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É outubro, Rosa
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Na semana em que Roberto Carlos encurtou a distância entre Brasil e Portugal, tive a oportunidade de reencontrar o Rei em uma arena lisboeta lotada. Ao meu lado, sentou-se uma simpática senhora, que, gentilmente, apresentou-se como Rosa. Admirada com a vitalidade de Roberto, aos 83 anos, dona Rosa não revelou sua idade, mas contou, orgulhosa, que tinha acabado de vencer um câncer de mama e estava ali, nas suas próprias palavras, “para festejar a vida”.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) dão conta de que mais de 2 milhões de mulheres recebem o diagnóstico anualmente. De acordo com a Liga Portuguesa Contra o Cancro, o câncer de mama é o mais frequente entre as mulheres, sendo responsável por um a cada quatro casos de câncer no mundo. Além disso, estima-se que uma em cada 11 mulheres na União Europeia desenvolverá câncer de mama antes dos 74 anos, sendo mais da metade dos casos em mulheres que ainda estarão em idade economicamente ativa.
Em Portugal e no Brasil há diversos casos de sucesso na luta contra o câncer de mama. São exemplos de instituições que combatem o problema na raiz. Dentre elas, quero destacar a recente iniciativa levada a efeito no Tribunal Região Federal da 2ª Região, pelas mãos da competente desembargadora Federal Cármen Sílvia Lima de Arruda. Lá, trabalhadoras da instituição gozam de três dias de folga para dedicarem-se integralmente à saúde.
Neste caso em especial, há uma particularidade que reflete o brilhantismo da medida: os dias são concedidos a todas, independentemente do cargo, e, principalmente, do vínculo que possuem com o Tribunal. Quer dizer, sejam servidoras públicas concursadas ou trabalhadoras terceirizadas, não importa: são mulheres. Isto pode parecer óbvio, mas a verdade é que, no mundo das instituições, há muitas pessoas invisíveis. E, por isso, certas obviedades precisam ser ditas, recordadas e louvadas.
Para quem emigra, deixar a saúde em segundo plano pode acabar sendo uma imposição. São tantos os desafios de chegar a um novo país e (re)começar, que uma das poucas certezas que temos é a do autoconhecimento. Todo resto é novo, urgente e, por isso, muitas vezes relegamos nosso bem maior, confiando que nos conhecemos e estamos bem. Mas a saúde não pode esperar. Portanto, se você chegou recentemente à Portugal e ainda não sabe como retomar a sua rotina preventiva, procure a Liga e informe-se.
Mas voltemos a Roberto e a dona Rosa. O Rei cantou e encantou, fazendo declarações de amor e confidências daquelas que nos tornam velhos amigos. Veio a Lisboa, em outubro, e ofereceu rosas à plateia, como de costume. Fez o seu próprio Outubro Rosa. Sua obra é imortal, ainda que um dia, pelo curso natural da vida, venha a se tornar um legado. Ela atende a anseios do ser humano e dialoga de forma particular com cada um de nós, como Roberto fez ao cantar Mulher de 40, confessando já ter conhecido muitas meninas de 60 e levando as Rosas ali presentes à apoteose.
Deste lado do Atlântico, não há águas de março para fechar o verão. Quem faz esse papel é o cair das noites, que vai, paulatinamente, nos impondo a chegada do outono, o prelúdio do inverno. Fazia já algum frio naquela noite, ainda que Roberto tivesse aquecido os corações dos quase 10 mil presentes.
Dona Rosa levantou-se e seguiu a multidão até a saída. E eu fiz o mesmo. Uma garoa fina lavava almas e calçadas no Parque das Nações. Já na rua, ergeu a mão direita em aceno e disse-me “foi um gosto”, sorrindo, com os braços encolhidos. E deu um sonoro espirro, denunciando a mudança de estação. Seu marido tirou a jaqueta e cobriu-a: “Faz frio, Rosa, vista aqui o meu casaco”. E saíram caminhando. É, não se pode descuidar das intempéries do clima e da saúde. Afinal, é outubro, Rosa.