Guillermo Heras: “No teatro não podemos fazer zapping

O encenador espanhol está de regresso a Viana do Castelo para dirigir a Escola de Verão para Actores, a convite do Teatro do Noroeste. Almada, Maiakovski e Lorca são os autores em cima da mesa deste profissional que acredita que esta arte pode continuar a ser um lugar de deleite.

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Guillermo Heras trabalha com o Teatro do Noroeste desde 1999 Inês Barbosa
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Guillermo Heras num ensaio na Escola de Verão de 2016 Inês Barbosa
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Momento da Escola de Verão de 2016 Inês Barbosa
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Momento da Escola de Verão de 2016 Inês Barbosa
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Guillermo Heras num ensaio na Escola de Verão de 2015 Ana Reguengo
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Cena da produção do Teatro do Noroeste Bodas de Sangue, estreado em Dezembro de 2016 Rui Carvalho

“Creio que se está a fazer uma coisa muito bonita, na área do teatro, em Viana do Castelo”. É esta convicção que faz com que o professor, dramaturgo e encenador espanhol Guillermo Heras (Madrid, 1952) tenha decidido ali voltar este mês, para dirigir mais uma Escola de Verão para Actores. Na verdade, trata-se de um regresso repetido, pois a iniciativa vai já na terceira edição, sempre sob a orientação de Heras. De resto, a relação do encenador madrileno com o Teatro do Noroeste/Centro Dramático de Viana (CDV) é muito mais antiga: em 1999, a convite dos então directores artísticos da companhia, José Martins e Castro Guedes, dirigiu na cidade um primeiro workshop de interpretação, e no ano seguinte encenou Édipos, de Alexandra Moreira da Silva. Seguiram-se Cartas de Amor a Estaline, de Juan Mayorga, e Psicosis 4:38, de Sarah Kane (ambos em 2002). Depois de um intervalo, regressaria em 2014 para novo workshop em que participaram antigos trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, e que depois resultaria no espectáculo Enquanto Navegávamos, encenado por Ricardo Simões, actual director artístico do Teatro do Noroeste.

“Uma das ideias que saiu desse reencontro foi organizar a Escola de Verão”, recorda agora Heras, numa conversa com o PÚBLICO no seu gabinete do Ministério da Cultura em Madrid, de onde dirige o Iberescena, um projecto transnacional lançado há uma década com o objectivo de apoiar as artes cénicas ibero-americanas, e que une já 14 países, entre os quais, lamenta o encenador, “ainda não está Portugal”.

A edição deste ano da Escola de Verão, que decorre entre esta segunda-feira, 17, e próximo dia 26, terá como tema Poesia e Vanguarda: Almada, Lorca, Maiakovski, e como monitores a coreógrafa Isabel Barros e a professora Teresa Lima, os encenadores Ricardo Simões, Gonçalo Amorim e Antonio Simón e a dramaturga Alexandra Moreira da Silva. No final, haverá um espectáculo concebido pela vintena de participantes e aberto ao público no Teatro Municipal Sá de Miranda. “É muito importante voltarmos ao conceito de teatro e sociedade, trabalharmos numa relação íntima com o meio em que estamos inseridos”, acredita Guillermo Heras.

O que é que se pode ensinar – e o que é que já não é possível ensinar – a alguém que frequenta um curso de Verão de interpretação?

Esse é um debate que deu já muitos ensaios e livros, e também muitas teorias teatrais de grandes mestres. No entanto, há uma coisa – chamamos-lhe o “mistério da interpretação” – que tem que ver com as características próprias do ser humano. Está aí a base para se ser actor. É algo que algumas pessoas têm, outras não. E sei do que falo, porque durante 15 anos também fui actor – formei-me na Escola Real de Arte Dramática e Dança de Madrid, e estive num grupo histórico do teatro independente espanhol, o Tábano, que tinha muitas relações com o teatro independente português, com grupos como a Comuna ou o TEP [Teatro Experimental do Porto], nos anos 70. É por isso que, desde esse tempo, tenho tantos amigos e tantos companheiros em Portugal. Em dado momento, dei-me conta de que o trabalho de actor, sendo apaixonante, necessita de algo mais. Precisamos de gostar... E dei-me também conta de que não era um bom actor. Havia outras coisas que percebi que gostaria de fazer, e que poderia fazer melhor, como ser encenador ou gestor. Mas é o actor que é a chave do teatro.

