Como os Mares da Sinfónica do Porto conquistam Madrid

Um programa simpático, quase sempre em crescendo, que o público espanhol aplaudiu com entusiasmo.

Foto
ANDRÉ ALVES

O programa que a Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música (OSPCdM) levou a Madrid no sábado passado só poderia ter sido mais simpático se incluísse também música de compositores espanhóis. Combinar portugueses e franceses, modernos e contemporâneos, foi uma boa opção da Casa da Música (CdM) e quase se poderia falar de uma prestação em linha ascendente se a Suite nº 2 de Daphnis y Chloe não acabasse por trair esse esperado crescendo.

Apesar de ser a mais recente obra em programa, La Mer Soulevée (2011), resultante da encomenda que a CdM fez a Ângela da Ponte (n. 1984) no ano em que a teve como jovem compositora em residência, não criou grande contraste com Paraísos Artificiais (1910), de Luís de Freitas Branco (1890-1955). O mesmo sucedeu no alinhamento das restantes obras: embora diferentes entre si, havia na sequência pontos de contacto que permitiam construir narrativas de afinidade. Com La Mer Soulevée, Paraísos Artificiais partilhava o facto de ser uma obra de juventude, de um certo optimismo. Com La Mer de Debussy (1862-1918), o esgar de uma estética que antecipava a ida de Freitas Branco para Paris, no ano seguinte ao da composição da bonita obra com que a OSPCdM tão bem representou a música portuguesa.

A leitura de Brönnimann da obra de Debussy, muito coesa, deu espaço para belíssimas ondas na generalidade dos naipes, com trompetes (e metais em geral) em boa forma, flautas em excelente condição e Vicente Chuaqui (que já na obra de Ângela da Ponte havia sobressaído) bem na crista da onda dos violoncelos.

Após o intervalo, às quatro Notations (I a IV) de Pierre Boulez (1925-2016) faltou um pouco do brilho característico da orquestração do mestre francês. À primeira vista, poderia supor-se que os comentários menos lisonjeiros que se ouviam de alguns lugares no belíssimo auditório provinham de melómanos conhecedores da obra de Boulez; veio a perceber-se, no entanto, que o público madrileno não está muito familiarizado com a música mais recente pois, se faltou um pouco do tal brilho, Brönnimann não deixou de conseguir a energia adequada e a obra fluiu. A bela suite de Ravel (1875-1937) começou por denunciar ligeiros desacertos de afinação em algumas madeiras e a entrada das vozes reunidas pelos dois coros madrilenos (de qualquer modo insuficientes para criar o efeito desejado) criou alguma decepção. Também aqui Brönnimann soube gerir a energia da partitura de forma equilibrada. Absolutamente em alta esteve o naipe das flautas, com um flautim perfeito e solista a condizer, contracenando de forma exemplar com o concertino, a quem estaria ainda reservado um elegante momento poético.

Se maestro e orquestra foram bastante aplaudidos, o maior entusiasmo do público dirigiu-se ao coro (“nativo”) e à flautista Ana Maria Ribeiro, que acabava de brilhar no cativante solo pleno de música.

O PÚBLICO viajou a convite da Casa da Música

Sugerir correcção
Comentar