Algumas plantas vão, simplesmente, desaparecer. Outras, demorando mais ou menos tempo, poderão vir a adaptar-se ao novo planeta aquecido pelas emissões de gases com efeito de estufa. Mas, de uma forma ou de outra, o impacto da escalada das elevadas temperaturas na Terra é inevitável e já desequilibrou os ecossistemas ao ponto de poder levar à falha dos mecanismos de regulação do clima durante milhões de anos. Estes são os avisos deixados por uma equipa internacional de cientistas num estudo sobre a forma como a vegetação responde e evolui em resposta a grandes mudanças climáticas e como essas mudanças afectam o sistema natural de regulação do clima-carbono da Terra. Olhando para o passado, é possível tirar conclusões sobre o que nos espera.
"Actualmente, encontramo-nos numa grande crise bioclimática global", comenta Loïc Pellissier, professor de Ecossistemas e Evolução da Paisagem na ETH Zurich e na WSL, citado no comunicado de imprensa sobre o artigo publicado esta quinta-feira na Science. "O nosso estudo demonstra o papel de um funcionamento da vegetação para recuperar de alterações climáticas abruptas. Actualmente, estamos a libertar gases com efeito de estufa a um ritmo mais rápido do que qualquer outro evento vulcânico anterior. Somos também a principal causa da desflorestação global, o que reduz fortemente a capacidade dos ecossistemas naturais para regular o clima. Este estudo, na minha perspectiva, serve de alerta para a comunidade mundial."
"Os períodos de magmatismo das Províncias Ígneas Gigantes (Large Igneous Provinces, LIP, na sigla em inglês) moldaram a história biológica e climática da Terra, causando grandes alterações climáticas e reorganizações biológicas. A resposta da vegetação às perturbações induzidas por LIP pode afectar a eficiência do sistema de regulação do clima-carbono e a evolução do clima pós-LIP", escrevem os autores no artigo.
Cientistas da Terra e do ambiente da ETH Zurich lideraram uma equipa internacional de investigadores da Universidade do Arizona, da Universidade de Leeds, do CNRS de Toulouse e do Instituto Federal Suíço para a Investigação sobre a Floresta, a Neve e a Paisagem (WSL). Olharam para o passado.
"Usando um modelo eco-evolutivo da vegetação, demonstramos que a capacidade de adaptação da vegetação ao clima, através da evolução biológica e da dispersão geográfica, é um factor determinante da gravidade e longevidade das hipertermias induzidas pela LIP, e pode promover a emergência de um novo estado climático estável", concluem, acrescentando que as reconstruções de temperatura correspondem às trajectórias modeladas de perturbação e recuperação bioclimática. "Concluímos que a dinâmica da vegetação biológica molda a resposta multimilenar do sistema terrestre a episódios súbitos de desgaseificação do carbono e de aquecimento global."
Os cientistas procuram frequentemente na natureza as respostas para os desafios mais prementes da humanidade, contextualiza o comunicado de imprensa da ETH Zurich, acrescentando que, "no que diz respeito ao aquecimento global, a história geológica oferece uma perspectiva única e a longo prazo".
Ou seja: a história geológica e climática permite compreender os efeitos do aquecimento global na actualidade. Sobrevivemos a períodos de erupções vulcânicas catastróficas que libertaram grandes quantidades de carbono na atmosfera e nos oceanos, mas a recuperação foi muito lenta. Foi preciso renascer e deixar a natureza encontrar um novo equilíbrio. "O aumento do carbono provocou um rápido aquecimento climático, que resultou em extinções em massa em terra e nos ecossistemas marinhos. Estes períodos de vulcanismo podem também ter perturbado os sistemas de regulação carbono-clima durante milhões de anos", avisam os cientistas.
Com a análise realizada, a investigação confirma que "a perturbação do funcionamento da vegetação devido ao aquecimento pode levar à falha dos mecanismos de regulação do clima durante milhões de anos". Mais: as mudanças na vegetação podem alterar o equilíbrio climático do planeta.
"Com base em análises geoquímicas de isótopos em sedimentos, a equipa de investigação comparou os dados com um modelo especialmente concebido, que incluía uma representação da vegetação e do seu papel na regulação do sistema climático geológico. Utilizaram o modelo para testar a forma como o sistema terrestre responde à intensa libertação de carbono da actividade vulcânica em diferentes cenários", adianta a nota de imprensa.
Entre os cenários revisitados estava aquela que é considerada a maior extinção da história na Terra, que marcou o fim do período permiano, há cerca de 252 milhões de anos. Um anterior estudo publicado na Science já tinha concluído que esta extinção maciça associada a catastróficas erupções na Sibéria fez com que 96% das espécies marinhas fossem exterminadas por causa das alterações climáticas.
Agora, neste trabalho, os investigadores explicam que "a gravidade de fenómenos ocorridos no passado é determinada pela rapidez com que o carbono emitido pode ser devolvido ao interior da Terra - sequestrado através da meteorização de minerais de silicato ou da produção de carbono orgânico, removendo o carbono da atmosfera terrestre".
A nota de imprensa sobre o artigo adianta ainda que os cientistas concluíram também que "o tempo necessário para que o clima atinja um novo estado de equilíbrio depende da rapidez com que a vegetação se adapte ao aumento das temperaturas". "Algumas espécies adaptaram-se evoluindo e outras migrando geograficamente para regiões mais frias. No entanto, alguns acontecimentos geológicos foram tão catastróficos que as espécies vegetais simplesmente não tiveram tempo suficiente para migrar ou adaptar-se ao aumento sustentado da temperatura. As consequências desse facto deixaram a sua marca geoquímica na evolução do clima durante milhares, possivelmente milhões, de anos." Um aviso do passado para o futuro, tendo em conta o preocupante presente que vivemos agora na Terra.