Vais viajar sozinha? Os oito conselhos de duas mulheres que correm o mundo a solo

Peregrinas queixam-se de ataques quando viajam sozinhas nos Caminhos de Santiago. Duas especialistas acreditam que são casos pontuais e partilham 8 medidas para garantir mais segurança às mulheres.

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Mais mulheres têm peregrinado pelos Caminhos de Santiago de Compostela Paulo Pimenta
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Não era a primeira vez que Marta Geadas Durán viajava completamente sozinha, nem sequer o país mais inseguro por onde já tinha passado. Em 2016, quando passou pela Suíça durante uma viagem de dois meses sozinha à boleia pela Europa, já levava na bagagem dois anos de experiência em grandes viagens a solo, depois de, em 2014, ter ido sozinha a Moçambique para fazer voluntariado.

Quando levantou a mão e entrou naquele carro na Suíça já estava de regresso a Portugal. Tudo tinha corrido bem até àquele momento — o momento em que o condutor que lhe ofereceu boleia começou a insistir para que Marta fosse com ele para casa. “Deixou-me bastante assustada”, conta ela numa entrevista ao P3 num dia de folga que guardou para recuperar energias após mais uma viagem à Guiné-Bissau.

A recusa da viajante não parecia bastar: foi preciso gritar duas vezes para que o homem finalmente a deixasse sair do carro. “Chorei bastante quando saí de lá”, recordou: “Só consegui pedir ajuda quando vi uma condutora mulher.”

É uma história que Marta classifica como “infeliz” num diário de bordo com 10 anos de episódios que são “geralmente felizes”. E é também por ela que a viajante não estranha os relatos noticiados esta semana pelo The Guardian de mulheres que dizem ter sido assediadas e atacadas enquanto peregrinavam nos Caminhos de Santiago de Compostela em Portugal, Espanha e França.

Mas essas histórias “não são por causa destes caminhos”, acredita Marta, que também já foi vítima de perseguições em países como Cabo Verde ou a Índia: “As situações de insegurança acontecem muitas vezes com as mulheres que viajam sozinhas ou em grupo, independentemente do local”, avisou.

E também não são de estranhar num caminho de peregrinação que tem sido cada vez mais procurado, inclusivamente por mulheres, e que Marta já fez por três vezes — porque mais gente pode significar um maior número de incidentes. “Tenho aconselhado muitas mulheres a fazer os Caminhos de Santiago porque considerava, e ainda considero, que são seguros”, admite.

É uma opinião partilhada com Cau Casimiro, outra mulher acostumada a viajar sozinha e que está a organizar, no próximo ano, duas viagens pelo Caminho de Santiago de Compostela: uma com uma outra guia de viagens, pelo Caminho Interior, e outra em grupo pelo Caminho Português. Em declarações ao P3, Cau Casimiro, que nunca viveu situações de perigo durante as suas viagens a solo, acredita que os relatos de ataques pelos percursos de peregrinação que desembocam em Espanha são pontuais.

Admite, ainda assim, que toma medidas na esperança de evitar transformar-se num alvo. Cau Casimiro diz que tende a escolher roupas que tapam mais o corpo quando viaja sozinha, fica mais alerta para o ambiente que a rodeia e estuda extensivamente os percursos que pretende explorar para criar planos de contingência caso sofra algum contra-tempo. “É importante que as mulheres saibam que podem ter estas experiências à mesma”, apelou: “Casos como este não nos podem desmotivar.”

Se és mulher e pretendes realizar uma viagem sozinha em breve, estes são os conselhos que Marta Geadas Durán e Cau Casimiro deixam para as estreantes.

Tem confiança em ti mesma

Um dos segredos mais importantes numa viagem a solo é agir com confiança e segurança em todos os momentos. “Pensem em vocês mesmas como uma arma”, aconselhou Marta Geadas Durán: “Se passarmos a imagem de que estamos completamente confortáveis, há menos probabilidade de pessoas com más intenções terem coragem de agir.”

Sabe exactamente por onde ir

Estuda exaustivamente o mapa do percurso que tem pela frente, aconselhou Cau Casimiro, e aproveita todos os momentos de pausa para recordar os detalhes do troço seguinte. “Sinaliza os alojamentos que estão por perto, os cafés em que te poderás refugiar caso necessites, onde ficam as autoridades de segurança e os locais onde podes encontrar cuidados de saúde”, exemplificou.

Cuidado com as roupas

Prefere roupas mais claras por serem mais facilmente identificáveis e viaja munida de materiais reflectores — como coletes ou faixas nas t-shirts, camisolas e sapatilhas. Tem também um apito ao pescoço para soprar caso venhas a ser atacada. Assim é mais provável que alguma pessoa por perto escute o alerta sonoro.

Confia no seu instinto

Mantém a calma e desfruta da viagem, mas nunca ignores os sinais de alerta que lhe chamarem a atenção — mesmo que depois não passe tudo de um susto. É preferível tomar medidas de segurança que se revelem exageradas do que vir a lamentar não teres confiado no teu instinto. A tua mente será a sua melhor companhia de viagem.

Partilha as tuas informações

É especialmente importante caso tenhas pouca experiência a viajar sozinha. Aproveita as funcionalidades do teu telefone ou adquire um dispositivo de rastreamento, como o AirTag ou o SmarTag, e partilha a sua localização com alguém de confiança que esteja em contacto regular. Essa pessoa deve estar constantemente alerta; saber os locais onde tenciona pernoitar e comer. Combina com ela uma palavra de segurança.

Usa relógios digitais

Os smartwatches não servem apenas para contabilizar os seus passos ou vigiar o seu ritmo cardíaco. Alguns destes acessórios alertam os seus contactos de emergência caso detectem uma queda ou um ataque.

Tira fotografias

Se apanhares boleia, aponta as características da viatura e tira fotografias à matrícula; e envia todas as informações imediatamente a alguém de confiança. Faz um esforço para tirares fotografias junto a pontos de referência, para que qualquer pessoa de confiança possa vigiar a tua última localização conhecida.

Leva o teu animal de estimação

É uma medida que pode dificultar a logística da viagem, uma vez que muitos albergues e hotéis não aceitam animais de estimação nas suas instalações, mas a companhia de um cão (sobretudo se for de grande porte) pode ser suficiente para que um hipotético atacante prefira não se aproximar de ti.

A Guarda Nacional Republicana (GNR) registou três crimes de exibicionismo desde 2023 nos percursos portugueses dos Caminhos de Santiago no Porto, Braga, Viana do Castelo, Vila Real e Viseu. Um deles foi registado no ano passado e outros dois já este ano, confirmou a força de segurança à Agência Lusa, e nenhum deles culminou num ataque físico às vítimas. Os casos resultaram na identificação de um suspeito. O P3 também contactou a Polícia de Segurança Pública (PSP) sobre esta matéria, mas não obteve qualquer resposta.

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