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Uma ode aos “loucos anos” do cineasta Mário Macedo e da sua “família pan-europeia”

Entre os 20 e os 35 anos, Mário Macedo viveu em vários países europeus, sempre na companhia de outros artistas. O registo do seu irreverente quotidiano deu origem ao fotolivro Running Away Into You.

Fotografia do livro Running Away Into You, editado pela Lebop Books ©Mário Macedo
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Fotografia do livro Running Away Into You, editado pela Lebop Books ©Mário Macedo

Entre 2011 e 2023, o cineasta português Mário Macedo, natural de Joane, aldeia de Famalicão, viveu em três capitais europeias: primeiro em Copenhaga, seguido de Zagreb e, por fim, em Berlim, onde ainda se encontra. Ainda antes de emigrar, logo após terminar o seu curso universitário, no Porto, sentiu, impelido pelo contacto com a doença de Alzheimer da avó, uma urgência em fazer o registo fotográfico da sua vida. “Apercebi-me da importância da memória e passou a preocupar-me a possibilidade de, um dia, vir a perdê-la”, conta ao P3, em entrevista a partir de Berlim.

Foi assim que nasceu uma relação duradoura entre Mário e uma câmara fotográfica instantânea, point and shoot, que passou a ser a sua companheira de vida. “Ao longo dos anos, fui acumulando fotografias, memórias, de amigos, amores, desilusões, depressões.” Ao fim de mais de uma década fora de Portugal, o cineasta decidiu, em conjunto com o fotógrafo Carlos Lobo, seu ex-professor e fundador da editora independente Lebop, especializada em livros de arte e de fotografia, rever todas as imagens que tinha produzido ao longo dos anos para “construir a narrativa” que daria origem ao livro publicado recentemente, intitulado Running Away Into You, que, nas palavras da editora, "apresenta uma desafiante e poética reflexão sobre juventude, amores passados, sobre a sede ardente pela vida, pela sua beleza e tristeza". 

“O Carlos Lobo olhou para as mais de três mil fotografias que eu tinha produzido e fez uma primeira resenha”, explica Mário. “Estava muito focada na minha antiga relação amorosa, que tinha acabado recentemente, após oito anos.” Seguiu-se o trabalho conjunto que resultou na última versão, que acabou impressa. Nas 112 páginas que dão corpo à obra multiplicam-se os ora ternos, ora difíceis retratos de Sara, juntamente com as fotografias que tirou “das aventuras e desventuras com o grupo de amigos de várias partes do mundo que se tornou, ao longo dos 15 anos, numa espécie de família pan-europeia”, descreve.

O livro descreve os seus “loucos anos 20” – ou, corrige, os seus “loucos 20 anos”, os que viveu, emigrado, entre os 20 e os 35 anos. “Os loucos anos marcados pelo rasgo de juventude, pela ausência de maturidade mental que nos leva a cometer muitos erros.” As longas noites de festa, dentro e fora de portas, em bares, casas e squats, os projectos em que se envolvia com os amigos artistas, os bastidores dos sets de filmes onde trabalhou como assistente de produção, as namoradas, os casos e "descasos" foram registados à queima-roupa, resultando num retrato íntimo e intimista da vida do cineasta.

“Alguém me disse, uma vez, que [este conjunto de imagens] se tratava da captura de um millenial small-town boy”, observa, entre risos.

Mas outras pistas, de cariz mais simbólico, procuram situar o registo na era em que foi produzido. “O livro abre com a fotografia de um nazi ensanguentado, aludindo para a ressurgência do fascismo e da extrema-direita na Europa, e termina com a fotografia realizada na Croácia, em 2020, durante um terramoto que me deixou sem abrigo, onde é visível uma bandeira da União Europeia”, faz notar.

Running Away Into You é mais do que um mero retrato dos tempos que viveu, sublinha Mário Macedo; debruça-se sobre “a efemeridade da nossa existência”, cogita. “Tenta colocar as questões ‘o que somos, qual o nosso propósito?’. Parece que estamos sempre a correr de nós próprios. É daí que surge o título do livro.” A imagem que surge na capa, que Mário tirou na Ístria, Croácia, onde é visível um casal “sem cabeça” que parece fitar “a escuridão que é a existência humana”, traduz essa desorientação. O verbo “fugir” do título, resume, “não se prende apenas com questões circunstanciais, ou seja, os problemas económicos, os desafios de carreira que enfrentamos, mas com questões existenciais”.

Algumas imagens têm uma força e um significado especial