E como é que, hoje, se ensina alguém a ser actor?

Como ensinar um actor? Primeiro, é preciso ensiná-lo a ser um ser humano, com pensamento. E que mais importante do que a técnica é ter uma ética. Não chega saber estar num palco. Hoje, o ensino de um actor tem de ser transversal. Não pode ser como se fazia antigamente nas escolas tradicionais. Estas poderão continuar a ensinar aquilo a que chamo, ironicamente, actores radiofónicos: falar bem, colocar bem a voz, tudo isso... Mas, com os meus actores, utilizo sempre uma frase: “É o corpo que fala”. Isso exige um trabalho, e um ensino, transversal. Daí que as escolas de Verão, os laboratórios, as oficinas, que se vêm fazendo muito, sobretudo na América Latina – por via do projecto Iberescena, que coordeno –, tenham uma componente pedagógica importante. É muito importante o movimento, a voz, a composição da personagem. Mas também é preciso que ele conheça as novas tecnologias, tenha em conta a relação que o espectador actual tem com os ecrãs, que já interiorizou por via das séries de televisão e do cinema, e o ritmo próprio que isso implica. Além de que os dramaturgos de hoje já não escrevem como no século XIX ou no início do século XX.

O tema para o curso deste ano é Poesia e Vanguarda, com base em textos de Almada, Lorca e Maiakovski. Por que escolheu estes autores? Se o Lorca parece óbvio, por que foi buscar os outros dois?

O Almada é um personagem a reivindicar ibericamente. É genial, e não foi ainda suficientemente valorizado. E lembro que ele viveu também muito tempo em Espanha…

Viu a exposição que lhe foi dedicada na Gulbenkian, em Lisboa?

Vi. Fui a Lisboa de propósito. E também por causa do projecto que fiz com a Mísia sobre um conto precioso do Antonio Tabucchi, Carta desde Casablanca, que apresentámos em Abril em Coimbra. Mas eu já tinha lido o Almada, os seus manifestos muito influenciados pelo futurismo. Ele tem uma teatralidade enorme: as performances que ele fazia, inclusivamente todo nu, o que, para a época, era muito ousado. Mas também a sua relação com o cinema português, escrevendo guiões, coisas que se perderam... A teatralidade dele vem dos seus textos, que são maravilhosos. E não nego que gostaria de fazer um espectáculo sobre o Almada. Sei que há um, muito importante, feito pelo Ricardo Pais, mas que não o vi. Admiro muito o Ricardo, que conheço desde há muitos anos, e de quem sou amigo. Vi dele, e continuo a mantê-lo na memória, Fausto, Fernando, Fragmentos, que trouxe a Madrid.

E porquê a associação com o Maiakovski e o Lorca?

Primeiro, há o construtivismo soviético do Maiakovski, que além de poeta foi também um grande autor teatral, trabalhando com o Meyerhold. E Lorca é outro grande autor, com todo um trabalho de puro teatro de vanguarda, como os seus textos O Público e Poeta em Nova Iorque – este é uma jóia, e vamos trabalhar sobre ele em Viana.

Escolher agora três autores de há um século atrás significa alguma crítica à produção dos nossos dias no campo da dramaturgia?

Não. Pelo contrário. A prova é que dirijo actualmente um festival em Alicante [Mostra de Teatro Espanhol de Autores Contemporâneos] que é totalmente dedicado aos autores dos nossos dias. O tema do primeiro curso que dirigi em Viana foi o Universo Pessoa, que também me fascina; no ano passado, demos uma olhada aos clássicos gregos, mas a partir da contemporaneidade, do olhar de autores portugueses, espanhóis, alemães. Este ano é a poesia... Há aqui uma certa lógica, porque temos de trabalhar com muita gente – são sempre mais de 20 participantes. Por isso, não se pode trabalhar sobre um texto muito cerrado, um Tennessee Williams, por exemplo. Temos de trabalhar a sobre a ideia de pós-modernidade e de fragmento. O meu conceito de ensino baseia-se em que os actores devem transitar e experimentar laboratórios de diferentes criadores. Podem passar de uma coisa muito intensa, corporal, para a comédia... Porque cada um dos participantes na oficina vai também ser um criador; é-o durante toda o curso de Verão e, no final, apresentamos um espectáculo aberto a toda a cidade, e um vídeo.

