O impacto do novo nos Mbongwana Star

Regresso à República Democrática do Congo, agora para algo de verdadeiramente diferente.

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Os Mbongwana Star pouco têm a ver com os Staff Benda Bilili, apesar de terem dois dos membros em comum DR

Há meia dúzia de anos deu nas vistas no circuito das chamadas músicas do mundo um colectivo chamado Staff Benda Bilili, da República Democrática do Congo.

 O núcleo do grupo eram quatro cantores e guitarristas, todos eles paraplégicos, movendo-se em cadeiras de rodas e tocando nas ruas de Kinshasa. A sua história correu mundo, gravaram dois álbuns, fizeram uma digressão, foram motivo de documentário; há dois anos, separaram-se. 

Ao que parece, na base da decisão estiveram motivos financeiros e também de direcção estética. O que não surpreende depois de se ouvir o álbum de estreia dos Mbongwana Star, o novo grupo de dois dos membros fundadores desse colectivo, agora acompanhados por mais três músicos das novas gerações e pelo músico e produtor irlandês, a viver em França há muito, Doctor L. Os Mbongwana Star pouco têm a ver com os Staff Benda Bilili. Dir-se-ia que os últimos simbolizaram a possibilidade de dar a conhecer expressões, apesar de tudo clássicas, da música do Congo, enquanto os primeiros promovem uma saudável balbúrdia de onde emerge uma invulgar e vibrante sonoridade urbana. 

O irlandês Liam Farrell, ou seja Doctor L, que no passado já havia trabalhado com o histórico músico nigeriano Tony Allen, é capaz de ter sido uma peça essencial na definição estética do projecto, promovendo uma sonoridade escultórica sempre à beira da deflagração, adquirindo novas formas de canção em canção. Dito assim, poder-se-ia imaginar um álbum sem unidade, mas não. Independentemente das formas que vão adquirindo os diferentes elementos que se vão sobrepondo — baixos distorcidos, percussões hipnóticas, guitarras do pós-punk, ecos electrónicos, reverberações psicadélicas devedoras do dub ou vozes saturadas —, tudo parece ter passado pela mesma peneira de vigor imparável. 

É uma música que respira um saudável desrespeito pela História, por geografias e por identidades estáveis, tudo inserido num território urbano incerto que o grupo interpreta com entendimento sólido. Outro colectivo do Congo, os Konono Nº1, participa numa das faixas, mas este é daqueles álbuns em que não vale a pena procurar destrinçar um mapa de referências, sejam europeias ou africanas, porque tudo converge para um presente familiar e estranho em simultâneo, onde o choque do novo, tão ausente da música actual, acaba por despontar. 

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