Manuel Alegre considera “autoritária e arrogante” posição de Santos Silva sobre o AO

Ministro rejeita rever o acordo ortográfico e Alegre rejeita “essa forma de rejeição”. Para ele, o Governo devia mostrar-se aberto ao diálogo.

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Manuel Alegre na Comissão de Cultura da AR, com Ana Salgado, Martim de Albuquerque e Artur Anselmo. À direita, a presidente da comissão, Edite Estrela Daniel Rocha

As declarações do ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, sobre o acordo ortográfico, afastando a possibilidade da sua revisão, irritaram Manuel Alegre. O escritor e ex-deputado, que na tarde do mesmo dia esteve no Parlamento, na Comissão de Cultura, a falar de ortografia, integrado numa delegação da Academia das Ciências de Lisboa, diz ao PÚBLICO: “O ministro dos Negócios Estrangeiros diz que rejeita a revisão do acordo ortográfico. E eu rejeito essa forma de rejeição, porque a considero autoritária, arrogante, dogmática e deselegante para com a Academia das Ciências.” Alegre insiste ainda num ponto que também já foi abordado e explicado no Parlamento: “A Academia, que é, de acordo com a lei, conselheira do governo em matéria da língua, não foi ouvida nem achada no que diz respeito ao acordo. E limitou-se a apresentar, agora, um conjunto de sugestões indicativas para que se começasse a debater este assunto e para tentar melhorar, se possível, um acordo que nasceu mal, um acordo falhado.”

Manuel Alegre, ao falar na comissão, na tarde de terça-feira, lembrou que como deputado do PS tinha votado contra o acordo (ele é também subscritor de um manifesto que apela à sua revogação), mas acrescentou que, como membro efectivo da Academia das Ciências, estava ali “com a melhor boa vontade”. Agora diz: “Esta posição do ministro, que fala em nome do Governo, revela também um grande desprezo por todos aqueles que se têm oposto desde o princípio a este acordo. Desprezo por escritores, por gente das letras, por académicos, por professores e por muitos cidadãos que manifestam a sua oposição a este acordo, que está a fragmentar a língua e a dividir os portugueses. Já nem falo de mim, falo do Vasco Graça Moura, que mostrou de mil e uma maneiras todos os erros deste acordo, que, aliás, considerava inconstitucional. Não conheço nenhum escritor de nomeada que seja favorável a este acordo.”

Mas como a posição da Academia é abrir um debate sobre o acordo, corrigindo nele pelo menos os pontos que considera mais gravosos, Manuel Alegre entende que a posição do Governo devia ser outra. “Devia aconselhar-se talvez com o Presidente da República, que já manifestou o seu desagrado em relação a este acordo. Eu compreendo que haja problemas, mas a posição do Governo devia ser de abertura ao diálogo, ouvir o que tem para lhe dizer a Academia das Ciências, que não tem competência política mas tem competência científica.”

Há outras coisas, diz Alegre, que neste campo o revoltam. “A mim dói-me, por exemplo, ver Angola ou Moçambique defenderem mais a língua portuguesa do que os membros do Governo português. Isto é absurdo!” A sua posição não mudou: “Pessoalmente votei contra o acordo e considero que a língua faz parte do património, da identidade e da soberania nacional. E a riqueza da nossa língua está na sua variedade, na sua diversidade.” Apesar disso, acha útil a discussão do tema. “O Governo devia rever a sua posição, devia pelo menos dialogar e não tomar uma atitude tão autoritária e tão dogmática quanto aquela que foi tomada pelo ministro.”

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