Do teatro português contemporâneo, quais são os autores que mais lhe interessam?

Conheço melhor o teatro dos encenadores do que o dos autores. Mas sei que há agora uma geração muito interessante: o Tiago Rodrigues, o Luís Mestre, o Jorge Palinhos… Já pedi aos meus amigos para me enviarem textos recentes. 

E como vê a situação actual do teatro ibérico?

A dramaturgia portuguesa, confesso que me é difícil conhecer, até porque entro nas livrarias em Portugal, e não os publicam. É certo que há um, [José Maria] Vieira Mendes, que conheço há muito tempo, mas que é já um autor consagrado na Europa. E interessam-me muito – sei pelo que me vêm contando os meus amigos encenadores – experiências como a do Gonçalo Amorim, que está a trabalhar com um dramaturgo [Rui Pina Coelho] para fazer os seus espectáculos. Creio que, durante algum tempo, os encenadores preocuparam-se muito pouco com a dramaturgia viva portuguesa e muito mais com seguir a moda – a moda alemã, a moda francesa, a moda inglesa. Muitas vezes, quando vou a Lisboa, fico surpreendido porque vejo nos cartazes que o mais recente texto de dramaturgos ingleses e alemães já está a ser levado ao palco. Bem, é uma escolha. Não me parece mal.

E o teatro em Espanha?

Naturalmente, conheço muito bem o teatro espanhol, e também a dramaturgia latino-americana. Em Espanha, estamos a viver uma “Idade de Prata” da escrita, da geração com menos de 50 anos. Há autores, e sobretudo autoras, fantásticos. A Angélica Liddell, que também já é reconhecida em Portugal, e que depois do triunfo há alguns anos em Avignon tornou-se uma estrela em toda a Europa. O Juan Mayorga, que actualmente tem 40 peças em cena em todo o mundo. E Jordi Galceran, catalão, ou pessoas como Sergi Belbel. A Espanha está a viver uma boa época neste domínio, como acontece também na América Latina – o teatro argentino, sobretudo o de Buenos Aires, é hoje um dos mais importantes do mundo. E acredito que Portugal nos vai fazer uma surpresa. Daí a minha ideia de propor ao CDV trabalhar sobre dramaturgos portugueses actuais. Mas temos um problema. Nós, latinos e ibero-americanos, não temos visibilidade, não temos ajudas à tradução. Aí tenho de assinalar o trabalho enorme feito pelo Jorge Silva Melo com os Artistas Unidos, traduzindo textos e publicando livros naquela colecção fantástica [Livrinhos de Teatro].

É professor de gestão cultural na Universidade de Madrid. Defende que a gestão deve ser feita pelas gentes das artes, ou por gestores profissionais?

Perguntam-me isso muitas vezes. Desde os meus 20 anos, e com 45 anos de actividade profissional, desenvolvi pelo teatro uma tal paixão que não tenho tido mais vida para além disso. E a minha paixão é tanto pela criação como pela gestão, menos a produção…

Em Portugal, discutiu-se muito se as companhias de teatro devem ter uma gestão administrativa autónoma da direcção artística.

Autónoma não, dialéctica. Na administração pública, estou totalmente a favor da bicefalia, da gestão com duas cabeças. Como acontece em França: todo o teatro público tem um administrador e um director artístico. Mas o artista e o gestor têm de estar unidos, têm de pensar da mesma maneira. Um gestor não é um contabilista. É nisso que se equivocam os governos. Não pode ser um censor do artista; é um artista como os outros. Gestão é criação. Não se trata apenas de fazer um orçamento. A gestão é sempre defender a filosofia de levar projectos artísticos aos cidadãos. Isto é fundamental. O gestor é, de alguma maneira, o pivô, aquele que está entre o sonho do artista e a possibilidade de o compatibilizar com o que querem os cidadãos. Isto tem muito a ver com aquilo que venho fazendo com o CDV, porque eles compreenderam que não basta produzir espectáculos. Houve uma altura em que acreditámos que isso chegava. E havia projectos muito bons, mas que não chegavam às pessoas. Porque, hoje em dia, a competição que o teatro sofre é brutal, também a nível económico, porque, por exemplo, a televisão é gratuita.

