Não me posso esquecer disto

Sobre Fiesta Forever, de Jorge Jácome.

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O texto seguinte foi produzido por um dos participantes do workshop Crítica de Cinema realizado durante o Curtas Vila do Conde – Festival Internacional de Cinema. Este workshop é formado por um conjunto de masterclasses e debates com convidados internacionais e pela produção de textos críticos sobre os filmes exibidos durante o festival, que serão publicados, periodicamente, no site do PÚBLICO e no blogue do Curtas Vila do Conde.

É importante não esquecer a festa, é preciso reconstituir a festa  pelo menos é o que nos parece sugerir Jorge Jácome com Fiesta Forever, apresentado na competição nacional do 24.º Curtas Vila do Conde.

Resultado de uma co-produção luso-francesa, e realizada na escola Le Fresnoy, esta curta-metragem é apresentada a várias vozes, reconstituindo a memória de momentos passados em lugares nocturnos de Portugal: La Movida Beach (Montijo), Green Hill (Foz do Arelho), Luzia Mar (Viana do Castelo) e Babooshka (Nazaré) são os espaços escolhidos por Jorge Jácome para filmar em 3D, mostrando lugares que se tornaram obsoletos, que ficaram ao abandono, com as paredes em avançada degradação onde podemos encontrar inscritas frases grafitadas.

Jorge Jácome parece pronto para fixar um retrato de quem já se encontra calmamente sentado no sofá depois de noites intermináveis, uma visão de quem no passado parece ter dançado até à exaustão. A lenta viagem sobre os espaços é acompanhada por vozes que retratam encontros fortuitos, gente que adormece em casas-de-banho, pais que se conheceram em discotecas, pessoas que falam sobre o seu corpo, ginásios, aventuras em saídas à noite, lembretes da memória colectiva de uma geração dançante.

Seria abusivo voltar a Manuel Mozos, mas não podemos ignorar o regresso melancólico ao espaço, aos lugares ultrapassados que nos convidam a ver Ruínas (2009) lá ao fundo. Voltamos ao tópico dos lugares em ruína, mas agora reinventando uma versão quase virtual, como se estivéssemos num videojogo. Afinal, existe uma geração que já participou deste videojogo e Jácome não quer que nos esqueçamos disso, continuam todos ligados às mesmas referências nocturnas. Também por isso esta é uma curta que insiste na repetição “não me posso esquecer disto”, e embora estes lugares estejam ao abandono é preciso saber-se que ali já se dançou, ali já muitos foram felizes. Por isto se mostram graffitis, com frases que se perpetuam: é importante não esquecer a festa.

Fiesta Forever é uma visão saudosa de espaços ao abandono e uma impossibilidade de voltar ao paraíso da dança. Felizmente, Jácome criou esse plano onde ficam suspensos no ar telemóveis, maços de tabaco, isqueiros, perdidos no universo, gravitando para sempre no espaço como uma promessa de que estes lugares nunca serão esquecidos.

Texto editado por Jorge Mourinha

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