Paradoxalmente firme e etéreo

Um dos ícones do piano russo, Boris Berezovsky, passou pela Casa da Música.

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Em dia de grande azáfama pianística (a habitual celebração do aniversário de Helena Sá e Costa com centenas de estudantes de piano a tocarem em vários pontos do edifício), a Casa da Música recebeu um dos ícones do piano russo: Boris Berezovsky.

Logo à chegada, surpreendeu a alteração do programa da segunda parte do concerto:  Stravinsky (em pleno Ano Rússia) é substituído por Beethoven e Chopin. O que não causou qualquer surpresa foi o vigor com que Berezovsky atacou a Sonata para piano de Bartók. Plena segurança (com partitura), uma ou outra nota ao lado sem causar qualquer mossa, a sonata abriu o espaço musical sem que, mesmo no segundo andamento, se vislumbrasse o carácter quase espectral com que os dedos de Berozovsky sobrevoariam o teclado no ambiente que se seguiria: Grieg, primeiro com Nove peças líricas e depois com três das Quatro danças norueguesas, op. 35. Com as obras do compositor norueguês, Berezovsky produziu pianíssimos de extrema agilidade, com rara entoação melódica, não interferindo com a inabalável sensação de firmeza que sempre transparece.

A segunda parte do concerto abriu com uma das mais canónicas sonatas de Beethoven. Uma vez mais, foi a leveza com que aflorou o teclado nos pianíssimos, produzindo um som quase irreal, que sobressaiu da sua interpretação absolutamente sóbria. Sem Petruchka e sem Sonata, os 12 Estudos op. 10, de Chopin, completaram o programa do recital, mostrando aos jovens aspirantes a pianista que por ali pudessem estar que Chopin é, afinal, uma “brincadeira”.

O público aplaudiu a sua convincente actuação e, no segundo regresso ao palco, Boris Berezovsky encaminhou-se para o piano informando que, apesar de aquele ser um instrumento "difícil", brindará o público com um número extra de Rachmaninov. Aplausos de pé, algumas saídas de público, dois regressos ao palco e uma despedida com gestos tão inequívocos como toda a sua prestação puseram fim a mais um singular recital da grande escola russa.

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