Dentro do corpo e da obra de Helena Almeida

Museu de Serralves inaugura exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra, que no próximo ano será também levada a Paris e a Bruxelas.

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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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"Uso o azul porque é uma cor espacial", justifica Helena Almeida Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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Exposição ocupa cinco salas do Museu de Serralves Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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Série Dentro de mim está exposta no hall do museu Paulo Pimenta
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"Helena Almeida não é uma pintora, é um corpo que marca", diz o curador João Ribas Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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A série Ouve-me é do final dos anos 70 Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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Montagem da exposição A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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Série Pintura habitada Paulo Pimenta
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Série Pintura habitada Paulo Pimenta
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A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra Paulo Pimenta
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A série Ouve-me é do final dos anos 70 Paulo Pimenta

O título é já de algum modo a explicação da extensa carreira daquela que é “uma das artistas portuguesas vivas mais influentes”, como se lhe referiu Suzanne Cotter, directora do Museu de Serralves: A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra é a exposição que o museu portuense (MACS) agora dedica a Helena Almeida (n. Lisboa, 1934), e que abre ao público este sábado, podendo ser visitada até 10 de Janeiro.

A exposição tem como curadores Marta Moreira de Almeida e João Ribas, director adjunto do MACS, que esta sexta-feira, na apresentação da mostra à comunicação social, chamaram a atenção para o facto de, ao contrário de outras realizadas até agora, nomeadamente a anterior feita em Serralves, há década e meia, ela reconstituir o percurso de Helena Almeida desde as suas primeiras criações, em 1966, até aos anos mais recentes (2012).

“Conseguimos recuar dez anos” no alinhamento das obras da artista, que normalmente começa com a série Pintura habitada, de 1975, realçou João Ribas, acrescentando que isso permitiu pôr em diálogo conjuntos de trabalhos que não estavam juntos desde há mais de 40 anos.

A indistinção entre obra e corpo é uma marca reconhecida no percurso de Helena Almeida. “Comecei com uma linguagem familiar (…) e pouco a pouco todos estes elementos começaram a sair do quadro. Depois, a tela começou a autodestruir-se, uma necessidade de acabar com a pintura (…) Digo a destruição da pintura porque a tela acabou por ficar antropomórfica. Acabou por identificar-se comigo”, disse a artista em 2000, agora citada num texto do catálogo com que o MACS acompanha esta exposição, e que deverá sair dentro de uma semana.

Esse percurso e essa evolução na produção de Helena Almeida estão bem documentados na exposição de Serralves, mesmo se não se trata de uma retrospectiva, nem os curadores quiseram seguir um caminho cronológico estrito.

Depois de uma recepção ao visitante no hall do museu com as 18 fotografias da série Dentro de mim (1995-98), a entrada na exposição propriamente dita faz-se com uma recriação da mostra inaugural da artista na Galeria Buchholz (1967), em Lisboa: duas fotografias ampliadas de paredes dessa exposição, e uma terceira parede com duas obras que estiveram na mostra original. São quadros de feição abstracta, que reflectem a atmosfera da criação artística europeia dos anos do pós-modernismo, nomeadamente em França e na Alemanha, sublinham os curadores.

Mas João Ribas chama a atenção para uma série de seis pequenas fotografias, recuperadas entre os arquivos de Helena Almeida, nas quais a própria artista começa por surgir numa das imagens, mas depois sai do enquadramento e da própria tela, num primeiro momento de descentração relativamente à pintura. Daí que o curador e director-adjunto do MACS sustente que “Helena Almeida não é uma pintora, mas um corpo em permanente performance”, e que o desenho – que é também uma constante na sua obra – é “uma forma de ela expressar o seu pensamento”.

