Cartas ao director

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Uma questão de números

Temos vivido tempos políticos conturbados, não por questões de política propriamente dita, mas por aquilo a que os francófonos chamam faits divers. É extraordinário que se possa continuar a discutir a legalidade de uma acção que poderá ter sido (ou não) tomada por fulano a mando de sicrano que nega tudo e o seu contrário, como se fôssemos figurantes de uma ópera bufa à escala nacional. Enquanto andamos nesta treta, as coisas verdadeiramente importantes ou parecem menores ou simplesmente passam de fininho.

Veio António Costa fazer frente aos que o tentavam açoitar por não dizer a verdade, agitando-lhes à frente do nariz os números da Economia. Faltará ética mas sobra Economia que é o que interessa! E depois vem a história dos bancos, dos certificados de aforro e dos juros e recordo a célebre afirmação de Luís Montenegro, devidamente enquadrada nos idos de 2014: “A vida das pessoas não está melhor mas a do país está muito melhor”, bem na linha de outra reflexão intemporal, esta da autoria de Passos Coelho: “Nós sabemos que só vamos sair desta situação empobrecendo.”

E é muito isto! Neste período pós-“geringonça”, recuperámos a perspectiva dos tempos da troika: “nós”, o povinho, só nos safamos empobrecendo enquanto “eles”, os ricos, não habitam o mesmo planeta e, certamente por isso, ficam cada vez mais ricos. Haverá quem consiga explicar a coisa com clareza, mas eu não sou capaz. Faltam-me estudos.

Rui Silvares, Cova da Piedade

Certificados de Aforro ou como estamos entregues à bicharada

A história dos Certificados de Aforro mostra como nos governam. O Governo abdicou da sua capacidade de regular o mercado e cedeu aos interesses da banca. Percebemos que os nossos governantes esqueceram que governar para os portugueses é diferente de governar para os grandes grupos empresariais e financeiros. A riqueza de accionistas e gestores de topo das grandes empresas aumenta com o aumento do PIB, mas os salários não.

O Presidente da República implora à banca um “esforçozinho” para “tornar mais atraentes os depósitos” e o ministro da Economia diz, sem corar, que “devemos remover impostos sobre lucros excessivos para não penalizar as empresas. Não está provado que reduzir os impostos das grandes empresas significa investimento na melhoria das condições de vida da população. Já o Zeca dizia: “Eles comem tudo... e não deixam nada.”

Fernando Vasco Marques, Várzea de Sintra

Ética, para que te quero? <_o3a_p>

Com este título, Luís Fazenda, dirigente do Bloco de Esquerda, lançou-se à falta de ética do PS e também do PSD, que apelida de “centrão”, no PÚBLICO de terça-feira. Isto no seguimento da campanha sistemática do Bloco desde que fez tudo para o país ir a eleições antecipadas. E conseguiu que o PS, democraticamente, tivesse uma maioria absoluta. Isto é pura realidade. Mas não querendo assumir que perderam mais de metade dos deputados por culpa própria passaram a responsabilizar o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que só fez o que a Constituição estipula —​ quando não há meio de aprovação do Orçamento, antecipa-se eleições —, ou a culpar o PS, por não ter aceitado o Orçamento do Estado do BE.

O problema do país não é só o PS e o PSD, é estrutural.

Augusto Küttner de Magalhães, Porto

Alguém está a mentir ou a ser enganado

Numa perspectiva neutra, não poderemos afirmar que alguém esteja a enganar ou a ser enganado. No entanto, a interpretação da oposição e de alguns analistas e comentadores pode sugerir o seguinte. Estar a caricaturar os “casos e casinhos” e “as horas e horinhas” é uma maneira muito habilidosa de deitar areia para os olhos do povo. Cada vez mais, parece que há muita gente a enganar e a ser enganada. Se não há a natural transparência, assertividade e clareza, consequentemente as suspeitas passam a crescer, transversalmente. Ninguém entra ou sai imaculado e nem ninguém está acima da lei ou é insusceptível de suspeitas. A questão é que o recurso à análise das “horas e horinhas” apenas se torna necessário porque tais são as contradições das declarações e os hiatos de esclarecimentos, em que a mentira se vislumbra mais evidente. Cada vez mais, parece estarmos perante uma mentira mais rebuscada, calculada e conspirada. Daí que, numa proporcionalidade directa, urge o maior grau do esmiuçar dos ditos pormenores, que, na verdade, podem revelar uma grande escala de enganadores e enganados.

Agora, na minha opinião, o assunto não está clarificado; muito longe disso. Só quem se cega com um comprometimento com o Governo não quer ver o que qualquer pessoa lúcida vê: incongruências, dúvidas e suspeitas. A falta de imparcialidade no seu juízo prejudica o país e o Governo, mas também o PS.

Luís Filipe Rodrigues, Santo Tirso

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