Olhando para o cérebro, à procura das doenças do movimento

Equipa de Rui Costa publica estudo na revista Cell sobre as vias neuronais envolvidas nos movimentos.

Um estudo liderado pelo neurocientista português Rui Costa ajuda a perceber perturbações no cérebro que levam algumas pessoas a não parar de fazer movimentos e outras a não conseguir manter uma acção, contribuindo para que um dia se possam encontrar formas eficazes de tratamento.

“Além de percebermos a fisiologia do que se passa no cérebro, no dia-a-dia, [este trabalho] dá uma nova visão, apoiada pelas doenças neuropsiquiátricas, de como podemos tratar doenças do movimento e doenças psiquiátricas”, diz à agência Lusa Rui Costa, do Centro Champalimaud (em Lisboa) e coordenador deste trabalho publicado esta quinta-feira na revista Cell, que teve como autor principal Fatuel Tecuapleta, agora na Universidade Nacional Autónoma de México, na Cidade do México.

As pessoas que sofrem de transtorno obsessivo-compulsivo não conseguem parar de executar certas tarefas motoras, como lavar as mãos, enquanto aquelas que são afectadas por perturbação de hiperactividade e défice de atenção não conseguem sustentar a mesma acção motora durante muito tempo, explica um comunicado da Fundação Champalimaud.

“Há uma grande necessidade de compreender porque decidimos fazer umas coisas e não outras, o que determina a opção por uma acção e não por outra e por parar o que estava a fazer”, refere Rui Costa.

Em muitas das doenças que afectam uma área do cérebro chamada “gânglios da base”, explica o investigador, as pessoas ficam muito repetitivas a fazer só uma coisa (como as compulsões na doença de autismo e nas dependências) ou estão sempre a mudar (como a hiperactividade ou a esquizofrenia).

São duas as vias principais para a obtenção do movimento nestes casos: uma via directa e uma via indirecta, e os especialistas pensavam que a via directa era para fazer o movimento e a indirecta para parar, como se “uma fosse o acelerador e a outra o travão”. Mas afinal, salienta Rui Costa, “uma é a que está a dizer o que fazer e a outra aprova ou não” e são as duas necessárias.

Em caso de existir um problema, como a hiperactividade, “a pessoa gostava de se focar e continuar a fazer a actividade, mas, de repente, o cérebro está sempre a mudar, não consegue focar-se ou ter atenção a uma só coisa” e, neste caso, “pensamos que a via indirecta está perturbada”.

Ao contrário, nas doenças em que há compulsão, dependências ou comportamento repetitivo e a pessoa não consegue parar, “a via directa estaria a dizer vou continuar a fazer isto e a via indirecta não consegue vetar”, continua.

Assim, o estudo permite concluir que, em vez de um acelerador e de um travão, existiria um proponente e um aprovador. “É um desequilíbrio entre a actividade” destas duas vias e “a nossa esperança é que modificações subtis desse equilíbrio possam restabelecer” a normalidade, resume o cientista, que vai continuar o trabalho para perceber o funcionamento do cérebro. Mas também vai “provavelmente em colaboração com farmacêuticas, tentar perceber como é que se consegue usar isto para melhorar terapias”.

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