Cartas ao director

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Bitola de 1,5 milhões

Por estranho que pareça, só ontem consegui ver uma imagem aérea do Parque Tejo repleto daquela imensidão de 1,5 milhões de pessoas. Fiquei impressionado, já que nas transmissões em directo não haviam projectado imagens globais e aéreas como esta que acabo de ver. Uma enorme maré humana que se juntou para ver e ouvir o Papa Francisco, como é sabido. Agora, imaginem aquela multidão, não para assistir àquelas cerimónias, mas em lista de espera para ter um médico de família. Arrepiante, sem dúvida alguma.

Mas se usarmos esta bitola, aquela multidão é sensivelmente igual aos 1,6 milhões de portugueses pobres a viverem com menos de 540 euros por mês. Tudo números impressionantes, sem dúvida. E termino socorrendo-me de novo daquela bitola, mas agora multiplicada por três, a necessitar de uma área de 300 hectares para albergar os 4,5 milhões de seres humanos em situação de pobreza em Portugal.

Alguém que faça alguma coisa. O país provou mais uma vez que, quando quer e arregaça as mangas, consegue. Porque esperam os que se puseram em bicos de pés para receberem os louros logo após a JMJ?

Jorge Morais, Porto

A coragem de enfrentar a tragédia com dignidade

A ilha de Maui (Havai) foi praticamente destruída pelo fogo. A cidade de Lahaina, antiga capital, deixou de existir. Dezenas de pessoas morreram ou estão feridas e milhares de habitantes tiveram de fugir, inclusivamente para o mar, em desespero. A coragem dos sobreviventes é indescritível: como merecem a nossa consideração, não pena, apenas consideração, muita.

Um jornalista questionou um habitante que perdeu a totalidade dos seus bens materiais. A resposta saiu de imediato (sem queixumes, sem exteriorização de dramatismo nem pedido de ajudas monetárias imediatas): "Eu não perdi nada, pois houve quem perdesse a vida e quem perdesse familiares." Na verdade, como disse Oscar Wilde, estamos todos na mesma vala lamacenta, mas alguns conseguem ver as estrelas.

Elder Fernandes, Lisboa

Ponte da Juventude

Seria lógico e natural que a nova ponte pedonal sobre o rio Trancão tivesse o nome de “Ponte da Juventude”. Esta seria a melhor maneira de homenagear a JMJ e perpetuar a alegria dos milhares de jovens de todo o mundo presentes. Será uma designação bonita e consensual, longe da actual polémica provocada pela agenda pessoal e político-ideológica do presidente da Câmara Municipal de Lisboa, que consegue dividir em vez de procurar consensos entre “todos, todos, todos". Um exemplo de como a mensagem do Papa Francisco não foi devidamente escutada.

João Paulo Sousa, Coimbra

Ponte do Perdão

Portugal é um país onde as pessoas são muito picuinhas. E, vai daí, os problemas surgem mais que alfobres. Alguém quis baptizar a ponte ciclopedonal entre os rios Tejo e Trancão de Ponte do Cardeal Manuel Clemente. E logo a polémica se instalou. Mas o visado logo afirmou não querer ter o nome em tal ponte. Pois bem, sanado o problema, propomos que o nome a ser dado seja de “Ponte do Perdão”, tendo em conta os abomináveis actos sexuais perpetrados no seio da Igreja Católica.

José Amaral, V. N. Gaia

Despovoamento e democracia

O geógrafo João Ferrão, estudioso da evolução da ocupação do território nas últimas décadas, expõe, no seu ponto de vista, a questão do desenvolvimento das cidades através do diálogo. No meu ponto de vista, existem os planos directores municipais (PDM), que poderiam servir para dinamizar esse diálogo. Aparentemente existem regras que obrigariam ao debate, mas como sabemos tal não acontece. Os PDM resultam do estudo técnico do território. São debatidos entre os representantes das diversas forças representadas nas assembleias municipais de uma forma condicionada pelas forças dominantes no concelho: poder político e poder económico. As restantes questões – saúde, educação, desporto, cultura, etc. –, regra geral, ficam à margem dos debates. São tudo partes que poderiam elevar o debate com as populações, para aprofundar o conhecimento do espaço e criar as dinâmicas necessárias ao desenvolvimento do território. Todos sabemos que as forças vivas dos municípios e a população não são chamadas a pronunciar-se ou, pelo menos, não são incentivadas a tal. Nisto, há um problema, que é a democracia. Todos sabemos que a democracia viva do pós-25 de Abril foi aos poucos limitada ao voto. O medo e o comodismo das forças políticas dominantes foram desligando a população do debate. Hoje temos o que sabemos: desconsideração pela actividade política; pelos partidos políticos; o crescimento das forças antidemocráticas.

Mário Pires Miguel, Reboleira

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