Ainda na primeira das cinco salas preenchidas com A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra, vemos Desenho habitado, uma sucessão de desenhos escultóricos com a utilização de fio de crina de cavalo sobre fundo de cartão. Parecendo saltar do seu lugar, estes desenhos ganham tridimensionalidade, “tornam-se quase esculturas”, nota Marta Almeida, lembrando a importância que certamente teve para a jovem artista a vivência no atelier do seu pai, o escultor Leopoldo de Almeida (autor de monumentos emblemáticos um pouco por todo o país, como a composição escultórica do Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa, a estátua equestre de Nuno Álvares Pereira, na Batalha, ou a estátua de Ramalho Ortigão, no Porto).

Na segunda sala da exposição – sujeita a uma iluminação mais ténue, devido às imposições da Tate para a exibição de uma série de desenhos pertencentes à colecção do museu londrino –, o rosto de Helena Almeida, em plano aproximado e em grande plano, volta a ser protagonista das séries Ouve-me, Sente-me, Vê-me (1979). O seu rosto tapado e amordaçado pode ser visto como um aviso, um grito, em que João Ribas admite poder ler-se “uma afirmação de feminismo” mas também de alerta para uma realidade política e sociológica – 1979, lembra o curador, foi o ano da revolução islâmica no Irão – que volta a ser motivo de preocupação nos tempos actuais.

No mesmo espaço, Helena Almeida fotografa-se numa disputa com a cor azul, com pinceladas sucessivamente maiores, até se sobreporem a todo o seu corpo (Pintura habitada). “Uso o azul porque é uma cor espacial. Tem de ser azul (…). É mesmo o espaço, é engolir a pintura”, justifica a artista em entrevista aos curadores da exposição de Serralves.

A sala seguinte é integralmente preenchida com O abraço (2007), série de oito fotografias em que o marido da artista, Artur Rosa, “disputa” com ela o espaço de um banco de atelier. “O Artur tinha cinco segundos para chegar ao pé de mim. Era o tempo da máquina”, explicou Helena Almeida aos curadores sobre esta sequência, que as circunstâncias transformaram num raro momento de espontaneidade, apesar de tudo ter sido desenhado previamente.

No espaço ao lado, o corpo da artista encena-se a negro, numa ritualização da sua pintura (do seu corpo) com o espaço – e um vídeo regista essa relação. “A obra de Helena Almeida é também o registo da evolução e da transformação, do envelhecimento do seu próprio corpo”, nota João Ribas, lembrando tratar-se de uma ousadia que se vê muito pouco na pintura contemporânea.

O percurso de A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra fecha-se no corredor, com mais uma vitrina com desenhos para a série Dentro de mim, e nova sequência de fotografias em que o corpo da artista começa a derramar uma mancha negra que, no final, se transforma na projecção da sua própria sombra. Negro sobre o negro, epílogo de um percurso de quase meio século que começou em meados da década de 60 com um corpo jovem retratado numa polaroid a cores?...

Helena Almeida, 81 anos, deslocou-se ao Porto para assistir à inauguração oficial da sua exposição, marcada para a noite desta sexta-feira, mas evitou acompanhar a visita guiada para os jornalistas.

Até Janeiro, a exposição vai ser acompanhada por um programa paralelo que inclui novas visitas guiadas e também a projecção do documentário Helena Almeida: Pintura habitada (2006), de Joana Ascenção (14 de Novembro), e a conferência-demonstração I was here, por João Fiadeiro (28 de Novembro).

Na Primavera do próximo ano, será apresentada no museu Jeu de Paume, em Paris, e no Outuno chegará ao Centro de Arte Contemporânea de Bruxelas.

Será a oportunidade – depois das bienais de São Paulo (1979), Veneza (1982 e 2005) e Sidney, além de outras exposições noutras cidades, como Santiago de Compostela (2000), Nova Iorque (2004), Cambridge e Madrid (2009) – de voltar a mostrar lá fora, e a novas gerações, “uma obra radical e profunda, que usa o corpo de uma forma tão comprometida quanto comovente”, nota Suzanne Cotter.

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