O Mamoré de Borba Grande Reserva é uma homenagem a um velho (e bom) Alentejo

Descobrir vinhos que nos recordem os grandes tintos do Alentejo, feitos com vagar, vinhas velhas e a ajuda da natureza, é algo que acontece em dias de festa.

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As vinhas velhas da Sovibor Direitos Reservados
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Quem anda por todo o lado a provar vinhos sujeita-se a muita coisa. A vinhos que são mais do mesmo e a vinhos que surpreendem por inúmeros factores; a vinhos que se vendem por tuta e meia e a vinhos criados para ricos; a vinhos que parecem saídos de uma fábrica de refrigerantes (sempre iguais de colheita para colheita) e a vinhos que só nascem quanto a natureza deixa; a vinhos tecnicamente correctos e a vinhos que parecem saídos de uma vinagreira (a moda continua). Há de tudo, pelo que a última coisa que se pode dizer é que a vida de um provador é uma pasmaceira.

Por tudo isso, o nosso desejo, em determinadas provas, é a que nos saia um vinho que se cole na nossa memória pelo facto de ser algo com identidade marcadamente vincada, daqueles que cheiramos, bebemos e concluímos de imediato que tal vinho só pode ser da Bairrada, do Dão ou dos Açores. No caso em análise, no caso deste Mamoré de Borba Grande Reserva 2020, da Sovibor, podemos dizer é que é um grande tinto em qualquer parte do mundo (cosmopolita e senhorial), mas que começa a cheirar a Alentejo mal o vinho cai no copo. Parecendo que não, isso é notícia.

A modernização trouxe coisas boas e menos boas ao mundo do vinho. Entre estas últimas regista-se uma padronização excessiva, quer dentro das regiões vitícolas, quer entre regiões, visto que não só as castas andam por todo o lado como os procedimentos enológicos são universais. O que temos então de sobra e que ainda pode fazer a diferença? As vinhas velhas, o clima, os solos e a vontade do produtor para esperar e respeitar a natureza. É o que acontece com este Mamoré de 2020. Repare-se neste detalhe: na actual vida de Sovibor, administrada por Fernando Tavares há dez anos, só foram lançadas duas edições deste vinho. Isso quer dizer muito.

Este tinto tem origem numa parcela muito específica de vinhas velhas que terão mais de 50 anos, com as castas Trincadeira e Alicante Bouschet. Tratando-se de um vinho de parcela e de vinhas velhas (mais constantes, mesmo em tempos de inconstância climática), seria de esperar maior regularidade quantitativa e qualitativa das uvas (e isso até acontece), mas, ainda assim, Fernando Tavares criou para si próprio um perfil para o seu Grande Reserva tão exigente que passa os anos a recusar colheitas candidatas, qual equipa da Casa Ferreirinha a tomar decisões sobre o Barca Velha.

E que perfil é este? “É o que você está a provar. Se me pede para o descrever não me é fácil, mas tem que ser um vinho que mal o coloque ao nariz me dê as indicações de que é o vinho que procuro sempre. Eu tenho de sentir, logo quando nasce, que é o Mamoré Grande Reserva. Nesta colheita, por exemplo, não haverá vinho para Grande Reserva”, disse-nos o empresário, há dias, durante o lançamento do vinho.

No mais, estamos perante um vinho que leva a nossa memória para os grandes vinhos do Alentejo, coisas raras que tinham sempre a participação das castas Trincadeira (difícil, mas deslumbrante nalguns anos) e Alicante Bouschet que, na sua conta, peso e medida, é um ingrediente fundamental para os tintos alentejanos. Vinhos que, como é o caso do Mamoré, se apresentam com aromas difíceis de descrever (Fernando Tavares tem mesmo razão), mas que misturam notas vegetais e notas fumadas clássicas da Trincadeira com casca de frutos vermelhos do Alicante Bouschet, sendo que a boca revela a elegância e a suavidade de taninos que nos fazem querer estar sempre a provar um vinho que nos lembra os clássicos do final dos anos 1980 e início dos anos 1990.

Em tempos padronizados e com as vendas em queda, é bom sabermos que ainda há gente que não se importa de esperar o tempo que for necessário por um determinado vinho. Este tinto é um quatro em um: vale por si próprio, vale pela capacidade de nos fazer viajar, vale pela cultura organizacional da Sovibor e vale por ser um grande tinto de Borba (muito importante). Descobrir vinhos assim é um dia de festa.

Nome Mamoré de Borba Grande Reserva 2020

Produtor Sovibo;

Castas Trincadeira e Alicante Bouschet

Região Alentejo

Grau alcoólico 15%

Preço (euros) 65

Pontuação 96

Autor Edgardo Pacheco

Notas de prova Feito de uma vinha velha da região de Borba com solos de xisto e a uma altitude de 420 metros, é um tinto com aroma de frutos vermelhos, folha de tabaco, especiarias variadas e notas vegetais e fumadas. Na boca, aveludado, especiado, elegante, harmonioso e desafiante de gole e em gole. Um tinto para viver muitos anos.

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