Disse que, nos tempos actuais, não se pode ensinar teatro, nem fazer teatro, nem escrever teatro esquecendo a televisão e as novas tecnologias. O que é que a televisão mudou na recepção do público? Qual é o principal desafio dessa mudança?

Fundamentalmente, no teatro não podemos fazer zapping. As artes cénicas são uma realidade viva, que se produz de forma efémera, e que fica apenas na nossa memória emotiva. Não é como nas artes visuais, ou audiovisuais, em que se pode voltar atrás. Ou o cinema, em que se pode sempre repetir a visão do mesmo filme. No teatro, nunca veremos a mesma representação. Essa é a força do teatro, e é a força que teremos de trabalhar. É por isso que é muito importante que o teatro contemporâneo comunique com os cidadãos, com o público. Creio que se faz, hoje, muito teatro velho, no sentido em que praticamente é um teatro de museu. Vemos isso em cidades como Madrid, ou Paris, ou Londres. Não vemos tanto em Lisboa, mesmo se aí também há um teatro comercial com actores do cinema e da televisão. E também a revista e o vaudeville. Para isso há público. Para que haja um tecido cultural democrático, cada cidadão deverá poder escolher o que quer ver. E nós dificilmente podemos transformar um público que está habituado a ver determinadas coisas. Mas podemos investigar, trabalhar em formas novas de comunicação, que nem têm de ser experimentalistas. Tenho sempre em conta a ideia do velho e do novo, do experimental e do tradicional. O fundamental é que seja autêntico. Para que o teatro volte – e falo assim porque ele tem passado por uma certa crise de comunicação –, tem de ser autêntico e comunicar com a sociedade. Desde há muitos anos, falamos da crise do teatro, mas é a mesma coisa que a crise dos jornais. Acredito que haverá sempre pessoas a querer ler jornais...

Mas a tendência é que o número desses leitores é cada vez menor, tende a ser uma elite. Acontecerá o mesmo com o teatro?

Essa elite, também já a vemos no teatro. É muito curioso. Quantas vezes se disse que o cinema ia acabar com o teatro, e que a televisão e a novela iriam acabar com o cinema… O que há é uma redistribuição da recepção, artística e cultural. O teatro não vai voltar a ocupar o lugar que ocupava no Século de Ouro espanhol, aqui em Madrid. Esse lugar é agora ocupado pelo pop-rock. Como é que podemos competir com a Shakira, ou outra figura assim?... Mas isso não me importa. Eu assisti a experiências que me encheram o coração, e éramos só 20 espectadores! Não me interessa a massificação. Interessa-me que a recepção seja coerente. E, sobre isso, falo muito com a gente de Viana. Se temos um espaço como o Teatro Sá de Miranda, temos de trabalhar para conquistar o público. Temos de fazer espectáculos populares. E depois teremos de fazer um teatro de minoria. Encenar um jovem dramaturgo português não é o mesmo que encenar Gil Vicente, ou Molière. Mas, para mim, como gestor, é importante fazer este equilíbrio entre produção e criação. E é importante ter os jovens autores, e os actores – temos de ter bons actores, que transmitam o texto e a sua emoção. Mas há um público que quer musicais – é o género a que, no Século de Ouro, corresponderia o Lope de Vega ou ao Shakespeare. Pois que se façam musicais. Não quero lutar contra o teatro mais comercial. Não se trata de uma luta, trata-se de dar uma alternativa. E, para isso, é importante a gestão. É aí que muitas vezes surgem os problemas, porque queremos fazer uma gestão elitista num lugar onde não há público. Ao contrário, queremos fazer uma coisa populista onde temos um bairro culto…

Na crise que se viveu, e ainda vive, em Portugal, a preocupação principal da gestão estava em reduzir os custos e simultaneamente conquistar o maior número de espectadores…

