Herberto Helder publica A Morte Sem Mestre

Novo livro de poesia de Herberto Helder vai ser lançado no dia 9 com a chancela da Porto Editora e incluirá um CD com poemas ditos pelo autor.

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Um ano depois de Servidões, Herberto Helder lança um novo livro inédito, A Morte Sem Mestre, que deverá chegar às livrarias no próximo dia 9 de Junho, e que terá a particularidade de incluir um CD com cinco poema ditos pelo próprio autor.

Outra surpresa é o facto de o livro ser editado pela Porto Editora, e não pela Assírio & Alvim, que vinha publicando todos os títulos de Herberto Helder desde o início dos anos 80. O grupo Porto Editora, que adquiriu a Assírio & Alvim, adianta apenas que a opção se ficou a dever “à vontade expressa do autor”.

A editora esclarece ainda que, tal como os anteriores livros de Herberto Helder, A Morte Sem Mestre terá apenas uma edição, pelo que é de esperar que, a exemplo do que sucedeu com A Faca Não Corta o Fogo (2008) e Servidões (2013), a tiragem se esgote rapidamente.

Mas não é de excluir que o livro possa vir a ser mais tarde disponibilizado em eBook, já que no mesmo dia em que lançará A Morte Sem Mestre, a Porto Editora disponibilizará na sua livraria virtual, a Wook, por um período de trinta dias, a versão eBook de Servidões, cuja ficha técnica indicava expressamente “edição única”.

Com uma capa em papel craft com o nome do autor e o título do livro escritos à mão pelo próprio poeta – uma solução gráfica que reproduz o modo como Herberto Helder encapa os volumes da sua biblioteca –, A Morte Sem Mestre surge apenas um ano após a publicação de Servidões, um intervalo surpreendentemente reduzido para os hábitos do autor.

Se considerarmos apenas os novos títulos de poesia que publicou desde A Cabeça Entre as Mãos (1982) – excluindo traduções, reescritas e poemas inéditos incluídos em súmulas e compilações –, o intervalo mais frequente entre dois livros vinha sendo de seis anos. Última Ciência é de 1988 e Do Mundo saiu em 1994. A excepção é o prolongado hiato que se seguiu até Herberto Helder regressar, em 2008, com A Faca Não Corta o Fogo, porventura o livro mais forte e mais inovador da poesia portuguesa deste início do século XXI.

Acompanhando o envelhecimento físico do autor – cuja poesia, como talvez nenhuma outra sua contemporânea, foi sempre reflexo da respiração e do ritmo de um corpo concreto –, A Faca Não Corta o Fogo trazia um registo mais rugoso, mais impuro, a essa escrita fulgurante que estabelecera a reputação do jovem Herberto Helder no início dos anos 60. Essa contaminação mais expressa da circunstância biográfica, com reflexos no vocabulário e na sintaxe, seria prosseguida em Servidões, livro que é ao mesmo tempo um extraordinário “ofício de morrer” e um balanço, uma genealogia mítica, desse trajecto singular que transformou uma assombrada criança madeirense no demiurgo que assina os livros publicados sob o nome Herberto Helder.

A Morte Sem Mestre obedece, no essencial, ao mesmo impulso que gerou Servidões, mas é um livro com uma coerência própria, e no qual se acentuam aspectos que não estavam presentes com a mesma clareza em obras anteriores. É significativa, por exemplo, a insistência no tema do Cristo verberando o Pai por o ter abandonado, mesmo se a perda do princípio vital e criador fosse já uma questão central em Servidões.

A linguagem do poeta retém agora todas as impurezas, já não decanta nem sublima, e por isso o autor avisa, logo no poema de abertura deste livro: “(…) peço por isso que um qualquer erro de ortografia ou sentido/ seja um grão de sal aberto na boca do bom leitor impuro”.

Mas também diz que quer uma "língua ao mesmo tempo plana e plena". E, de facto, o milagre de Herberto Helder é conseguir ser tão fascinante, tão violento, tão único a dizer a perda como o fora a dizer a plenitude. Há em A Morte Sem Mestre poemas que (talvez injustamente) fazem boa parte da nossa produção lírica contemporânea parecer irremediavelmente inócua. Citando dois versos deste livro, “poemas quando se vai com a mão/ e bufam e arranham logo”.

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