Centro Internacional de Investigação do Atlântico arranca até final de 2018

Após dois dias de diálogo técnico e político numa cimeira que reuniu representantes de 29 países na ilha Terceira, foi estabelecido um calendário para definir o que vai ser e como funcionará o AIR Center.

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A cimeira internacional nos Açores promovida pelo Governo português ANTÓNIO ARAÚJO/LUSA

Dez ministros de oito países apoiaram os princípios da criação de um futuro Centro Internacional de Investigação do Atlântico (AIR Center), nos Açores, proposto pelo Governo português numa cimeira que acaba esta sexta-feira na ilha Terceira. Além dos governantes, também os representantes da indústria aeroespacial mundial e cientistas de 29 países apoiam a ideia de trabalhar em conjunto para ajudar a salvar o planeta a partir dos Açores. Porém, falta aquela que será a fase mais difícil e decisiva do projecto: garantir o seu financiamento. Para já, foram criados dois grupos de trabalho com um calendário para definir o que vai ser e como funcionará o AIR Center.

“O consenso foi total. E não apenas na ideia, mas no plano, com um calendário, com uma equipa que irá concluir a agenda e os estatutos para a criação do AIR Center”, disse aos jornalistas o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, no final de dois dias de diálogo com governantes, empresários e cientistas. Segundo referiu “o envolvimento da Comissão Europeia é particularmente importante”, tendo ficado decidido que a nova Declaração de Belém (em Lisboa) vai ser assinada em Julho pela Comissão Europeia, a África do Sul, entre outros países, para promover a cooperação e investigação no Atlântico Sul e que ficará ligada ao estabelecimento do AIR Center, o que deverá garantir acesso a fundos comunitários.

“Sabemos agora que há um interesse neste projecto, o que ainda não sabíamos há um ano”, disse, sublinhando que as conclusões da cimeira foram aprovadas por “aclamação”. “Falta avançar para a instalação e assinar o acordo com os estatutos desta instituição intergovernamental, centrada nos Açores, que irá ser uma rede do Atlântico com pólos em vários países.” Manuel Heitor quer ver o AIR Center a “lançar os primeiros projectos efectivos e colocar financiamento nas instituições” no final de 2018. “Não estamos a falar de construir nada em cimento, vamos usar o que existe”, esclareceu, confirmando que os parceiros desta rede “vão contribuir com conhecimento e financiamento”.

No primeiro dia da cimeira, dedicado às discussões mais técnicas, o director-geral da Agência Espacial Europeia, Johann-Dietrich Wörner, já tinha deixado o que pode ser um bom argumento para conquistar os decisores políticos a investir no AIR Center: “Um euro investido no espaço significa um retorno de, pelo menos, seis euros”. Mas neste segundo dia, de diálogo político, também não se falou de dinheiro e os discursos estiveram de novo centrados nos elogios à ambição, oportunidade e à importância da proposta do Governo português, que está a ser traçada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). As declarações de apoio à criação do AIR Center vieram da China à Índia, passando pela Noruega, até à África do Sul, Brasil e EUA. Ou seja, decisores e potenciais investidores do Atlântico e além Atlântico.

O dinheiro será o desafio do próximo passo, estabelecer compromissos claros com parceiros investidores (público e privados) e avançar para um plano concreto de organização e criação das infra-estruturas necessárias para executar este projecto que quer explorar o Atlântico, através de uma cooperação internacional nas áreas do espaço, do clima, oceanos e energias renováveis.

“Diplomacia científica”

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, presente na cimeira, acredita que já em 2018 o AIR Center será mais do que um compromisso no papel. O projecto, considerou, demonstra a importância da cooperação internacional, garante uma necessária agenda comum para o Atlântico com produção e disseminação do conhecimento e possibilita “um melhor e mais intenso uso da diplomacia científica, como uma ferramenta para as relações internacionais”. “Esta iniciativa atrai muitos parceiros importantes no Atlântico e além do Atlântico”, referiu, acrescentando que “estes temas [clima, oceanos, energia e espaço] dizem respeito a toda a humanidade”. “Este é um projecto-chave para Portugal e para a nossa política externa”, concluiu.

“A diplomacia científica é uma oportunidade para juntar as melhores mentes e instituições em nome do bem comum”, resumiu Naledi Pandor, ministra da Ciência e Tecnologia da África do Sul. A governante pediu um “real e genuíno envolvimento a nível global”, destacando o papel da iniciativa privada “que tem de fazer parte do projecto”.

Sobre a base de lançamentos espacial que o Governo quer construir na ilha de Santa Maria, Juergen Ackermann, director da empresa de lançadores de satélites da Airbus, considera que este seria “um desafio”, apesar de frisar que os Açores estão numa posição geográfica “muito atractiva” para lançar pequenos satélites. Já Manuel Heitor considerou que a base espacial “é um projecto que pode ser paralelo ao AIR Center”, mas que, afinal, não é essencial. “Obviamente, não se faz uma base de um dia para o outro, isso vai ter de ser estudado. Mas é importante perceber que mais de 50% desta reunião foi dominada pelos temas do espaço. Haver uma base será certamente um elemento diferenciador, mas ficou claro que o projecto não é afectado por isso”, acrescentou.

No final da reunião, que juntou mais de 200 potenciais parceiros, foi redigido um documento sobre os princípios e calendário deste plano que será ratificado até ao início de 2018.

Para garantir que estes prazos são cumpridos, foi marcada uma reunião para Novembro deste ano, no Brasil. Decidiu-se ainda criar um comité – liderado pela FCT, com representantes de Espanha, Brasil, EUA e África do Sul – que vai elaborar um documento final até Setembro de 2017. E, ainda, criar um grupo de trabalho mais alargado com representantes de governos, indústria e cientistas que irá preparar um plano para criar e financiar o projecto para apresentar até ao final do ano.

Para já, ficou a vontade de trabalhar juntos para investigar a Terra (os oceanos, o clima, a energia) com a ajuda do espaço a partir dos Açores e que, nestes dois dias, ganhou mais força. Mas agora falta o resto e o mais difícil: tornar estas boas intenções numa realidade.

O PÚBLICO viajou a convite do Ministério da Ciência

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