguel Honrado, foram pela primeira vez ouvidos no Parlamento, na audição habitual de apresentação na comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, e quiseram levar boas notícias. Os deputados do PSD e do CDS, por sua vez, sublinharam que o actual Governo de António Costa deu menos dinheiro à Cultura do que o da anterior coligação.<_o3a_p>

O primeiro anúncio do ministro que veio substituir João Soares, que se demitiu no início de Abril, foi que já estão “garantidos fundos de 1,6 milhões de euros” para que a Direcção-Geral das Artes (DGArtes) possa pagar as verbas atribuídas pelos concursos bienais de apoio às estruturas artísticas independentes. E como tudo o que “é programação artística” tem a ver com o secretário de Estado, afirmou o ministro, foi Miguel Honrado a esclarecer mais à frente que “foi preciso corrigir a trajectória dos concursos bienais a meio do processo” e “honrar o financiamento do segundo ano do concurso” a mais de 20 estruturas, que não estava orçamentado. Esse montante foi obtido através de uma descativação orçamental no valor de 800 mil euros autorizada especialmente pelo Ministério das Finanças; o restante veio de verbas do Fundo de Fomento Cultural. A partir de Junho, já tinha dito o ministro no início, vão também poder abrir os concursos para os apoios pontuais da DGArtes.<_o3a_p>

“É evidente que a DGArtes está reduzida a um organismo cuja missão é apenas a distribuição de financiamentos e já foi uma plataforma de diálogo com o meio [artístico]. Queremos retomar esse perfil de diálogo com o sector cultural de iniciativa não-governamental”, disse o secretário de Estado.<_o3a_p>

Num dia em que tinha também encontro marcado com o primeiro-ministro na inauguração da nova exposição do Museu Nacional de Arte Antiga, Castro Mendes afirmou também que tinha encontrado uma “solução laboral” para os mais de 100 funcionários dos museus nacionais que arriscavam ver os seus contratos caducados.<_o3a_p>

O deputado do PSD Sérgio Azevedo, a quem coube fazer as primeiras perguntas, foi directo às “restrições orçamentais” do ministério, com uma dotação “para política cultural de 174 milhões de euros”, descontada a verba para a RTP e para a comunicação social, “o que é bastante inferior à dotação orçamental do anterior governo”. “É para desmistificar um pouco a narrativa e contrariar um pouco as palavras do primeiro-ministro.” Já tinha citado as declarações de Castro Mendes aos jornalistas durante a tomada de posse para o pôr a dizer que ninguém estava satisfeito com o orçamento do MC para 2016.<_o3a_p>

O ministro respondeu que tem “uma posição pragmática e realista” sobre o orçamento. Lembrou que lhe foram dados para 2016 mais dois por cento em relação ao orçamento executado pelo anterior governo em 2015, “uma comparação essencial”, e que mostra que essa execução orçamental foi “insuficiente”.<_o3a_p>

Foi a deputada do PS Gabriela Canavilhas, que já esteve à frente do ministério, a introduzir o tema da nova direcção artística do Teatro Nacional de São Carlos, dizendo que o concurso internacional aberto lhe parecia “feito à medida”. Pouco depois, e com outras novidades pelo meio, Miguel Honrado disse que o despacho com a nomeação de Patrick Dickie como novo director artístico do São Carlos já tinha sido assinado por João Soares quando a nova equipa chegou ao ministério. Lembrou também que o consultor, produtor e dramaturgo britânico era até aqui programador convidado do teatro de ópera de Lisboa (é da sua responsabilidade a actual temporada lírica).<_o3a_p>

Entretanto, Castro Mendes anunciou também que já está “aprovada a museografia” do Museu dos Coches com os respectivos fundos: “Teremos o Museu dos Coches como deve ser.” Sobre se o património do Centro Cultural de Belém (CCB) foi lesado pela anterior administração, afirmou que o CCB “não está numa situação de ruptura” e que o MC quer fazer dele “um grande centro de cultura”.<_o3a_p>

Miguel Honrado disse que há 18 milhões de euros no Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) para os concursos deste ano, um crescimento de um milhão de euros em relação ao ano passado. “Depois de vencidos os problemas das descativações, podemos abrir os concursos.”<_o3a_p>

A deputada Teresa Caeiro, do CDS-PP, que já foi secretária de Estado da Cultura, lembrou novamente as palavras do ministro sobre o orçamento. Com “uma diminuição de dois milhões de euros”, argumentou, há “um problema incontornável” e até os parceiros “da geringonça estão desiludidos e insatisfeitos”.<_o3a_p>

Castro Mendes considerou essa descrição de que “não estava satisfeito” como “um problema de comunicação política”, e precisou que o que tinha dito é que ninguém está satisfeito: nem ele, nem o primeiro-ministro, nem o ministro das Finanças. “Foi uma boa lição de política”, rematou, prometendo frases mais curtas e recordando que sobre a “suborçamentação” da Cultura já tinha respondido.<_o3a_p>

Pedro Pimpão, do PSD, saudou o ministro pela “frontalidade e transparência com que coloca os assuntos”. E repetiu o discurso da oposição: “O orçamento da Cultura para este ano é menor do que em 2015, cerca de três milhões de euros menos.”<_o3a_p>

Foi altura de se falar de comunicação social e o ministro da Cultura afirmou que o novo contrato da agência de notícias Lusa já “está feito", com mais dois milhões de euros do que no orçamento de 2015. Mas as “boas notícias”, em resposta às perguntas da deputada do PS Carla Sousa, não eram só essas: há um contrato-programa a assinar com o Teatro Nacional D. Maria II até 2018, que lhe permitirá um melhor planeamento. Os pormenores foram já dados por Miguel Honrado, que até aqui presidia ao conselho de administração do D. Maria II. “Os últimos contratos foram já de 2010. É uma das prioridades em cima da mesa. Vamos saber se podemos integrar 2016 retroactivamente.” Em cima da mesa está também a possibilidade de o contrato ser replicado noutros teatros nacionais.<_o3a_p>

Sobre a RTP, o ministro disse manter um diálogo constante com a administração e prometeu uma conversa com os deputados sobre a televisão pública, a Televisão Digital Terrestre ou sobre os outros operadores privados. “É toda uma área que tenho que estudar. Sou um homem de cultura.”<_o3a_p>

Já quanto ao futuro da Fundação Côa Parque, o ministro não tem ainda uma resposta para o requerimento apresentado pelo PCP sobre as suas dificuldades financeiras. “Quando cheguei ao Governo encontrei muitas coisas complicadas, a mais grave foi a de Foz Côa.” Castro Mendes ainda não está convencido de que a solução seja acabar com a fundação – uma vez que assim se perderia a participação dos sócios-fundadores, entre os quais estão vários ministérios e a Câmara de Foz Côa –, e colocar museu e parque sob a tutela directa do MC. “Será a solução passar para um ministério suborçamentado?”, perguntou, sublinhando que estava a usar um termo dos deputados. “Podem até dizer que estou a sonhar…"

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