Conversations with People who Hate Me, um podcast sobre o ódio

Dylan Marron escreve, faz vídeos, é actor e agora apresenta um podcast em que fala com as pessoas que o insultaram ferozmente na Internet.

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No início de 2015, um episódio de This American Life, o programa de Ira Glass na NPR, a rádio pública americana, mostrava Lindy West, uma escritora feminista que escreve no The Guardian e se tornou entretanto colunista do The New York Times, a confrontar um homem que passou três anos a chamar-lhe "cabra gorda" na Internet. É complicado de ouvir, até porque o troll que a atacava não se ficou por aí: descobriu o nome do falecido pai dela e começou uma conta no Twitter a fazer-se passar por ele.

Esse episódio é uma das inspirações para o novo podcast de Dylan Marron, uma personalidade da Internet: Conversations with People who Hate Me. Marron é conhecido pelos vídeos sobre justiça social, sejam ou não apresentados por ele. O mais célebre talvez seja a série Every Single Word Spoken by a Person of Color..., em que o autor junta excertos de filmes (ou outro tipo de ficção) famosos em que pessoas não-brancas falem (os resultados são muitas vezes curtíssimos ou, em casos como a adaptação do musical Caminhos da Floresta, inexistentes). Mas também apresenta outros programas, como Sitting in Bathrooms with Trans People, em que, para contrariar leis que proíbem os transgénero de usarem WC públicos destinados ao género com que se identificam, fala com pessoas transgénero famosas em casas-de-banho, ou Unboxing, paródias dos vídeos de YouTube em que pessoas tiram objectos da caixa (Marron replica o modelo para desconstruir conceitos abstractos). Também não é completamente novo no mundo dos podcasts: é a voz de Carlos, uma das personagens do muito bem sucedido Welcome to Night Vale, que partilha uma produtora com o seu próprio podcast

É natural que os tópicos sensíveis que costuma abordar atraiam comentários indesejados e agressivos. Daí que tenha decidido agora ir à procura das pessoas que disseram que ele era isto ou aquilo — sendo o autor homossexual, é natural que muitos dos comentários passem por aí — para falar com elas ao telefone. E depois gravar a conversa. A ideia, segundo o próprio explica na introdução do primeiro episódio, que saiu a 31 de Julho, não é ter um debate com as pessoas, muito menos calá-las de vez ou sequer encontrar pontos em comum com quem o insulta. É mais, diz, "uma experiência para ver o que acontece quando duas pessoas com dois pontos de vista do mundo muito diferentes falam uma com a outra". E, claro, tentar perceber o que as move e compreender como e por que pensam.

Nesse mesmo primeiro episódio, fala com um homem que lhe chamou "um pedaço de merda" e os dois acabam por encontrar o tal terreno comum que Marron não procura. No segundo, que assenta na ideia de que pessoas magoadas magoam outras pessoas (é literalmente o título: Hurt People Hurt People), fala com um adolescente vítima de bullying que começou por acusá-lo de ser a razão pela qual a América está tão dividida, adicionando ainda que a homossexualidade é um pecado. Muito calmamente, o apresentador explica-lhe o seu ponto de vista e argumenta que os dois não são assim tão diferentes, notando que o bullying de que o jovem sofre no liceu é bastante parecido com aquele por que ele próprio passou. Já no terceiro, começa uma conversa com um artista queer que alega que Marron representa o pior do liberalismo.

Nem sempre os seus interlocutores acabam convertidos, mas os resultados e as conversas são interessantes. E é um podcast que chega mais ou menos na mesma altura que outros dois recomendáveis podcasts norte-americanos em torno de tópicos LGBTQIA+, mas mais virados para a comédia: Queery, da cómica de stand-up e co-criadora e estrela da série Take My Wife, Cameron Esposito, e Homophilia, do apresentador e escritor Dave Holmes e do argumentista Matt McConkey.

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