E assim crescia uma criança neandertal (quase ao ritmo de uma actual)

Partes de um esqueleto de um menino neandertal de oito anos revelam-nos o ritmo de crescimento desta espécie humana já extinta. E não é assim tão diferente do nosso.

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Os investigadores junto ao esqueleto do menino neandertal (da esquerda para a direita): Antonio García-Tabernero, Antonio Rosas e Luis Ríos Andrés Díaz-Comunicação CSIC

A máquina do tempo voltou a recuar até ao período dos neandertais. Desta vez, o destino da viagem foi a gruta El Sidrón, nas Astúrias (Norte de Espanha), com cerca de 49 mil anos. Foi lá que se encontraram fósseis do esqueleto de um menino neandertal com quase oito anos. O objectivo era perceber que diferenças existem entre o crescimento dos neandertais (Homo neanderthalensis) e do humano moderno (Homo sapiens), espécies humanas com um antepassado comum. Qual a conclusão do artigo publicado esta sexta-feira na revista científica Science: o ritmo de crescimento de um neandertal era muito semelhante ao do humano moderno.

É na gruta de El Sidrón que está “a melhor colecção de neandertais da Península Ibérica”, indica um comunicado do Conselho Superior de Investigação Científica envolvido neste estudo. Foi descoberta em 1994 e lá foram encontrados restos de 13 indivíduos: sete adultos, três adolescentes e três crianças.

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Esqueleto do menino neandertal Grupo de Palentologia MNCN-CSIC

Os neandertais extinguiram-se há cerca de 28 mil anos e são os nossos parentes mais próximos. O sítio onde encontraram partes do esqueleto do menino neandertal estudado tem 49 mil anos. A criança tinha quase oito anos, pesava 26 quilos e media 1,11 metros. E foram os seus dentes caninos e a robustez dos seus ossos que mostraram que era do sexo masculino. Os cientistas ainda conseguiram perceber que era destro e realizava actividades de um adulto, como o uso da boca para manusear peles e fibras vegetais. E ainda sabem quem era a sua mãe no grupo e que tinha um irmão mais novo.

Ao todo, foram recuperadas 138 partes do seu corpo, como dentes, fragmentos do crânio, da coluna, mão e joelho. A partir deles fizeram a comparação com o humano moderno da mesma idade.

Comecemos por comparar o crânio deste neandertal com um de um Homo sapiens. Os neandertais adultos tinham, em média, um volume endocraniano de 1520 centímetros cúbicos, enquanto o do humano moderno tem 1195 centímetros cúbicos, adianta o comunicado. Ora, o menino estudado só alcançou 1330 centímetros cúbicos, ou seja, 87,5% do crânio da idade adulta. Uma criança humana moderna tem já 95% do cérebro já desenvolvido com a mesma idade.  

O custo energético do crescimento anatómico do cérebro do humano moderno é muito alto, sobretudo durante a amamentação e a infância. Por isso, o crescimento do resto do corpo desacelera. “Desenvolver um cérebro grande tem um gasto energético importante, pelo que dificulta o crescimento de outras partes do corpo. No sapiens, o desenvolvimento do cérebro durante a infância tem um custo energético elevado, pelo que o desenvolvimento do resto do corpo abranda”, explica Antonio Rosas, do Museu Nacional de Ciências Naturais (Espanha) e principal autor do artigo. O neandertal também tem um crescimento anatómico lento entre o período em que deixa de ser amamentado e a puberdade, refere o mesmo comunicado.  

Ainda se encontraram semelhanças na fisiologia do esqueleto e na dentição. Apenas houve uma diferença no tórax: o que se observou no neandertal com quase oito anos no humano moderno corresponde a um menino entre cinco e seis anos.

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Investigadores no interior da gruta El Sidrón, em Espanha Grupo de Paleontologia MNCN-CSIC

Outra das diferenças é o desenvolvimento da coluna vertebral. A fusão das articulações das vértebras torácicas médias e o atlas (primeira vértebra da coluna vertebral) acontece dois anos depois no neandertal do que nos humanos modernos. “O atraso desta fusão na coluna vertebral pode significar que os neandertais tinham uma dissociação de certos aspectos na transição da infância à fase juvenil”, diz Antonio Rosas. As razões para essa diferença são desconhecidas mas podem estar relacionadas com o crescimento mais lento do cérebro, por exemplo.

“Conhecer as diferenças e as semelhanças dos padrões de crescimento entre os neandertais e os seres humanos modernos ajudam-nos a definir melhor a nossa própria história”, considera Antonio Rosas. “Os humanos modernos e os neandertais surgiram de um antepassado comum recente, e isso manifesta-se num ritmo de crescimento semelhante.” 

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