Financiamento climático não é caridade, interessa a todos, diz responsável da ONU do clima

Na sessão de abertura da COP29, em Bacu, no Azerbaijão, o secretário executivo das Nações Unidas do clima pediu acção: “Esta crise está a afectar cada uma das pessoas do mundo, de uma forma ou outra.”

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Simon Stiell a falar durante a cerimónia de abertura, com a fotografia de Florence, atrás IGOR KOVALENKO/EPA
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O financiamento climático é uma necessidade mundial, não é um acto de caridade, disse Simon Stiell, secretário executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (UNFCCC, sigla em inglês), no discurso que fez durante a cerimónia de abertura da 29.ª Convenção do Clima (COP29), que começou nesta segunda-feira, em Bacu, a capital do Azerbaijão, e se prolonga até 22 de Novembro.

O objectivo principal que está na agenda da COP29 é discutir as novas metas para o apoio financeiro dos países de baixo rendimento. Este apoio terá de ser providenciado pelos países mais ricos, mas Stiell rejeita a ideia de se tratar apenas de um acto altruísta.

“Deixemos de lado a ideia de que o financiamento climático é caridade. Um novo objectivo ambicioso do financiamento climático é completamente do interesse próprio de cada nação, incluindo das maiores e mais ricas”, disse o responsável das Nações Unidas. “É por isso que estamos em Bacu. Temos de chegar a um acordo em relação a um objectivo global sobre o financiamento climático.”

Simon Stiell iniciou o discurso a partir de uma fotografia em que aparece a abraçar Florence, uma senhora que vive em Carriacou, uma ilha nas Caraíbas atravessada em Julho último pelo furacão Beryl. “Em Julho deste ano, estes éramos nós, em cima do que restou da sua casa depois da devastação do Beryl”, disse Stiell, que é nativo da ilha vizinha, Granada. “Aos 85 anos, a Florence tornou-se uma dos milhões de vítimas afectadas só este ano pelo descontrolo das alterações climáticas.”

Para o secretário executivo da UNFCCC, Florence é também um exemplo de alguém determinado que, perante o abismo, escolhe focar-se em “ser forte para a sua família e para a sua comunidade” e lutar. “Esta crise está a afectar cada uma das pessoas do mundo, de uma forma ou outra”, recordou o responsável. Nesse sentido, as cimeiras do clima são uma oportunidade.

“Este processo da UNFCCC é o único local que temos para enfrentar a crise climática desenfreada, e para nos responsabilizarmos mutuamente, de uma forma credível, para agirmos em relação a essa crise”, frisou o responsável. “Se pelo menos dois terços das nações do mundo não puderem suportar um corte rápido nas emissões, então cada nação pagará um preço brutal.”

Segundo Stiell, é por isso necessário “reformar o sistema financeiro global, dando aos países o espaço fiscal que eles necessitam tão desesperadamente”. O responsável pediu ainda que a COP29 ponha “em funcionamento os mercados internacionais de carbono” e para avançar com a mitigação.

“Não podemos deixar o objectivo dos 1,5 graus [Celsius] sair do nosso alcance. E mesmo que as temperaturas subam, a implementação dos nossos acordos tem de as agarrar e as baixar de volta”, defendeu, referindo que o investimento em 2024 em energias limpas e em infra-estruturas iria atingir 1,88 biliões de euros, quase o dobro do investimento em combustíveis fósseis. “A mudança para a energia limpa e para a resiliência climática não pode ser travada. A nossa função é acelerar isto e garantir que os seus enormes benefícios são partilhados por todos os países e todas as pessoas”, afirmou.

“Momento de verdade”

O responsável anunciou ainda que a UNFCCC ia criar um Plano de Campanha Climática para apoiar os países na criação da terceira geração de planos de clima nacionais, já a pensar na COP30, que decorrerá em Novembro de 2025, em Belém do Pará, no Brasil.

Também o presidente eleito da COP29, Mukhtar Babayev, ministro da Ecologia do Governo do Azerbaijão presidido por Ilham Aliyev, fez declarações durante a cerimónia de abertura da convenção. “Colegas, estamos no caminho para a ruína”, disse, citado pela agência Reuters. “As pessoas estão a sofrer nas sombras, estão a morrer na escuridão e precisam de mais do que compaixão, do que preces e burocracia. Elas estão a clamar por liderança e acção”, referiu, num tom dramático.

“A COP29 é um momento de verdade para o Acordo de Paris. Vai testar o nosso compromisso para um sistema climático multilateral. Temos de demonstrar agora que estamos preparados para alcançar os objectivos que definimos para nós mesmos”, concluiu.