Bloco de Esquerda leva ao Parlamento audição sobre políticas de reparação e reconciliação

Audição com cinco especialistas marcada para 20 de Setembro. É preciso reconhecer que os impérios foram processos de dominação, ocupação e violência, diz BE, que quer debate sobre reconciliação.

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Um dos temas que BE quer levar ao parlamento é a forma como a História é ensinada. Na foto Amílcar Cabral, um dos heróis das independências Enric Vives-Rubio
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Em Abril o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, defendeu que Portugal deveria assumir “total responsabilidade” pelos crimes durante a escravatura e o colonialismo e “pagar os custos”.

Na altura, a declaração à agência Reuters gerou várias críticas e a acusação do partido de direita radical Chega de traição à pátria. Entre quem concorda com a necessidade do debate, houve quem criticasse o Presidente por considerar que as declarações deveriam ter sido enquadradas com mais contexto e informação.

Agora, meses depois, o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda agendou para 20 de Setembro no Parlamento a sessão com o tema “‘Libertar Portugal do colonialismo’: reparação e políticas públicas”, numa audição com cinco especialistas. A ex-deputada ao Parlamento Europeu do BE, Anabela Rodrigues, fala sobre políticas públicas com base em estatísticas oficiais, a jornalista Paula Cardoso fala sobre políticas para a igualdade e direitos cívicos, o antropólogo Miguel Vale de Almeida fala sobre reparar a desigualdade, o presidente da Associação de Professores de História Miguel Monteiro de Barros sobre políticas públicas para a educação e o sociólogo Miguel de Barros sobre desenvolvimento.

Para o partido “as reparações históricas e as políticas de reconciliação podem assumir diversas formas, mas todas exigem diálogo”. “Este debate é, antes de mais, um debate sobre reconhecimento, e é um debate sobre reconciliação – reconciliação com os povos outrora colonizados, reconciliação com o nosso próprio povo, em toda a sua diversidade.”

No documento sobre a audição o partido justifica a necessidade deste debate no ano em que se comemoram os 50 anos da democracia “e os 50 anos do fim do terceiro império”. “Portugal tem uma história imperial e colonial para além dos mitos sobre 'terras de ninguém' que teriam sido 'descobertas' e de uma presença 'civilizadora' 'pacífica' e multissecular noutros continentes. (...) Não podemos continuar a falar apenas de tecnologia naval e de expedições marítimas, de ciência e de conhecimento, parte dos quais, aliás, são contributos de vários povos, nomeadamente da civilização árabe. Importa sobretudo reconhecer que os impérios não foram contactos geográficos e culturais, mas sim processos de dominação, ocupação e violência.”

Dando exemplos dessa violência - como o tráfico transatlântico de pessoas escravizadas do século XVI ao século XIX ou o estatuto do indigenato que vigorou em Angola, em Moçambique e na Guiné-Bissau até 1961 e onde as populações negras não tinham acesso aos mesmos direitos - o BE lembra que Portugal se recusou a iniciar um processo de descolonização, desencadeando as guerras de libertação a partir de 1961. “Os massacres, anteriores e contemporâneos das guerras de libertação, estiveram silenciados durante anos: podendo referir-se como exemplos Batepá (1953, em São Tomé), Pidjiguiti (Guiné-Bissau, 1959) e Wiriamu (Moçambique, 1972).”

Citam a Constituição onde se afirma “Libertar Portugal da ditadura, da opressão e do colonialismo representou uma transformação revolucionária e o início de uma viragem histórica da sociedade portuguesa”.

Apontam para o presente em Portugal onde referem que o racismo, “com raízes profundas na escravatura e no colonialismo, resulta não só em injustiças sociais, mas também em violência” - como as desigualdades em várias áreas da vida de pessoas negras ou “os brutais assassinatos com motivações racistas” de Alcindo Monteiro (em 1995) ou Bruno Candé (em 2020).

As crianças e os jovens não podem continuar a receber na escola uma educação que normaliza o tráfico de pessoas escravizadas e que oculta as culturas e a resistência dos povos colonizados e a história secular de um continente que existe muito para além das invasões e perspectivas europeias. ​As pessoas racializadas não podem continuar ausentes do espaço público e dos seus lugares de memória, enquanto se glorificam agentes das guerras de ocupação colonial”, afirmam. “Fruto de uma longa luta do movimento anticolonial, antirracista e das pessoas afrodescendentes o tema das reparações históricas ganhou espaço no debate público. A Europa está a lidar com o seu passado. É assim na Alemanha, na Bélgica, na França e nos Países Baixos. A escolha que temos de fazer é entre acompanharmos este debate europeu e trazermos justiça social para todas as pessoas portuguesas ou ficarmos amarrados à propaganda antiga, repetindo um tempo de proibição e de censura", defende.

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