Mundial da FIFA de 2026: futebolistas em risco de stress térmico e desidratação grave, alertam cientistas

Perspectivas de calor no Mundial de 2026 deixam jogadores sob risco de stress térmico, avança um novo estudo da Universidade da Breslávia, publicado na revista Scientific Report, do grupo da Nature.

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Mundial de 2026 pode colocar atletas sob elevado risco de stress térmico woraput/GettyImages
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Os futebolistas do Mundial de 2026 terão de jogar sob risco de stress térmico e potencial desidratação grave, segundo avança um novo estudo da Universidade de Saúde e Ciências Desportivas da Breslávia publicado, esta quinta-feira, na revista Scientific Reports.

Marek Konefal, professor associado no Departamento de Motricidade Humana da mesma universidade e autor principal do estudo Prospective heat stress risk assessment for professional soccer players in the context of the 2026 FIFA World Cup​, explicou ao PÚBLICO que dez dos 16 locais previstos para acolher os jogos do próximo Campeonato do Mundo, a decorrer nos EUA, Canadá e México, podem pôr os futebolistas em risco. Destacam-se, principalmente, os estádios situados em Arlington e Houston, no Estado norte-americano do Texas, e Monterrey, no México.

As ameaças não são novas. Primeiro, o Mundial de 2022, no Qatar. Este ano, os Jogos Olímpicos em Paris. Em 2026, o Mundial da FIFA. Todas estas celebrações estão ligadas, claro, pelo desporto, mas, sobretudo, por serem alvo de grandes preocupações climáticas. Afinal, a grande maioria destes eventos decorre no Verão e, com o generalizado e agravado aquecimento global, colocam-se os atletas em condições de risco. Aliás, em Agosto deste ano, o Comité Olímpico Internacional chegou mesmo a admitir a grande probabilidade de que os Jogos deixassem de se realizar naquele mês.

Utilizando dados do programa europeu de monitorização do clima Copérnico, o estudo da Universidade da Breslávia apurou que os três estádios mencionados sugeriram valores médios de UTCI (Índice Térmico Universal) superiores a 49,50 graus Celsius, o que representa um elevado risco de stress térmico.

Imitar o clima para avaliar

Estima-se que o valor mais elevado tenha ocorrido em todos os estádios entre as 14h e as 17h, hora local, excepto em Miami, na Florida, que observou os valores mais elevados entre as 11h e as 12h. Para o estudo, foi criado um ambiente que imita a temperatura, o vento e a humidade observados em cada um dos 16 locais, tendo por referência as médias térmicas de Julho.

Arlington, Houston e Monterrey são o maior foco de preocupação pelas temperaturas particularmente elevadas e com tendência para aumentar, principalmente na altura do ano em que se prevê que o evento futebolístico seja realizado, entre 11 de Junho e 19 de Julho.

Estas condições climáticas adversas já se relevaram problemáticas em anteriores países anfitriões de Mundiais, como foi o caso do Brasil em 2014, devido à elevada humidade do ar.

No entanto, os dados avançados partem do pressuposto de que estes estádios não estão equipados com ar condicionado, equipamento este que, segundo alguns teóricos, poderia reduzir os níveis de perda de água e stress térmico nos atletas. A esse nível, contudo, Konefal mostra-se céptico: “A minha investigação anterior demonstra que, no Qatar, em 2022, os estádios com ar condicionado registaram uma temperatura do ar de 24º graus e uma humidade relativa de 56%, enquanto os estádios sem ar condicionado registaram 25º graus e 64%, respectivamente. Como se pode constatar, não é uma diferença muito grande. Até porque na maioria dos estádios o ar condicionado era desligado à hora do jogo para evitar interferências.”

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Campeonato do Mundo FIFA, Qatar, em 2022: Lionel Messi a levantar o troféu enquanto celebra a vitória REUTERS/Hannah Mckay

É possível prevenir?

Apesar de admitir que ainda não foi estabelecido um contacto com a FIFA para comunicar estes resultados, Marek Konefal diz que teria “todo o gosto” em ajudar “as equipas técnicas e organizadores do evento a planear os treinos e os jogos de forma a evitar que ocorram durante os períodos de maior risco de stress térmico extremo”.

O autor do estudo alerta ainda as entidades organizadoras para a necessidade de monitorizar no local o nível de stress térmico durante os jogos. Para além disso, “seria igualmente aconselhável que os jogadores não mudassem drasticamente de local e de tipo de clima em que permanecem durante os campeonatos, mas sim que jogassem em condições de stress térmico semelhantes”, acrescentou Konefal.

Numa nota de imprensa mais abrangente, o autor do estudo alerta para a urgência de pensar no futuro. O clima está a aquecer e os campeonatos do Mundo de Futebol serão disputados em condições de stress térmico cada vez mais elevado. Vale a pena repensar desde já o calendário destes eventos desportivos, declarou em jeito de alerta.

O stress térmico leva, principalmente, a que as capacidades psicomotoras diminuam, a velocidade e a precisão dos movimentos diminuam e que surjam perturbações na concentração. A fadiga periférica resultante do stress térmico pode ter um impacto negativo na distância total que os jogadores são capazes de percorrer durante um jogo, bem como na distância percorrida a alta intensidade, no número de acelerações, sprints e saltos.

Há alguns sinais a que os atletas devem estar atentos perante a suspeita de stress térmico relacionado com calor de esforço, como, por exemplo, a transpiração abundante e a fraqueza, que podem levar a desmaios, dores de cabeça, náuseas e vómitos, sede excessiva e cãibras musculares.