O calor potencia o desejo sexual, mas as alterações climáticas podem vir a matá-lo

O sol aumenta a produção das hormonas da felicidade, como a serotonina e a oxitocina, e a disponibilidade sexual. Contudo, o calor extremo tem o efeito oposto, avisa a ginecologista Irina Ramilo.

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Os nascimentos aumentam nos dez meses depois do Verão Unsplash/Skyler King
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No Verão, somos mais felizes, mais disponíveis, erotizamos mais o corpo e temos mais desejo sexual, quem o diz é a ciência. Contudo, o pico da reprodução humana pode estar a desvanecer-se quer não só por culpa da alteração das rotinas humanas, como também das alterações climáticas. É que os dias quentes aumentam a libido, mas o calor extremo é um assassino para a vida sexual, avisa a ginecologista Irina Ramilo, a propósito do Dia Mundial do Orgasmo, assinalado nesta segunda-feira.

“O calor e o sol estimulam a produção de hormonas do bem-estar, como a serotonina e a oxitocina, o que faz com que estejamos mais felizes”, começa por explicar a autora da página A Ginecologista da Melhor Amiga no Instagram. Logo, se estamos mais “felizes”, nota, “controlamos o nosso apetite, o humor, a energia e o bem-estar físico e mental”, o que tem influência no desejo sexual, tanto de homens, como de mulheres.

Além da produção de hormonas da felicidade, acrescenta a médica ao PÚBLICO, os dias de Verão também potenciam a vasodilatação e a vascularização, o que aguça os sentidos da visão e do tacto, aumentando o desejo sexual. É nesta estação que vestimos roupas mais leves e nos despimos mais em público, um factor social que também nos torna mais libertos. “Mostrar mais pele direcciona o nosso cérebro, o nosso sistema nervoso e os nossos impulsos para uma maior excitação”, observa Irina Ramilo.

E não, a transpiração não interfere na libido, se não for excessiva: “É onde se concentram as feromonas, partículas voláteis que são imperceptíveis ao olfacto consciente, mas que fazem cócegas nos receptores do sistema olfactivo e desencadeiam a atracção sexual.”

Não é de ignorar também que o Verão corresponda frequentemente a um período de férias e de maior tempo livre, o que diminui os factores emocionais negativos, como a ansiedade e o stress, que influenciam a libido ─ regulada por hormonas sexuais, a testosterona e o estrogénio, mas também neurotransmissores.

Todos estes motivos levam a que a reprodução humana tenha picos de sazonalidade. “Estudos demográficos já mostraram que, em todo o mundo, o número de nascimento tende a ser maior dez meses após as estações mais quentes do ano”, reconhece Irina Ramilo, citando um estudo publicado pela Universidade de Oxford, que aponta o calor como “o responsável pelo aumento da frequência de relações sexuais”.

A concepção, prevê, “deve acontecer no melhor ambiente e nas maiores probabilidades de sobrevivência”, o que explica também a sazonalidade. É de notar que os estudos se referem a temperaturas máximas de 27ºC, o que se vai tornando improvável à medida que o planeta aquece, culpa das alterações climáticas. A Organização Meteorológica Mundial já prevê que, nos próximos cinco anos, a temperatura média anual do planeta chegue já a 1,5ºC acima dos valores anteriores à Revolução industrial.

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Unsplash/Alexander Grey

Mais calor, menos sexo

Se o sol aumenta a concentração de hormonas de bem-estar, o calor extremo tem o efeito contrário, desencadeado uma maior produção de cortisol, que aumenta os níveis de stress e interfere na resposta sexual. “Pode aumentar o aumento da transpiração e perda de líquidos, podendo levar à desidratação, o que pode afectar o equilíbrio hormonal do corpo”, sublinha a ginecologista.

Já existem artigos científicos a estudar a relação entre as temperaturas extremas e o número de nascimentos. Entre 1930 e 2010, publicou a Universidade da Califórnia em 2018, os nascimentos nos nove meses após os dias com temperaturas acima dos 27ºC diminuiu.

“Além disso, o calor extremo pode atrapalhar o sono e o descanso, o que pode afectar os níveis de energia e a capacidade de sentir excitação sexual”, acrescenta Irina Ramilo, que aponta estes factores como responsáveis pela incapacidade de aproveitar um momento íntimo, diminuindo o conforto.

As alterações climáticas podem mesmo ser uma das culpadas por uma vida sexual menos feliz e pela diminuição da natalidade, mas não são os únicos factores de preocupação. Irina Ramilo culpa ainda as novas rotinas de trabalho, que levaram a vida profissional para dentro de casa, com “condições eternas de Verão”.

O teletrabalho caracteriza-se por “fotoperíodos longos e temperaturas amenas quase sem sazonalidade”. Sem picos de calor, não há sazonalidade na vida sexual e o desejo torna-se monótono, ainda que seja importante sublinhar que “nem todos experimentam aumento de excitação devido ao calor”. E assevera a especialista: “Outros podem preferir estímulos ou condições diferentes, o que é especialmente verdadeiro para aqueles que odeiam o calor.”

Seja qual for a situação, o importante é respeitar a vontade do parceiro e compreender se outras questões ─ como problemas de relacionamento, stress ou distúrbios depressivos e de ansiedade ─ podem estar a afectar a vida sexual do casal. Contudo, se ambos adorarem o calor, é de aproveitar a diversão do Verão, enquanto as alterações climáticas permitirem.

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