2015, ano recorde nos cinemas da Europa mas de perda para o cinema europeu

Nunca se fez tanto dinheiro, os bilhetes estão mais caros, mas há menos espectadores para os filmes da Europa. Star Wars, Mínimos e James Bond dominaram o ano.

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Daniel Craig é o actual Bond e o protagonista de Spectre LEON NEAL/AFP

Foi um ano recorde nos cinemas europeus, mas um ano de perda para o cinema europeu. Como assim, 2015? O ano passado foi o melhor ano de sempre na União Europeia no que toca às receitas brutas de bilheteira, com mais gente a ir ao cinema mas também a pagar mais por cada bilhete – e esses bilhetes são cada vez menos para ver filmes europeus e sim para assistir aos blockbusters made in America e ir ver as caras conhecidas de Star Wars: O Despertar da Força ou Mínimos.

As estimativas do Observatório Europeu do Audiovisual chegam em vésperas de mais uma edição do Festival de Cannes, onde apresentará o seu relatório Focus 2016: World Film Market Trends. São números simultaneamente celebratórios e preocupados sobre 28 Estados-membros. Os 7,3 mil milhões de euros de receitas brutas de bilheteira assinalam a vitalidade do mercado cinematográfico do velho continente em 2015, número inédito e ainda assim longe dos do maior mercado do mundo, os EUA, com 9,7 mil milhões de euros de receitas brutas no box office. São também os EUA, mais especificamente Hollywood, que dominam o que o mundo, e a Europa em particular, vê.

“É notável”, assinala aquele organismo dependente do Conselho da Europa, que as receitas tenham crescido em todos os mercados da União Europeia cujos dados contabiliza. Em toda a Europa, também o número de espectadores aumentou, salvo em França, onde houve uma quebra de cerca de 1,4% (os dados de Malta estão em falta).

O reverso da medalha do ano recorde é que se houve um encaixe financeiro 16% superior ao de 2014, só houve mais 7,4% de bilhetes vendidos (para um total de 976 milhões). É um número que evidencia crescimento, que faz de 2015 o segundo melhor ano da década no número de pessoas que foram ao cinema na UE - só em 2009, quando Avatar chegava às salas em todo o seu esplendor pré-Natal com preços 3D, se venderam tantos bilhetes nos últimos dez anos. Porém, é também uma cifra que mostra que os preços dos bilhetes aumentaram. Em média, os bilhetes passaram de 7 euros para 7,5 euros na Europa, diz o Observatório.

Também a parcela do consumo de cinema produzido na Europa mostra um lado menos positivo do relatório: diminuiu para apenas 26,1% do bolo total, o número mais baixo dos últimos cinco anos. Em 2014, por exemplo, havia mais filmes europeus entre os mais vistos e 33,6% do público da União Europeia assistiu a pelo menos um filme produzido no continente. Ainda assim, a produção europeia cresceu (1643 filmes, dos quais 516 documentários em 2015) graças, em parte, ao aumento do número de co-produções, explica o Observatório Europeu do Audiovisual.

Os mercados de exibição que mais contribuíram para este ano recorde foram o britânico, irlandês e alemão, e os filmes que mais pessoas levaram às salas são os suspeitos do costume. Os franchises e a animação são os títulos que injectaram alguma vitalidade no sector em Portugal, por exemplo, que teve em 2015 o primeiro ano de crescimento desde 2010, mas também e nos cinemas de todo o mundo. O box office global, segundo a analista de mercado Rentrak, rendeu 33,3 mil milhões de euros recorde.

Estes são os 20 filmes portugueses mais vistos em 40 anos e O Pátio das Cantigas está no topo

Na prática, foi o sétimo filme Star Wars, O Despertar da Força, o spin-off de Gru – O Maldisposto que foi Mínimos, mais um Bond movie com Spectre (todos com resultados acima dos 30 milhões de bilhetes vendidos), o ressuscitar de Mundo Jurássico e a adaptação do romance As Cinquenta Sombras de Grey, bem como Velocidade Furiosa 7, mais o oscarizado Divertida-Mente e novos tomos de Os Vingadores, Jogos da Fome e Hotel Transilvânia. Estes são os dez filmes mais vistos de 2015 na Europa.

Só dois títulos europeus conseguiram ingressar na festa europeia do cinema (americano) de 2015 – o francês Taken 3, produzido por Luc Besson, no 17.º lugar, seguido pela comédia alemã Fack ju Göhte 2. Neste cenário, é ao Reino Unido que cabe a quota de principal produtor europeu de sucesso no mercado, embora só 10,6% dos filmes que estreou não contem com participação americana. O top 20 de filmes com produção europeia inclui co-produções com os EUA, que passaram de 0,4% do mercado a representar 7,3% dos filmes produzidos na Europa, e é encimado por Spectre (Reino Unido/EUA) Taken 3, Fack ju Göhte 2, Kingsman (Reino Unido/EUA), A Ovelha Choné (Reino Unido).

Numa década, cinco milhões de espectadores desapareceram dos cinemas portugueses

Em Portugal, o único filme português nos 20 mais populares do ano passado é O Pátio das Cantigas, o terceiro mais visto num ano de franca recuperação. Foram 14,6 milhões de espectadores, segundo dados do Instituto do Cinema e do Audiovisual, que gastaram 74,9 milhões de euros em idas ao cinema. Os dados, num país que viu 70% de cinema americano como Mínimos com Velocidade Furiosa, significam uma recuperação de 2,4 milhões de pessoas nas salas em relação ao ano negro de 2014, o mais baixo em mais de uma década. Mas estão ainda longe de anos recentes como o de 2003, por exemplo, em que 18,7 milhões de portugueses foram ao cinema. 

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