O Gigante Amável e os seus brinquedos

Retrato de uma personagem, retrato de uma estranheza: O Grande Fusi

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Um estudo psicológico de uma personagem

Fusí é grande, no corpanzil do actor Gunnar Jonsson (assim uma espécie de Vincent Macaigne islandês), mas também é inofensivo: um quarentão vagamente deprimido, bom coração, adolescente eternizado que ainda vive com a mãe e suprime as carências afectivas (e sobretudo as mulheres que nunca teve) fixando-se nos seus brinquedos, especialmente as miniaturas e maquettes de batalhas da II Guerra mundial.

Dágur Kuri, que aqui assina a quarta longa-metragem e de quem já se estreara em Portugal o mais surpreendente Nói, o Albino, constrói O Grande Fusi com centro absoluto nesta personagem, uma espécie de estudo psicológico que a dada altura – a partir do encontro de Fusí com uma das suas colegas nas aulas de dança – passa a ser o relato da possibilidade de uma transformação, interior e comportamental. É uma questão de tom, em primeiro lugar: a impressão de extrema gravidade, os enquadramentos cuidados (um bocadinho demais: o “plano-efeito” espreita muitas vezes, sobretudo no aeroporto onde Fusí trabalha), a luz escura, como um pot pourri de características associáveis ao cinema mais ao norte da Europa (de Kaurismaki a Roy Andersson), tudo isto vive pendurado na margem entre a sua seriedade e o carácter irrisório, e até risível (ou seja, “para rir”), das acções e situações narradas. Mas é este tom, para o bem e para o mal, que faz o filme, num retrato duma estranheza que Dágur Kuri tempera com elementos “exógenos” (a II Guerra, a música country), sintomas do alheamento da personagem que preparam o terreno para o confronto de Fusí com a muito mais “urgente” figura de Sjofn (a colega). Apesar disso, é como se o filme nunca “explodisse”, o que é tão decepcionante como coerente, e se fosse fechando mais e mais na psique do protagonista.

Tudo parece demasiado cozinhado (sobre-consciente, sobre-composto) e muito calculado, limite contra o qual filme, sem se tornar antipático, esbarra de princípio a fim sem encontrar uma saída.

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