Alto Douro entra finalmente no Património Mundial

O secretário de Estado adjunto da ministra do Planeamento, Ricardo Magalhães, não conseguiu dormir na noite anterior, e Bianchi de Aguiar, o coordenador da candidatura, estava assustado. Mas o rigor que os membros do "bureau" do Património da UNESCO estavam a colocar na apreciação de todos os processos relacionados com as paisagens culturais não foi suficiente para levantar reservas em nenhum dos 21 representantes do Comité do Património - e ontem, por unanimidade, o Alto Douro vinhateiro foi inscrito na lista do Património Mundial da UNESCO.Omã, Grécia e Inglaterra foram os países que mais defenderam a candidatura portuguesa. Na opinião do representante grego, o Alto Douro já devia ter sido reconhecido pela UNESCO há muito tempo. O inglês, entre elogios, não escondeu os interesses que o seu país tem na região. O representante de Omã reconheceu que nunca tinha estado no Douro, mas, pelo que viu nas fotografias, disse que deve ser, de facto, uma região extraordinária. Em Alijó e na Régua, pelo menos, estalejaram foguetes e a alegria pelo reconhecimento da UNESCO contagiou todos os durienses. Mas a verdadeira festa, a festa que o Governo está a preparar, só vai acontecer no próximo dia 21. O primeiro-ministro vai ao Douro acompanhado dos ministros da Cultura, do Planeamento, do Ambiente, da Agricultura e da Economia e de mais alguns secretários de Estado. A celebração terá início no Pinhão, onde a comitiva governamental apanhará um velho comboio a vapor até à Régua. Nesta cidade, no armazém 43 do Instituto do Vinho do Porto, António Guterres vai brindar à classificação do Alto Douro vinhateiro com o novo cálice de vinho do Porto desenhado por Siza Vieira, ao som de concertinas tocadas por um grupo juvenil do Douro. No final, irá anunciar um plano de acção para cumprir os compromissos assumidos pela candidatura portuguesa com a UNESCO em matéria de requalificação de algumas aldeias e de protecção da paisagem vinhateira galardoada. O Governo tem mantido este plano no maior sigilo, mas o mais provável é que ele corresponda, "grosso modo", ao programa de acção apresentado pela equipa que coordenou a candidatura e que propunha um investimento inicial de cerca de quatro milhões de contos. O programa propõe uma série de medidas de mitigação das intrusões paisagísticas existentes em aglomerados urbanos, surribas e patamares resultantes do plantio de novas vinhas, determina a realização de planos de pormenor para as localidades inseridas na mancha classificada e apresenta já uma série de intervenções concretas com vista à requalificação de povoações como o Pinhão (onde é proposta a demolição do edifício escolar do ciclo preparatório, que se destaca negativamente na paisagem), Covelinhas, Valença do Douro e Caldas de Moledo. O documento propõe ainda uma série de regras para o uso do solo agrícola. Não é de excluir, no entanto, que o Governo proceda a uma reorientação das verbas inscritas na Acção Integrada de Base Territorial do Douro, já em curso desde o ano passado, e desvie algum dinheiro para o plano de gestão do Alto Douro vinhateiro. Mas, por mais operações de engenharia financeira que faça, a margem de manobra do Governo é curta, devido às dificuldades orçamentais que atravessa. Para já, a hora é de celebração. O Ministério do Planeamento congratulou-se ontem com a atribuição pela UNESCO do estatuto de Património Mundial ao Alto Douro vinhateiro, que considera ser "uma janela de oportunidades para a região". "A excelência da paisagem cultural evolutiva viva do Alto Douro, sustentada na produção dos vinhos do Porto e do Douro e no valor patrimonial de muitos dos centros urbanos, reúne todas as condições para o desenvolvimento de um turismo cultural e de um enoturismo de elevada qualidade", lê-se na nota distribuída por aquele ministério. Quem se propõe trabalhar pelo desenvolvimento da região do Douro é a Fundação Rei Afonso Henriques (FRAH, a instituição luso-espanhola que em 1998 decidiu retomar o processo de candidatura do Alto Douro vinhateiro). Esta fundação decidiu avançar com a criação de uma Comissão de Honra de Seguimento do Bem Classificado. Presidido pelo ex-ministro Miguel Cadilhe, o novo organismo terá como principais atribuições a promoção da imagem do Alto Douro como exemplo de paisagem cultural, bem como a coordenação das futuras acções das instituições públicas e privadas da região que participaram no processo de candidatura, e funcionará em simultâneo com a Associação de Promoção do Alto Douro Vinhateiro, cuja criação está prevista no Plano Intermunicipal de Ordenamento do Território.

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