Certamente que aí se cometeram muitos erros, no sentido de confundir a massificação… Também em Espanha, muitas vezes, foram falseados os números das assistências, “obrigando” inclusivamente as pessoas a ir ao teatro. Se tu obrigas o teatro a ir às escolas, a única coisa que se conquista é um não-espectador. Temos também de lutar contra a cultura da gratuitidade absoluta. Isso leva a que as pessoas não dêem valor ao trabalho dos artistas. O que é preciso é fazer uma política de preços. Por isso gosto tanto da gestão. Gostaria de ter mais tempo. E também não tenho muito tempo para a criação. Nem faço férias. Este ano celebramos os dez anos da Iberescena, e interessa-me muito ir a Portugal, primeiro para que o país entre na associação. Gosto muito de trabalhar em Portugal. Vou dizer uma coisa, do fundo do coração: em Portugal, tratam os espanhóis como nós não tratamos os portugueses. Muito bem.

Como vê a relação entre Portugal e Espanha no mundo do teatro? Há um pouco a ideia de que continuam de costas voltadas…

É verdade. Houve várias tentativas, nomeadamente através de um personagem que foi fundamental na história do teatro espanhol, e que morreu no ano passado, o José Monleón, director da revista Primer Acto. Era um iberista muito conhecido, que acompanhei em várias tentativas de ultrapassar essas incompreensões. Mas – insisto – é uma incompreensão mais a partir de Espanha do que de Portugal. Sempre notei mais abertura de Portugal para projectos conjuntos. Daqui, olha-se para Portugal de uma forma absolutamente estúpida, porque não reconhecem os criadores portugueses, que, a nível cénico, estão na primeira fila da Europa. O que me desagrada é que a gente, em Espanha, não conhece as coisas muito interessantes que estão a acontecer em Portugal.

Espanha está mais virada para a Europa?

A Espanha não está virada para lado nenhum. Está fechada. Se, aqui em Madrid, olhar para os roteiros dos espectáculos, verá que não há nenhuma atenção às novas dramaturgias europeias. O teatro espanhol é muito endogâmico. Afortunadamente, agora, e depois de uma luta tremenda, está-se a apostar nos autores nacionais. Porque são muito bons. Por outro lado, faz-se muito mais Shakespeare em Portugal do que em Espanha. E aqui temos outro problema – é a Catalunha, que é outro país. Eu posso falar das peças em cartaz que há actualmente no México, no Chile, na Argentina… Mas não sei o que se passa em Barcelona, onde não vou há cinco anos. É outro mundo. E aí, sim, é um mundo que olha para a Europa. Mas o lógico para nós, sobretudo a Galiza, a região Centro e toda a Andaluzia, seria fazer alianças com Portugal. Por muitas razões, e algumas delas egoístas: de distância, de intercâmbio e mais ainda da língua. Agora seria o bom momento para nos sentarmos a uma mesa e discutirmos como criar uma frente de ajuda e de intercâmbio. Este é um momento de bom impulso criativo, nas expressões mais jovens. Eu tenho um problema, porque os mais jovens acham que sou velho, e os mais velhos acham-me demasiado jovem [risos]… Sinto-me num território de ninguém. Mas, por exemplo, parece-me que o Porto é uma cidade estratégica, porque tem muitas infra-estruturas teatrais e, ligada a Viana, podia ser uma grande cidade ibérica. O importante é trabalhar sobre a identidade local, mas não de uma forma fechada. É um conceito de que gosto muito – localização, em vez de globalização: trabalhar aquilo que é nosso, mas sem perder a ideia de que estamos no mundo. Nesse sentido, a ideia de criar escolas de espectadores é muito importante, porque um espectador de teatro do século XXI é muito diferente do do século XX, quando parte do teatro ocupava o lugar da pura diversão. Mas esse lugar foi entretanto ocupado pelo cinema e pela televisão. O teatro tem de encontrar outro lugar, outra função. De cultura, de pedagogia, e também de entretenimento “à Cervantes”, que dizia que o teatro era o lugar do deleite.

O PÚBLICO viajou a convite do Teatro do Noroeste/Centro Dramático de Viana

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